O perfil empresarial está se tornando mais executor e os perfis familiar e independente mais financiadores.
O investimento social privado (ISP) mobilizou, em 2020, R$ 5,3 bilhões, um resultado inédito para o setor. Os dados são da mais recente edição do Censo GIFE. O volume total representa um aumento de 53% em relação à pesquisa anterior, quando o volume registrado foi de 3,25 bilhões de reais.
No entanto, foi possível perceber que esse volume foi substancialmente influenciado pelas respostas do setor à pandemia de Covid-19 e não está previsto para os anos seguintes.
“Pela primeira vez, o Censo mostra um maior volume de doação do que de execução de projetos próprios. De um lado, isso está relacionado ao reconhecimento crescente, pelo ISP, da importância de se apoiar a sustentabilidade financeira de organizações da sociedade civil; e, de outro, da compreensão que somente com atores com entrada legítima e reconhecida na ponta seria possível dar conta dos agravos resultantes da pandemia”, analisa Gustavo Bernardino, gerente de programas do GIFE.
A 10ª edição do Censo GIFE, lançada no final de 2021, contou com a participação de 131 organizações. Realizado desde 2001, o levantamento é considerado um dos principais estudos do setor e fornece um panorama sobre recursos, estruturas, formas, agendas e estratégias de empresas, institutos e fundações associadas ao GIFE.
Volume de recursos mobilizados 63% maior do que o previsto para 2020 (R$ 3,3 bilhões):
Os institutos, fundações e fundos filantrópicos empresariais são o perfil com maior participação entre os investidores sociais (54%), mas também são os que mais sinalizam previsão de redução nos investimentos em 2021.
Do total destinado ao enfrentamento da Covid-19, R$ 1,4 bi (63%) foram aportados por empresas:
um aumento de
Com relação ao destino dos repasses, o Censo GIFE 2020 revela crescimento de investidores híbridos – aqueles que têm em sua atuação estratégias distintas de distribuição de recursos – de 38% para 50%. Já a parcela de organizações essencialmente executoras e de investidores prioritariamente financiadores caiu de 40% para 34%, e 23% para 16%, respectivamente.
O perfil empresarial está se tornando mais executor e os perfis familiar e independente mais financiadores.
Repassa acima de 90% dos recursos técnicos e/ou financeiros para terceiros, seja para apoio institucional (desvinculado de iniciativas), seja para projetos a partir de linhas programáticas preestabelecidas, processos de seleção, editais regulares, doação e/ou patrocínio pontual e eventual. Inclui redistribuir doações recebidas de outras organizações ou indivíduos para terceiros ou ainda apoiar terceiros via desenvolvimento de iniciativas com outras organizações.
Repassa acima de 90% dos recursos técnicos e/ou financeiros para viabilizar iniciativas próprias, executadas por terceiros ou com equipe interna.
Repassa entre 10% e 90% dos recursos técnicos e/ou financeiros para projetos próprios e terceiros.
O crescimento dos investidores sociais híbridos é mais acentuado entre Institutos, Fundações e Fundos Filantrópicos Empresariais e Independentes
Olhando especificamente para a prática de grantmaking, ou seja, de repasse de recursos a terceiros, a nova edição do Censo GIFE revela um maior volume de recursos com essa característica, com as organizações da sociedade civil (OSCs) sendo o principal tipo de grantee (beneficiário).
Repasses a terceiros alcançaram o montante de R$ 2,5 bilhões (82% direcionado ao combate à pandemia):
mobilizando
um montante de
A crise desencadeada pela Covid-19 levou à flexibilização de regras e ao aumento do diálogo com as organizações apoiadas pelo ISP. Enquanto alguns dos avanços e estratégias tendem a não permanecer no pós-pandemia, outros devem ser permanentes
Simplificação de processos para solicitação de apoio e seleção de OSCs apoiadas e/ou redução de prazos (15%)
Aumento do valor médio repassado para apoio às OSCs (18%)
Flexibilização de regras para uso dos recursos por parte das OSCs (23%)
Aumento da divulgação e transparência sobre doações realizadas a OSCs apoiadas (21%)
Aumento do diálogo e de canais de comunicação com as OSCs apoiadas (29%)
Pela primeira vez, o Censo GIFE mapeou a existência de portfólios de doações (ou programas de doação) entre os investidores respondentes.
