ISP & Negócios de Impacto Social: mais perguntas do que respostas

Por: Instituto Sabin| Notícias| 11/05/2016

Fábio Deboni[1]

 

Iniciamos[2] recentemente o trabalho de mais uma Rede Temática no âmbito do GIFE. A Rede de Negócios de Impacto Social levou este nome pelo aspecto didático que ele traz consigo, mas o entendimento é que as discussões abarquem a confluência entre os 2 campos em questão: o do investimento social privado (ISP) e o das finanças sociais.

Se, supostamente, no campo do ISP parece haver suficiente entendimento sobre seus contornos e limites, uma visualização mais aprofundada nos aponta que há aspectos na fronteira deste campo que, na ótica do conceito Gife sobre Investimento Social Privado[3], parecem não se enquadrar aí. O foco deste texto não é este, mas vou citar apenas 2 aspectos para ilustrar esta fronteira:

– projetos incentivados (provenientes dos diversos incentivos fiscais existentes – Rouanet, Esporte, FIA, PRONON e PRONAS, etc)

– Subcrédito do BNDES

Os colegas que atuam em Institutos e Fundações têm lidado em menor ou maior grau com estes 2 aspectos, ainda que saibamos que as fontes de recursos de ambos não estão necessariamente nos orçamentos destas respectivas organizações e não são “voluntários”, não sendo, portanto, enquadrados como ISP. Mesmo assim, é notório o papel que diversos Institutos e Fundações têm desempenhado no sentido de tornar a gestão destes recursos e projetos mais “sociais”.

O outro campo é o das Finanças Sociais. Área emergente em todo mundo, ganhou contornos recentes no Brasil e grande impulso a partir do esforço concentrado da Força Tarefa de Finanças Sociais[4], gerando bastante acúmulo, consensos e repertórios sobre este campo. No caso desta nova Rede Temática do Gife, a opção didática foi a de nomeá-la como sendo uma Rede de “Negócios de Impacto Social”, considerando esta dimensão presente no guarda-chuva das Finanças Sociais. Ainda que este último termo seja o mais abrangente, a opção pelo nome da Rede Temática como sendo de “Negócios de Impacto Social” levou em conta um aspecto didático que permitisse pavimentar uma aproximação mais clara deste campo junto aos Institutos e Fundações. Entendemos que os negócios de impacto têm sido uma porta de entrada mais clara para esta aproximação.

Vale destacar que das 15 Recomendações propostas pela Força Tarefa[5], a de número 2 é explícita ao sugerir o “Protagonismo de Fundações e Institutos” neste campo. Já teci algumas reflexões sobre as Recomendações, percebendo-as como ponto de partida e não como chegada[6]. Portanto, esta nova Rede Temática assume o papel de desdobrar esta Recomendação de número 2 da Força Tarefa, engajando Institutos e Fundações e estabelecendo uma estratégia para implementar esta Recomendação. Um dos pontos essenciais dela é a de que cada Instituto e Fundação destine, até 2020, 5% de seus orçamentos para esta temática. Parece baixo o percentual, mas o alcance desta meta exigirá profundas transformações em vários Institutos e Fundações.

Ainda que a Rede Temática leve em seu nome a dimensão dos “negócios de impacto social”, seu escopo de discussão está fundamentado na confluência entre estes 2 campos – o do ISP e o das Finanças Sociais. Num esforço inicial de identificação de questões para serem discutidas e aprofundadas, chegamos[7] a 4 aspectos prioritários que serão trabalhados ao longo de 2016. São eles:

  1. Fortalecimento do Ecossistema
  2. Introdução ao tema e conceitos
  3. Aspectos Jurídicos e Contábeis
  4. Alinhamento ao negócio

Outros temas foram identificados e receberam priorização secundária[8]. O consenso na Rede Temática foi a de enfrentarmos estes 4 aspectos ao longo dos próximos Encontros deste ano. Acompanhado de cada aspecto, compartilho algumas perguntas que supostamente pretendemos enfrentar/responder ao longo de cada Encontro. Como se vê, temos mais perguntas do que resposta.

  • Fortalecimento do Ecossistema
    • Quem compõe o Ecossistema? Quais componentes precisam ser fortalecidos por meio do capital filantrópico?
    • Como Institutos e Fundações podem tirar proveito desta estratégia?
    • Porque não fomentar diretamente negócios de impacto para fortalecer o ecossistema? Quais os prós e contras de cada estratégia?
    • Quais as lacunas atuais do Ecossistema?
    • Quais as referências internacionais de fortalecimento do Ecossistema (por meio do capital filantrópico) que podem ser inspiradoras para o Brasil?

