Dia Internacional da Mulher: conquistas e muitos desafios ainda a serem enfrentados

Por: GIFE| Notícias| 10/03/2014

O desrespeito aos direitos das mulheres é uma questão cultural. Precisamos mudar mentes e corações e fazer essa transformação para que elas não sejam excluídas por serem mulheres”. A fala de Amalia E. Fischer, fellow Ashoka e coordenadora executiva do ELAS-Fundo de Investimento Social, reflete não apenas um desejo pessoal, mas algo ainda esperado por milhões de mulheres em todo o mundo.

A comemoração em 8 de março, chamado de “Dia Internacional da Mulher”, continua ao longo do mês de março, dedicado a incentivar a sociedade a refletir sobre as principais conquistas, mas também aos muitos desafios que as mulheres ainda enfrentam nos dias atuais.

Há diversos avanços a serem destacados, como a criação da Lei Maria da Penha, como um passo importante dado ao enfrentamento à violência contra as mulheres, assim como os novos direitos para as trabalhadoras domésticas. Além disso, o país tem investido cada vez mais em programas de saúde especificamente para as mulheres, assim como em incentivos e apoio técnico e financeiro para as iniciativas de mulheres rurais.

Hoje, as mulheres têm se destacado, inclusive, como empreendedoras. De acordo com dados apresentados pelo Sebrae em fevereiro – a partir da pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM) – 52% dos novos empreendedores – aqueles com menos de três anos e meio de atividade – são mulheres. A força empreendedora feminina é maioria em quatro das cinco regiões brasileiras. Apenas no Nordeste elas ainda não ultrapassaram os homens, mas estão quase lá, com aproximadamente 49% de participação entre os novos empresários.

E, quando estão à frente dos negócios, elas tendem a conquistar ótimos resultados. Hoje, por exemplo, as unidades de franquias no país sob o comando feminino podem ter faturamento até 34% mais alto. Os dados são da pesquisa anual do perfil do franqueado brasileiro, realizada pela consultoria Rizzo Franchise, e divulgada pela EXAME.

As mulheres também têm dado passos importantes frente a sua qualificação. Hoje, as brasileiras estudam mais que os homens, mais que as gerações passadas e representam 60% dos graduados brasileiros, segundo dados da PNAD, a Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios. Além disso, são donas de 51,1% dos diplomas de pós-graduação.

No entanto, apesar do esforço e dedicação à educação, as mulheres ainda enfrentam muitas disparidades no mercado de trabalho. A quinta edição da pesquisa Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 Maiores Empresas do Brasil, realizada pelo Instituto Ethos, constatou que em 2010 as mulheres ocupavam somente 13,7% dos quadros executivos das companhias no país.

Um estudo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgado em dezembro de 2013, a partir dos dados da PNAD, revelou que a desigualdade salarial entre homens e mulheres não mudou muito nos últimos dez anos. Na construção civil, por exemplo, uma mulher no cargo de chefia recebe apenas 37% do que um homem no mesmo cargo receberia. Isso se repete até em setores que tradicionalmente as mulheres dominam. Em educação, saúde e serviços sociais as que são chefes ganham só 60% do salário dos homens.

Apesar da eleição da presidente Dilma Rousseff em 2010, a primeira mulher a governar o País desde a Proclamação da República, o gênero feminino ainda é sub-representado também na maioria dos cargos elegíveis brasileiros. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, em 2010 foram eleitas apenas 45 mulheres para as 513 cadeiras disputadas – ou seja, 8,7% do total.

Essa é uma das taxas mais baixas do mundo – o Brasil está em 119º entre os 146 países analisados pela União Interparlamentar (IPU). Nas prefeituras, a proporção é um pouco maior: 12% são comandadas por mulheres, mas longe de representar a composição feminina na população adulta brasileira, de 53%.

Para todas as áreas que olhamos, seja nas empresas, organizações internacionais, fundações e institutos e na política, assim como nos conselhos das estatais – que são cargos remunerados – o primeiro e o segundo ‘escalão’ são homens. Somente depois que vêm as mulheres. É uma situação vergonhosa”, comenta Ana Toni, diretora executiva do GIP (Gestão de Interesse Público) e ex-conselheira do GIFE.