A estratégia é adotada por 21% dos investidores sociais:
Se destaca entre institutos, fundações e fundos filantrópicos independentes (42%) – enquanto é ainda incipiente entre os Empresariais (13%)
Um portfólio de doação é uma estratégia que busca mobilizar doações para outras organizações, agregando-as a partir de uma visão filantrópica planejada que orienta a alocação de recursos, observando as preferências e restrições do doador e considerando as diferentes abordagens, causas e estratégias das organizações apoiadas.
Por meio de seus portfólios de doações, investidores sociais realizaram:
apoiando
Historicamente, a área de educação é a que concentra a maior parte dos aportes do ISP, tendência que se manteve em 2020. Porém, a atuação em outras áreas se ampliou no contexto de enfrentamento à Covid-19. É o caso de proteção, assistência e desenvolvimento social (incluindo o combate à pobreza e à fome), que teve aumento de 34 pontos percentuais em comparação com 2018 e chegou ao patamar da área de educação em termos de respondentes que atuam na temática (75%).
Entretanto, após a emergência causada pela pandemia, esse cenário deve sofrer novas mudanças. Segundo o estudo, 18% dos respondentes que atuaram em proteção social devem suspender as atividades.
Outra temática que ganhou relevância foi a de saúde e bem-estar. A parcela de Associados GIFE que desenvolveram ações com esse foco aumentou 20 pontos percentuais no último biênio (63%, chegando a 93% dentre Empresas), o que fez com que o tema passasse a compor o grupo das cinco principais áreas temáticas do campo.
Entre as temáticas que tiveram recuo nos últimos dois anos, destaque para esporte e lazer e cultura e artes.
As principais áreas de atuação do ISP, em 2020
Ainda que tenham aumentado em relação a anos anteriores, as iniciativas com foco em gênero, raça e promoção da diversidade ainda podem crescer entre os investidores sociais.
Dos
Em relação à composição dos conselhos deliberativos das organizações do ISP, os avanços relacionados à representatividade racial e de gênero ainda são tímidos. 67% do total de conselheiros/as de Institutos, Fundações e Fundos Filantrópicos são homens, 32% mulheres e apenas 1% não binário.
“Ainda temos muito por avançar quanto à constituição de conselhos mais diversos e com relação ao perfil dos dirigentes das organizações”, avalia Gustavo.
“É preciso compreender que quanto mais representativo forem esses espaços, mais efetivo também será o trabalho das organizações do ISP, uma vez que a diversidade pode ser melhor incorporada às estratégias daquele investidor social”, finaliza.
A parcela de organizações com conselhos formados apenas por pessoas brancas diminuiu apenas 3 pontos percentuais em dois anos (de 58% para 55%) – na edição anterior, essa variação foi de 13 pontos
67% do total de conselheiros/as dos institutos, fundações e fundos filantrópicos respondentes são homens, 32% mulheres e 1% não binário
“Equidade racial e de gênero nos conselhos deliberativos, coordenações, diretorias e equipes das entidades é para ontem e não há mais justificativa.”
Allyne Andrade
“Como direcionar recursos, não só para as organizações investirem na ponta e desenvolverem suas ações, mas também se capacitarem para esse processo – e ouvindo as organizações?”
Graziela Santiago
“Acredito que é possível a articulação entre o setor privado e o movimento social, mas não na lógica de querer pautar a ação das organizações, mas sim apoiando e fortalecendo as organizações, principalmente as organizações negras, que já realizam ações de advocacy.”
Vanessa Nascimento
“Lançado o Censo 2020, que sistematizou a atuação da filantropia no ano de eclosão da pandemia, agora é conferir como o setor se adequará a um contexto em que a Covid-19 persiste assolando a sociedade. A expectativa é que o olhar para as desigualdades, a flexibilidade e o aumento das doações a organizações se confirmem como estratégias reais do investimento social.”
Gustavo Bernardino
Natália Passafaro
COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO
Leonardo Nunes
ASSISTÊNCIA DE COMUNICAÇÃO
Estúdio Cais
REPORTAGEM/TEXTO
Estúdio Cais
PODCAST
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DESIGN & DESENVOLVIMENTO