 

  • Introdução ao tema e conceitos
    • Como apresentar o tema de forma panorâmica e didática (finanças sociais e negócios de impacto), a partir da ótica de Institutos e Fundações?
    • Como apresentar a diversidade (e dissensos) das várias correntes de pensamento sem direcionar para uma ou outra?
    • É possível oferecer cases práticos de negócios de impacto de diferentes áreas temáticas, estágios e variados portfólios?

 

  • Aspectos Jurídicos e Contábeis
    • Quais são os consensos e dissensos sobre as questões jurídicas e contábeis do emprego de capital filantrópico para o campo dos negócios de impacto?
    • Quais argumentos e referências disponíveis para confrontar as barreiras atuais?
    • Quais são as barreiras contábeis atuais? Como encontrar alternativas e saídas legais para cada uma delas?
    • Institutos e Fundações podem destinar recursos para negócios de impacto social? (como doação? Como equity? Como pode e como não pode?)
    • Quais são as especificidades para OSCIPs e Fundações?

 

  • Alinhamento ao Negócio
    • Quais os links possíveis com o estudo Gife sobre Alinhamento do ISP ao negócio recém-publicado[9]?
    • É deste alinhamento que estamos falando? Ou estamos falando de outro tipo de alinhamento?
    • Como lidar com os temas menos modeláveis na ótica dos negócios de impacto? A destinação do capital filantrópico pode seguir uma lógica do “E” ao invés do “OU”? Ou seja, é possível destinar parte dos orçamentos de Institutos e Fundações para o campo da justiça social e uma parte para o campo dos negócios de impacto?
    • Atuar no campo dos negócios de impacto social seria contraditório à estratégia de também fomentar o fortalecimento da sociedade civil  e a garantia de direitos? É possível o mesmo Instituto ou Fundação atuar nas duas frentes?

 

Como se observa, temos muitas dúvidas e poucas respostas sistematizadas. Talvez o maior esforço desta Rede Temática seja o de reunir as várias partes deste imenso quebra-cabeça e montá-lo para que faça sentido para Institutos e Fundações. Não temos qualquer pretensão de reiniciar discussões já travadas no campo das Finanças Sociais, mas tão somente a de lançar luzes sobre a confluência deste campo com a atuação de Institutos e Fundações, tendo como guia-mestre as Recomendações da Força Tarefa (em especial a de número 2). É a partir desta lente que buscaremos focar as reflexões da Rede. Por isso, o engajamento dos colegas de ISP é fundamental. Já tivemos uma ótima participação neste início de atividades e esperamos que este clima amistoso e colaborativo seja a tônica desta caminhada. Finalmente lanço ainda um convite especial aos colegas dos Institutos e Fundações familiares para também se engajarem nesta reflexão. A exemplo de outros países, estas organizações também podem assumir um protagonismo bastante estratégico neste campo no Brasil. Certamente há espaço para todos e a velha máxima do setor social segue valendo aqui: quanto mais, melhor.

 

[1] [1] Gerente Executivo do Instituto Sabin e co-coordena 2 Redes Temáticas no âmbito do Gife – Rede Temática de Saúde e Rede Temática de Negócios de Impacto Social. É libriano, palmeirense, toca violão e luta para ser um pai presente e levar uma vida simples. Nem sempre consegue.

[2] Esta Rede Temática é fruto de um trabalho coletivo, sendo co-coordenado por três organizações: ICE, Instituto Sabin e Gife.

[3] Repasse voluntário de recursos privados para fins públicos, de forma sistemática, planejada e contínua.

[4] Mais detalhes em: http://forcatarefafinancassociais.org.br/

[5] Acesse o documento com elas no link: http://forcatarefafinancassociais.org.br/recomendacoes/

[6] Texto disponível em: https://gife.org.br/2015/11/07/recomendacoes-da-forca-tarefa-de-financas-sociais-ponto-de-partida-e-nao-de-chegada/

[7] Durante a 1ª Reunião da Rede Temática, realizada  no último dia 4 de maio, em São Paulo.

[8] Foram eles, na sequência: recursos financeiros, métricas/avaliação de impacto, gestão/governança, atuação local/territorial, censo/portfólio, e parcerias.

[9] Disponível gratuitamente em: https://gife.issuelab.org/resource/alinhamento_entre_o_investimento_social_privado_e_o_negocio

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