Segundo a especiliasta, o cenário apresentado é um pouco diferente no terceiro setor que, normalmente, recebe mais as mulheres. “Como, normalmente, é um setor que paga menos, os homens não acham competitivo e há mais espaço, portanto, para as mulheres galgarem cargos de liderança. Além disso, tem também o fato de que as mulheres já foram ‘treinadas’ historicamente a lidar e fazer muitas coisas ao menos tempo e, nesta área, isso acaba sendo fundamental”, comenta.

Se os desafios enfrentados pelas mulheres em relação ao acesso e permanência no mercado de trabalho ainda estão presentes, a situação é ainda mais complexa para as mulheres negras. Dados do “Dossiê Mulheres Negras: retrato das condições de vida das mulheres negras no Brasil” , lançado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostram que essas são aquelas que permanecem na base da pirâmide social, sofrendo o peso de preconceitos e discriminações simultâneos, que não só as excluem de determinados espaços pelo fato de serem mulheres, mas também as excluem de outras possibilidades, pelo fato de serem negras.

As mulheres negras ganhavam, em média, apenas 30% dos rendimentos auferidos pelos homens brancos, em 2009. Ainda que essa desigualdade venha se reduzindo (no caso dos salários, por exemplo, este percentual era de 20%, em 1999), as distâncias são ainda muito grandes.

Para além do mercado

Ana Toni destaca que, muito mais do que a inserção profissional, as mulheres têm ainda de lidar com as expectativas e cobranças da sociedade sobre o seu papel no campo familiar. “Se há uma reunião na escola dos filhos e, a mulher vai, dizem ‘não faz mais que a obrigação’ e, se não for, falam muito mal desta mãe. Já se é o pai que vai, parece que é uma celebração só pelo fato dele ter comparecido. Essa invisibilidade do trabalho no âmbito familiar é ainda muito forte. É uma realidade dura que as mulheres enfrentam diariamente”, destaca.

E as pesquisas comprovam que a situação é realmente desigual entre os gêneros neste âmbito. A síntese de indicadores do IBGE apontou que as mulheres trabalham menos horas no mercado formal de trabalho, mas fazem o dobro da jornada dos homens nos afazeres domésticos. Em 2012, os homens trabalharam em média 42,1 horas por semana, enquanto a jornada das mulheres ficou em 36,1 horas. Para os afazeres domésticos, no entanto, as mulheres dedicam 20,8 horas enquanto os homens trabalham 10.

Vemos que as mulheres continuam trabalhando sozinhas no lar. E os homens precisam entender que não se trata de ajudar, mas de dividir, fora e dentro do lar. A situação é ainda mais difícil para as mulheres que são chefes do lar sem maridos ou que têm filhos e estes nem conhecem os pais. Isso não é uma questão apenas das mulheres. Se numa relação a mulher sai grávida, o homem têm que assumir a sua responsabilidade”, comenta Amália.

Segundo as especialistas, há também desafios a serem enfrentados, por exemplo, em relação à violência. A pesquisa Violência contra a mulher: feminicídios no Brasil, coordenada pela técnica de Planejamento e Pesquisa do Instituto Leila Posenato Garcia, apresentada em setembro de 2013, mostrou que, entre 2009 e 2011, o Brasil registrou 16,9 mil feminicídios, ou seja, “mortes de mulheres por conflito de gênero”, especialmente em casos de agressão perpetrada por parceiros íntimos. Esse número indica uma taxa de 5,8 casos para cada grupo de 100 mil mulheres.

“O problema não é apenas as conquistas que faltam para as mulheres, mas os direitos que já temos e como eles são promovidos, executados e defendidos. Precisamos de controle social para que os direitos conquistados não sejam violados. E o que já existe precisa ser difundido e informado”, ressalta a coordenadora executiva do ELAS.

