Em meio à taxa recorde, iniciativas do terceiro setor combatem desemprego

Por: GIFE| Notícias| 02/12/2002

MÔNICA HERCULANO

A região metropolitana de São Paulo apresentou em outubro o pior índice de desemprego no mês desde 1999, quando a taxa registrada também foi de 19% da população economicamente ativa. Especialistas alertam que neste ano a taxa deve fechar entre 18,2% e 19,3%, os mesmos números registrados em 1998 e 1999 – os piores níveis desde 1985.

O dado foi revelado pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), divulgada recentemente pela Fundação Seade e pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Segundo o levantamento, nos últimos 12 meses, 181 mil pessoas foram incorporadas à força de trabalho, porém apenas 81 mil novas ocupações surgiram.

As organizações do terceiro setor têm atuado fortemente na tentativa de auxiliar na diminuição dos níveis de desemprego em todo o país, especialmente com programas de capacitação para os jovens. No último ano, o índice na faixa dos 18 aos 24 anos teve aumento de 4%.

A Fundação Projeto Pescar, de Porto Alegre (RS), reúne uma rede de escolas que funciona por sistema de franquia social, no qual as empresas abrem suas dependências para a formação pessoal e profissional de adolescentes de baixa renda.

Segundo Ézio Rezende, gerente de expansão e projetos da organização, o índice de aproveitamento dos alunos pelo mercado de trabalho é de 75%. Desses, 8% já são pequenos empresários e empregam jovens que estão sendo formados. “”Nosso sonho é um dia poder fazer com que um jovem como esse, que criou sua pequena empresa, possa abrir sua própria escola também. Aí o ciclo estará fechado””, afirma.

Vita Porto Pimentel, assessora pedagógica do Projeto Formare, promovido pela Fundação Iochpe, de São Paulo, acredita que o terceiro setor possa contribuir para a diminuição do desemprego de diversas formas. “”De uma maneira geral, a sociedade civil pode se organizar melhor, unir suas forças, seus interesses e seus recursos, focalizando a qualificação e a educação, especialmente do jovem, que está mais penalizado pelas questões do estreitamento do mercado de trabalho””, afirma.

Para ela, são fundamentais a criação, o apoio e o financiamento de projetos que estejam voltados à formação, à qualificação e à preparação da juventude para o exigente mercado de trabalho atual. “”Por outro lado, acho que o setor privado pode ter a preocupação de oferecer oportunidades de trabalho, abrindo espaço para o desenvolvimento e o aperfeiçoamento desses jovens.””

No entanto, Vita lembra que o segundo setor não pode substituir o governo nas ações de grande escala, que atingem diretamente os índices de empregabilidade. “”Acho que estamos criando referências, porque os problemas de emprego são resultados de medidas estruturais muito mais amplas, ou seja, de políticas nacionais. O setor privado pode ir criando, viabilizando exemplos de projetos e programas que podem ser multiplicados e adaptados””, explica.

O Projeto Formare, assim como o Pescar, oferece formação e qualificação profissional a jovens de baixa renda. Um levantamento das nove escolas da rede Formare, em funcionamento há mais de dois anos, constatou que mais de 85% dos alunos conseguiram colocação no mercado de trabalho.

“”Existe uma preocupação em afinar o treinamento com as necessidades do local. Além disso, não fazemos uma formação específica, apenas para manipular uma máquina. Procuramos formar o indivíduo integralmente, como cidadão””, explica Vita.

A Bosch foi uma das empresas a adotarem o projeto Formare, em São Paulo. A assistente social da empresa, Cristiana Lima, conta que foram feitas parcerias com associações comercias da região, para onde os alunos são encaminhados e de onde a Bosch recebe outros jovens para seu programa de estágio. Segundo ela, dos 20 jovens que se formam neste ano, cinco já estarão empregados no início de 2003.

“”Se cada empresa fizer sua parte e tentar auxiliar esses meninos, contribuímos para uma comunidade melhor em torno da empresa. Mas não adianta querer dar emprego se eles não têm formação. É preciso oferecer qualificação e orientação. Na turma que estamos formando agora é nítido como eles estão mais maduros e seguros de sua capacidade, porque têm uma preparação e sabem por onde começar””, diz Cristiana.

Profissionalização – O papel do terceiro setor vai além da preparação para o mercado de trabalho. Para Rezende, outra contribuição está diretamente ligada à profissionalização e à melhoria da qualidade dos projetos desenvolvidos na área social, o que gera possibilidades de empregabilidade e empreendedorismo.

“”Por meio do conceito de profissionalização nas organizações do terceiro setor, o projeto tende a estar mais estruturado e, por conseqüência, será mais produtivo e irá gerar mais postos de trabalho. Quando se consegue trazer a profissionalização, a tendência é que se tenha uma qualidade maior na ponta final. Quem trabalha com educação, por exemplo, vai fazer melhor seu trabalho, e as pessoas atendidas terão mais chances de empregabilidade. Quem trabalha com microcrédito terá mais qualidade para dar apoio técnico àquele que recebeu o dinheiro, que vai gerar seu pequeno negócio e empregar mais pessoas””, explica Rezende.

Ele também ressalta que, apesar do terceiro setor ser um mercado de trabalho emergente, não se pode afirmar que o aumento do espaço dentro das organizações colabore para a diminuição das taxas de desemprego no Brasil. “”Várias áreas já estão atraídas pelo terceiro setor, como administração, psicologia e serviço social, reconhecendo aí oportunidades reais de desenvolvimento profissional. Porém, acho que esses números são muito pequenos, até porque falamos de organizações profissionalizadas, mas com equipes muito enxutas, já que os recursos são poucos.””

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