Empresas, assessorias e mídia precisam alinhar conceitos sobre investimento social
Por: GIFE| Notícias| 04/07/2005MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE
A importância de criar um alinhamento de conceitos sobre o investimento social privado e maior compreensão sobre o tema foi um dos principais aspectos revelados pelo diagnóstico feito durante o 2º Workshop de Comunicação sobre Investimento Social Privado, promovido pelo GIFE na última terça-feira (28/6), em São Paulo. O evento reuniu cerca de 70 assessores de imprensa e jornalistas de redação para discutir a qualidade das informações produzidas sobre a ação social das empresas.
O encontro, exclusivo para membros da rede GIFE, teve o apoio do Instituto Synergos. Durante uma das dinâmicas de grupo, os participantes analisaram quais as fragilidades, fortalezas, ameaças e oportunidades do investimento social privado, da forma como os assessores de imprensa o divulgam e de como os veículos de comunicação cobrem o tema.
Segundo eles, a falta de compreensão e de preparo para lidar com os conceitos são as principais ameaças, nos três casos. Para isso, entre outras coisas, eles recomendam que as fontes tenham noção do todo e não fiquem presas apenas a seus próprios projetos, que os assessores tenham contato com redes sociais consolidadas e que os jornalistas de redação procurem participar de grupos de discussão sobre os assuntos abordados e busquem especialização no tema.
“”Estamos cobrindo ações, sem antes conseguir dar para os leitores os antecedentes históricos deste movimento””, identificou o coordenador de relações acadêmicas da Andi (Agência de Notícias dos Direitos da Infância), Guilherme Canela. Para ele, falta um entendimento de que o investimento social das empresas é um movimento das sociedades globais e tem um grande peso. “”Não estamos conseguindo dar conta de explicar o que leva o setor empresarial a sair da tutela do Estado, sobre várias questões sociais, e ele mesmo implementar soluções. O que falta no jornalismo é discutir o que significa este movimento no cenário brasileiro.””
Outra questão, segundo ele, é entender os critérios que levam uma parcela mínima destas ações a estarem estampadas nos jornais. “”É difícil convencer o profissional da imprensa de que o assunto é relevante. Então, é preciso pensar em estratégias inovadoras e estar atento a um plano de comunicação da ação, não apenas ao release””, afirmou.
Para Luiz Fernando Garcia, diretor nacional do curso de comunicação da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), a imprensa acaba desenvolvendo o papel de levantar e ter critérios sobre o investimento social privado. “”Existem algumas perdas muito fortes no caminho da comunicação. Se você não souber trabalhar isso o tempo todo na relação de pauta e de conteúdo, emite uma informação que sai incompleta no jornal e pode gerar uma associação torta. É preciso ter uma construção de identidade, consistente e coerente, degrau a degrau””. (leia entrevista completa nesta edição)
Lembrar que o jornal também é uma empresa, de acordo com a editora do caderno Razão Social, de O Globo, Amélia Gonzalez, leva à idéia de que a responsabilidade social deve estar no DNA do veículo de comunicação. “”É preciso buscar a notícia que gere discussão sobre o tema. Não precisa ser matéria bombástica para criar interesse no leitor. Mas isso só acontecerá quando houver engajamento de todas as pessoas do jornal””, defendeu. Neste sentido, Alexandre Mansur, editor da revista Época, entende que a existência de poucos espaços fixos para tratar o tema não deve ser vista como fragilidade. “”A questão do investimento social privado deve estar em todas as áreas do jornal, até para não haver abordagens conflitantes.””
Fernando Rossetti, secretário geral do GIFE, lembrou que a qualidade da informação tem o poder de instrumentalizar o leitor para o exercício da sua cidadania. Assim, cabe às assessorias de imprensa pautar o jornalista da redação de forma coerente. “”Estamos pautando o pensamento nacional a respeito das causas com as quais trabalhamos. É preciso questionar se estamos focando mais em nossas ações ou na causa com a qual trabalhamos, dando instrumentos para a sociedade refletir””
Pesquisa – Fazer uma mídia cada vez mais qualificada, para que o debate seja o mais plural possível, foi uma das recomendações de Canela. Segundo ele, a questão é maior do que a confusão entre os termos responsabilidade social e investimento social privado, mas sim que o tema aparece ainda muito superficialmente nos noticiários. Esta é uma tendência verificada nos dados que estão sendo trabalhados pela Andi e o Instituto Ethos na pesquisa Responsabilidade Social Empresarial na Imprensa, cujos dados preliminares específicos sobre o investimento social das empresas na comunidade foram apresentados com exclusividade durante o evento.
Foram analisados, de outubro de 2003 a setembro de 2004, 54 jornais de todo o país, totalizando 750 textos. Cerca de ¼ das matérias na área social, de acordo com o levantamento, trata da ação das empresas. Nas reportagens que abordam o investimento na comunidade, a menção a organizações sociais mantidas pelas empresas ainda é pequena: 10,4% a fundações e 12,1% a institutos.
As empresas (34%) e governos (18,1%) são as principais fontes sobre o tema, enquanto fundações e institutos (4,4%) e ONGs (3,8%) são pouquíssimo consultados. 70% dos textos foram considerados como mera contextualização, geralmente com um caso e uma fonte, e apenas 3,3% das matérias apresentam opiniões divergentes no mesmo texto.
Também foi identificado que apenas 6,7% das reportagens identificam os beneficiados dos projetos como “”cidadãos””. A outra parte trabalha muito com o conceito de “”população carente””. Canela apontou para o fato de que a correlação da ação social empresarial com a idéia de desenvolvimento ainda é pequena (28,6%). “”O interessante é notar que as estratégias comunicacionais das empresas, fundações e institutos sempre visam o desenvolvimento social do país. Porém, isso ainda é pouco refletido na cobertura da mídia.””
Cerca de 12% dos textos analisados fazem menção aos recursos financeiros envolvidos nos projetos, mas nenhum indica o quanto estes recursos representam no faturamento global das empresas financiadoras. Esta é uma questão que Canela entende como fundamental para os jornalistas de redação, e que será analisada com profundidade na publicação a ser lançada no segundo semestre deste ano. A indicação da utilização de recursos públicos e/ou incentivos fiscais pelas empresas também é pouco presente nos textos jornalísticos (5,5%).
Espaços para artigos de autores externos ao jornal, no entanto, têm contado com forte presença do tema responsabilidade social. “”As empresas de comunicação estão abrindo espaços para que este tema seja discutido pelas pessoas que estão nas fundações e institutos. Mas, na verdade, isso não é trabalho jornalístico. E este não é um tema que está sendo objeto de reportagens no mesmo volume que outras áreas no campo social são””, disse Canela. Ele explicou que, nas outras pesquisas da Andi, em média, 95% dos textos são reportagens. Nesta, 18,7% são artigos e 6,6% colunas, o que é um dado interessante, segundo ele, visto que estes são modelos que têm um tipo de configuração diferente das matérias jornalísticas na formação da agenda pública.
Grupos de trabalho – O diagnóstico, as dicas e recomendações produzidas pelos grupos de trabalho durante o 2º Workshop de Comunicação sobre Investimento Social Privado serão sistematizadas e farão parte de uma publicação, a ser lançada pelo GIFE até o final deste ano.