Relatório da OMS aponta violência como problema de saúde pública

Por: GIFE| Notícias| 20/10/2002

MÔNICA HERCULANO

No início do mês, a Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde. O estudo é o primeiro a relacionar a violência como uma questão de saúde pública e tem como objetivo contribuir para que esse setor tenha um papel mais pró-ativo na prevenção do problema.

De acordo com o documento, todo ano morrem no mundo cerca de 1,6 milhão de pessoas vítimas da violência, principalmente na faixa dos 15 aos 44 anos. Além disso, milhões de pessoas sofrem de problemas físicos e psicológicos, e os países ficam submetidos a grandes encargos econômicos e sociais em decorrência dos atos violentos.

Segundo o relatório, até recentemente, a saúde, tanto pública quanto privada, era responsável apenas por prover cuidados às vítimas de atos violentos. Agora, ela já é considerada em muitos lugares um importante aliado no impedimento ou na contenção da violência, dada a variedade de recursos que pode direcionar a esse trabalho.

Proximidade – Uma das possibilidades citadas pela OMS é a proximidade com o problema, já que nos hospitais e clínicas uma grande quantidade de tempo é dedicada às vítimas de violência. Outro importante fator apontado pelo relatório é a quantidade de informação que o setor de saúde pode fornecer para pesquisas e trabalhos de prevenção.

A organização acredita que, atuando em conjunto com outros setores, pode-se replicar as quatro etapas, tradicionalmente aplicadas na saúde pública, para combater a violência: definir e observar a magnitude do problema, identificar suas causas, formular e colocar à prova modos de enfrentá-lo e aplicar amplamente as medidas de eficiência detectadas.

Para Francisco Tancredi, diretor regional da Fundação Kellogg para a América Latina e Caribe e especialista em saúde pública, seria ingenuidade acreditar na possibilidade de seguir rigorosamente essas etapas na prevenção de um problema tão abrangente como o da violência.

“”À primeira vista essa é uma forma lógica, elegante e, diria, cartesiana de enfrentar o problema da violência. Na prática, é preciso tomar cuidado para não se ater rigidamente a esse modelo, porque frente a problemas de causalidade múltipla e grande complexidade, como é o caso do comportamento violento e da cultura da violência, a busca de soluções deve privilegiar a abordagem dialética e a experimentação caminha quase simultaneamente à ação””, explica Tancredi.

Ele lembra que os serviços de saúde podem realmente ser muito úteis na mudança de padrões culturais que favorecem comportamentos violentos. “”Reduzir a violência no trânsito, prevenir a violência doméstica contra mulheres, reduzir a violência contra as crianças e prevenir a violência grupal. Tudo isto é possível por meio de um processo bem conduzido de educação da comunidade.””

Porém, Tancredi avalia que os sistemas de saúde no Brasil raramente procuram desenvolver programas para prevenção da violência, ou por não estarem cientes da extensão do problema, ou por acreditarem que ele deva ser tratado por outros setores, como o policial ou o educacional.

Para ele, falta uma atitude mais pró-ativa, mas também mais preparo para dar assistência adequada às vítimas da violência. “”Nos pronto-socorros e ambulatórios, muito raramente se pesquisa os motivos de fratura em uma criança ou do espancamento de mulheres. E mesmo quando se indaga as causas, a maioria dos profissionais não procura o violentador para tratá-lo. São raríssimos os pronto-socorros que contam com alguém para oferecer atendimento psicológico””, explica.

Sociedade civil – O estudo também ressalta que ações coordenadas e complementares entre os diversos setores da sociedade são fundamentais para efetivar atividades de prevenção. Para a OMS, a sociedade civil tem um relevante papel, pois possui grande volume de conhecimento e experiência, enquanto os governantes devem trabalhar no controle da violência e para que todos possam contribuir no processo.

Outras recomendações também são indicadas no relatório para o combate e a prevenção da violência. Entre as principais ações estão a criação, implementação e monitoramento de um plano de ação nacional para prevenção da violência; definição das prioridades e apoio à investigação das causas, conseqüências, dos custos e da prevenção da violência; apoio e assistência às vítimas; integração da prevenção da violência nas políticas sociais e educativas; e busca de respostas práticas e consensuais ao tráfico mundial de drogas e de armas.

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