Iniciativas em pauta

Diversos programas têm sido fomentados por todo o país a fim de garantir um desenvolvimento pleno das mulheres em diversas áreas. Uma dessas iniciativas é o Movimento Empresarial pelo Desenvolvimento Econômico da Mulher, conhecido como Mulher+360. A iniciativa reúne uma série de empresas, com o apoio da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, e colaboração de organizações governamentais, acadêmicas e da sociedade civil.

Alinhado com os Princípios de Empoderamento das Mulheres da ONU, o Movimento propõe uma visão de 360 graus do empoderamento feminino. Dentro das empresas, a proposta do Movimento é incentivar iniciativas voltadas para a inclusão de mulheres, o desenvolvimento profissional e a formação de lideranças femininas. Nas cadeias de suprimentos, são estimuladas ações voltadas para a ampliação da participação feminina em toda a cadeia, por meio de iniciativas de desenvolvimento profissional da mulher e de valorização do empreendedorismo feminino.

No tocante à inclusão social das mulheres, o Movimento visa incentivar as empresas a, através do seu investimento social privado e ações de responsabilidade social, promover o empoderamento das mulheres e valorizar sua atuação como agentes de transformação. O Movimento também busca trabalhar a qualificação da imagem da mulher na sociedade, incentivando as empresas a incorporar em sua comunicação e em campanhas educativas mensagens de valorização da mulher em seus diversos papéis, ressaltando assim seu papel transformador.

Outra ação que vem se destacando é a Rede Brasileira de Mulheres Líderes para a Sustentabilidade, da qual Ana Toni faz parte. A Rede reúne mulheres de empresas, governo e sociedade civil, em posições de liderança, para trabalhar temas de interesse como, por exemplo, a participação das mulheres em conselhos.

Novas ações “Dia Internacional da Mulher”

Durante o mês de março, várias ações voltadas à temáticas de gênero serão desenvolvidas para comemorar o Dia Internacional da Mulher. O ELAS, em parceria com o Instituto Avon e a ONU Mulheres, por exemplo, irá promover no dia 12 de março, no Rio de Janeiro, um evento para apresentar os resultados do trabalho desenvolvido por dez grupos que foram financiados por estes parceiros durante o ano de 2013 por meio do Fundo Fale Sem Medo 2013. Os projetos, que receberam um investimento total de R$ 300 mil, são voltados para o combate à violência contra as mulheres em comunidades do Rio. Na ocasião, além de avaliar os avanços conquistados, assim como partilhar suas experiências, os projetos irão também apresentar produtos desenvolvidos em suas iniciativas.

O encontro será às 17h30 na sede da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (rua Graça Aranha, 1). Os interessados em participar devem confirmar presença pelo e-mail: [email protected] ou pelo telefone: (21) 2286-1046. Até o final do mês será realizado, em São Paulo, um novo evento para o lançamento do edital para 2014.

Já no dia 13 de março, acontecerá também no Rio o Encontro de Mulheres Posithivas do Rio de Janeiro, promovido pelo Grupo do RJ do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (http://mncpbrasil.blogspot.com.br/). A proposta é trazer para o debate a importância de acabar com o preconceito em relação às mulheres que vivem com o vírus HIV.

Além disso, o ELAS, em conjunto com cinco redes femininas, irá lançar durante o mês de março a campanha sobre os direitos das mulheres chamada: “Ah..então sou feminista”. Segundo Amalia, a proposta é ressaltar a importância do movimento feminista frente às conquistas dos direitos das mulheres. “Isso não é reconhecido pela sociedade. E trata-se de um movimento propositivo e que se mantém vivo. Queremos que as mulheres reconheçam os seus direitos e conheçam a importância do movimento”, ressalta.

A campanha irá reunir uma série de ações, como o lançamento de um banco de fontes sobre o feminismo para a imprensa, assim como a divulgação de livros e e-books sobre o tema. O carro-chefe será uma ampla mobilização via internet e, principalmente, por meio das redes sociais. Os materiais da campanha estarão disponíveis no site do Fundo (clique aqui)

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