Reunimos os aprendizados e as agendas que ganharam relevância este ano em face da pandemia e apontam tendências e oportunidades para a atuação do investimento social e da filantropia no próximo período, segundo membros do Conselho de Governança do GIFE.
O ano de 2020 dobrou o investimento social, que passou de 3,25 bilhões de reais em 2018 (Censo GIFE) para 6,5 bilhões de reais em 2020 (Monitor das Doações).
Mas o saldo da ação cidadã frente à Covid-19 não se limita ao volume de doações em dinheiro, alimentos ou equipamentos. Uma das maiores crises sanitárias da história recente deixa também muitos aprendizados, novos atores e modos de ação, o aumento da colaboração entre organizações do setor e destas com o campo da sociedade civil e o poder público e agendas que ganharam relevância e chegaram para ficar.
Esse cenário foi o ponto de partida do Painel Sociedade Viva, que reuniu associados e parceiros do GIFE para uma tarde de reflexões e trocas a partir de um olhar coletivo sobre as realizações, desafios e aprendizados do ano que seguirão viagem na bagagem diretamente para o futuro.
Tiveram lugar os destaques da mobilização social neste ano, seus legados, os temas e agendas que ganharam força na esfera pública, além dos desafios, tendências e oportunidades para a ação coletiva e do setor no próximo período.
A oportunidade foi palco para o fortalecimento da Sociedade Viva, uma iniciativa do GIFE que se dedica a documentar e valorizar a mobilização em face da crise por meio da identificação de histórias em todo o Brasil nas mais diversas áreas temáticas e da produção de conteúdos sobre elas. Uma ação para disseminar as boas práticas do campo e contribuir com a construção de uma sociedade civil cada vez mais forte, atuante, plural e diversa.
Para ampliar o mapeamento de aprendizados, temas e tendências para a atuação futura do investimento social privado (ISP), dedicamos este Especial redeGIFE a ouvir as percepções dos membros do Conselho de Governança do GIFE, lideranças que representam uma diversidade de perfis e focos de atuação do setor.
Apresentamos a seguir o resultado dessa escuta.
Agilidade na resposta ao contexto de crise;
Flexibilização de critérios e processos nos modos de ação;
Flexibilização para o ambiente digital;
Fortalecimento da capacidade de atuação em rede;
Potencial e valorização da cultura de doação no Brasil;
Relevância e papel do Estado e das políticas públicas;
Importância do modo de ação presencial nos territórios possibilitado pelas organizações da sociedade civil;
Necessidade de maior esforço de comunicação sobre o papel, atuação e contribuição do setor junto à sociedade;
Potencial de ampliação do investimento social privado evidenciado na resposta emergencial à pandemia;
Alinhamento do investimento social ao negócio auxilia no engajamento para as ações, especialmente quando o propósito da empresa é claro e coloca o ser humano no centro da estratégia;
Planejamentos mais flexíveis e em acordo com as demandas da sociedade;
Necessidade de atuação sistêmica para enfrentamento às desigualdades estruturais, em especial de gênero e raça.
Menos burocracia e mais agilidade e objetividade na relação com parceiros e grantees;
Ampliação da colaboração entre o setor, com novas práticas, mais plurais, de co-criação e execução compartilhada, para resultados mais robustos e em maior escala;
Crescimento do apoio ao setor de investimentos e negócios de impacto;
Equidade racial como valor integrado à tomada de decisões de empresas, institutos e fundações;
Modelo híbrido presencial/digital de atuação;
Maior atuação sobre algumas agendas, como a ambiental e da democracia;
Corresponsabilização de toda sociedade (governos, empresas e indivíduos), tanto com a doação, quanto com a participação social;
Enfrentamento sistêmico às desigualdades estruturais (raciais, de gênero e de renda);
Engajamento de novos players no enfrentamento de desafios estruturais para o desenvolvimento social a partir de um investimento menos reativo e mais paciente;
Ampliação do investimento social no país;
Combinação de filantropia com outros mecanismos de investimento, como Blended Finance (estrutura de financiamento que congrega vários tipos de capital com expectativas distintas de risco, retorno e impacto);
Organização da sociedade civil mais dinâmica e menos ‘formalizada’, fazendo emergir atores na forma de coletivos e movimentos que demandam maior atenção e devem impactar a forma de atuação do setor nos territórios;
Incorporação de uma cultura de responsabilidade social e solidariedade nas ações empresariais;
Evolução dos investimentos ESG (sigla para Environmental, Social and Corporate Governance, que pode ser traduzido como Meio ambiente, Social e Governança Corporativa) em nível global, com grandes investidores priorizando a destinação de recursos para negócios com boas práticas ambientais, sociais e de governança;
Realização de advocacy sobre políticas públicas ambientais;
Criação de fundos para o enfrentamento dos desafios, apoio à sustentabilidade das causas e a iniciativas e instituições com atuação legítima nos territórios;
Debate sobre os parâmetros de bem estar social e o papel de cada setor (público, privado e terceiro setor);
Apoio à produção de conhecimento e evidências para monitoramento e controle social;
Protagonismo da sociedade civil organizada na promoção de agendas públicas brasileiras;
Atuação coordenada em defesa da Amazônia, envolvendo ISP, setor privado, academia e cooperação internacional;
Atuação sistêmica e integrada.
