Iniciativa privada tem o dever de participar das mudanças sociais

Por: GIFE| Notícias| 29/10/2001

Para o filósofo e educador Mario Sergio Cortella, a sociedade civil organizada é fundamental para a manutenção da esperança em uma realidade social melhor.

Em entrevista ao redeGIFE, ele fala sobre os principais pontos que abordou durante sua palestra, intitulada A Audácia da Reinvenção do Humano – O Arcaico Demolido, a Tradição Preservada e o Futuro Desatado.

redeGIFE – O senhor disse que um dos principais problemas atuais é a falta de esperança na transformação da sociedade. Qual o papel das organizações civis na mudança desta postura?
Mario Sergio Cortella – Fundamentalmente elas favorecem a mudança em uma direção positiva. E o que eu entendo por positivo é a capacidade de proteger a vida em suas múltiplas formas. Sustentar a existência e ao mesmo tempo elevá-la a outra condição. Não se trata só de uma mudança pela mudança, porque isso seria absolutamente frágil. A noção central é que as organizações da sociedade civil tenham como seu horizonte contínuo a necessidade de estar protegendo, resguardando e elevando a dignidade coletiva da vida humana, entendida aí a existência como um mistério profundo que merece ser levado adiante sem ruptura.

redeGIFE – Como o senhor avalia a participação da sociedade civil organizada neste movimento até o momento?
Cortella – Em nosso país a presença de uma sociedade civil organizada é algo recente. Afinal de contas, nós temos apenas 501 anos de história e nesse período o processo democrático de presença mais marcante da sociedade só apareceu recentemente, em 1989. Só nestes últimos 11 anos tivemos uma exuberância maior das instituições da sociedade civil. Só agora elas têm condições de se expressarem em uma direção mais sólida e mais substantiva. Portanto, acredito que ainda estamos no fim do começo, e não no começo do fim. Há muito o que fazer.

redeGIFE – O senhor vê com bons olhos a participação da iniciativa privada no esforço pela mudança da realidade social brasileira?
Cortella – Acho que a iniciativa privada tem mais do que a tarefa, ela tem o dever de fazer isso. Afinal de contas há uma diferença entre ambição e ganância. Ambição é você desejar mais. E isso a empresa privada tem como interesse. Afinal, sua meta central é a lucratividade. Mas isso é diferente de ganância, que é querer só para si. A ganância produz a ruptura do tecido social, um ego mais físico e a quebra das condições de vida coletiva. Portanto, uma empresa precisa ter a noção de que nada adianta se apenas ela obtiver vantagens na inserção em uma comunidade. Se for assim, seu sucesso será provisório, precário e extremamente ameaçado pelo conjunto, porque não existem possibilidades de ir adiante fazendo com que os outros fiquem para trás. Aliás, a possibilidade existe. O que não se pode é pensar isso como um imperativo ético. O que deve ser feito é colocar o setor privado numa tarefa de construção da cidadania dentro da nossa realidade.

redeGIFE – Dentro desta tarefa, qual a importância das organizações privadas atuarem em conjunto?
Cortella – Há um ditado que diz: se ficar o bicho come, se correr o bicho pega. Mas falta a terceira parte. E essa é o que fazem muitas pessoas e muitos grupos, especialmente o GIFE. Se ficar o bicho come, se correr o bicho pega, mas se juntar o bicho foge. O fortalecimento é exatamente a capacidade de agregar as pessoas, tomar forças e ao mesmo tempo produzir um avanço significativo na capacidade de enfrentamento dessas questões sociais. Nesse sentido, organizações como GIFE não são apenas a diferença e sim o meio dentro da nossa realidade. São experiências fundamentais e não podem de maneira alguma enfraquecer. Cada vez mais é preciso que estes movimentos conjuntos se tornem referência.

Leia texto escrito por Mario Sergio Cortella.

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