“A tecnologia deixou de ser a tábua de salvação e passou a ocupar seu lugar de direito, que é o alicerce sobre o qual se pensam as soluções para o nosso país. No próximo ciclo, será impossível não falar de tecnologia e de inclusão tecnológica. Nesse sentido, a educação segue sendo uma pauta prioritária para o país, principalmente na direção de reduzir o gap digital entre os nossos estudantes e as famílias mais vulneráveis.”
AMERICO MATTAR
“A pandemia evidenciou que não dá para cada um continuar fazendo sozinho sua parte, é preciso somar esforços. Isso é bonito no discurso mas, na prática, dá bastante trabalho porque as organizações têm que abrir mão, muitas vezes, de alguns preceitos internos para compor com outros parceiros e realizar uma ação de impacto. Enxergo essa como uma tendência que veio para ficar. A publicação Filantropia Colaborativa, do GIFE, traz vários exemplos e é uma ótima referência no assunto.”
FÁBIO DEBONI
“Vimos a filantropia avançar frente à crise e conseguir movimentar muitos recursos. O potencial doador do Brasil ficou muito claro.”
GIULIANA ORTEGA
“Quando chegamos a um momento em que as desigualdades aparecem com força, é fundamental uma ação coordenada, coletiva e de interesse público e isso, de certa forma, mudou o entendimento de que o mercado se regula, que temos que reduzir o tamanho do Estado, etc. Temos sim que repensar o tamanho e onde o Estado entra, mas não abdicar do papel regulador, fomentador e investidor da política pública.”
INÊS LAFER
“Muitos dos impactos sentidos na pandemia, como a fragilidade do sistema de saúde, da segurança alimentar e da rede de proteção social, poderiam ter sido menores se o investimento social tivesse contribuído para construir resiliência dos sistemas e territórios, em especial os de maior vulnerabilidade. Devemos fazer uma reflexão mais aprofundada das práticas e resultados do ISP e de como podemos fazer mais e melhor.”
LEANDRO PINHEIRO
“Devemos enfrentar no futuro novos cenários como esse vivido por todos nós durante a pandemia, o que nos levará à necessidade de ter mais flexibilidade nos planejamentos e uma visão sistêmica e de longo prazo com ações planejadas no curto prazo que construam o futuro que desejamos.”
LUIS FERNANDO GUGGENBERGER
“Políticas públicas de meio ambiente são, por definição, transversais. Ao agirem sobre uma territorialidade, elas impactam tudo o que se conecta com aquele local e ajudam a melhorar diversos aspectos da vida em sociedade e da biodiversidade local. Nas cidades, uma das maneiras mais efetivas de promover essas ações é por meio das Soluções Baseadas na Natureza (SBN).”
MALU NUNES
“É estarrecedor que os governos e a sociedade brasileira não tenham priorizado as condições necessárias para o retorno das aulas presenciais nas escolas públicas, com todas as medidas de segurança sanitária necessárias. As desigualdades só irão aumentar. Os indicadores educacionais relacionados à defasagem e abandono só irão piorar se essa agenda não for priorizada já. O Conselho Nacional já redigiu as Diretrizes Nacionais que orientam os dispositivos necessários para a execução da Lei 14.040, que considera os anos 2020 e 2021 como um só ano contínuo. É preciso apoiar as redes na criação e gerenciamento das condições para que os estudantes voltem às escolas, que seus direitos de aprendizagem sejam garantidos e plenamente atendidos.”
MÔNICA PINTO
“A sociedade brasileira assumiu a responsabilidade de mudar o discurso da democracia racial para um discurso de conscientização do racismo estrutural e institucional. É um caminho longo e estruturante que sem dúvida veio para ficar na atuação do investimento social privado daqui para frente.”
NECA SETUBAL
“Está cada dia mais claro que os problemas são interconectados. Sendo assim, não é razoável seguir com ações monotemáticas. Temos que buscar uma abordagem sistêmica e, nesse sentido, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) representam um marco bastante útil.”
VIRGÍLIO VIANA
Giovana Bianchi
COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO
Leonardo Nunes
ASSISTÊNCIA DE COMUNICAÇÃO
Estúdio Cais
REPORTAGEM/TEXTO
Marina Castilho
DESIGN & DESENVOLVIMENTO