As oportunidades de ação social na saúde
Por: GIFE| Notícias| 24/07/2014O encontro “Perspectivas de atuação do investimento social na área da saúde” teve sua segunda edição no dia 14 de Julho. O encontro, realizado com o apoio do Instituto Sabin, Instituto Criança é Vida e a Fundação Vale, reuniu diversas organizações associadas ao GIFE e convidados que direcionam esforços para o tema “acesso à saúde”.
Nesta segunda edição, buscou-se aprofundar os estudos sobre saúde e analisar dados precisos para que a discussão sobre as reais necessidades do tema no Brasil fossem mais assertivas. Três organizações que atuam diretamente com o assunto foram convidadas para apresentar sua forma de atuação e perspectivas acerca do trabalho social para a saúde. Vivianne Naigeborin, da Potencia Ventures, trouxe uma visão acadêmica, aprofundando a discussão a partir da exposição do “Estudo sobre oportunidades de negócios de saúde para a população de baixa renda no Brasil”, um retrato dos desafios e oportunidades que negócios voltados para a população de baixa renda e focados em saúde encontram no cenário nacional. O doutor Fernando Fernandes trouxe a experiência prática de um negócio social que facilita o acesso aos serviços de saúde, o Saútil. Um buscador online de serviços de saúde já consolidado como um negócio de impacto, mas que ainda esbarra em dificuldades do setor e burocracias governamentais. Por último, o doutor Nelson Arns, coordenador da Pastoral da Criança, mostrou estudos sobre o quão determinante são os cuidados nos mil primeiros dias de vida da criança e as ações da pastoral a partir dos dados do estudo.
Os três focos das apresentações, análise de cenário: exposição de um negócio de impacto social e de uma organização sem fins lucrativos, formaram um quadro rico, com diferentes perspectivas para as organizações sociais que trabalham e pretendem trabalhar com saúde no Brasil.
Negócios de impacto social com foco em saúde
Negócios com foco na população de baixa renda, especificamente nas classes C, D e E – que englobam domicílios com até cinco salários mínimos, capazes de gerar escala e facilmente replicáveis determinam o conceito de negócios sociais. Tecnologias sociais como essas são o foco da Potencia Ventures, instituição internacional que dispõem de capital financeiro e intelectual para o desenvolvimento de negócios em mercados emergentes, cujos produtos e serviços contribuam para redução da pobreza.
Foi de uma parceria entre a Potencia Ventures e a consultoria Prospectiva Negócios Internacionais e Políticas Públicas, que o “Estudo sobre oportunidades de negócios de saúde para a população de baixa renda no Brasil” foi concebido. Este foi feito visando a crescente demanda de empreendedores sociais interessados no tema, frente aos questionamentos da capacidade governamental de atender a demanda da população em saúde.
Alinhado às estratégias governamentais para a área, o estudo mostra um cenário nacional em que além das deficiências do SUS, poucas empresas direcionam seus serviços ao público CDE. Isso porque hoje os modelos de negócio muitas vezes criam produtos acessíveis em larga escala para essa parcela da população mediante subsídios governamentais.
Outro entrave é a dificuldade que novos negócios têm de progredirem no Brasil. Planos de saúde específicos para alguns atendimentos e que sairiam a um custo menor, ainda esbarram na legislação nacional e impedem que sejam criadas soluções para nichos de mercado específicos, como o de gestantes. A onda de serviços tecnológicos como eHealth ( uso das tecnologias da informação e comunicação para a saúde) e mHealth( prática médica ou de saúde pública apoiada por aparelhos móveis) ainda não conseguem fechar um plano de negócio seguro e de acordo com a legislação vigente.
Junto a isso, o Sistema Único de Saúde (SUS) ainda é a única porta de acesso para 67% dos 152 milhões de brasileiros que pertencem a CDE. Medidas de prevenção, filas de espera, burocracia para adquirir medicamentos e dificuldades de encaminhamentos para médicos especialistas estão entre as principais deficiências apontadas pelos próprios usuários do sistema.
Em meio a esse quadro, o estudo traz oportunidades de negócios no mercado de saúde focados na população de baixa renda e que aguardam por investimentos e iniciativas para acontecerem. Um desses casos, também apresentado durante o encontro, é o Saútil.
A partir das constatações quanto aos problemas logísticos do SUS e a falta de informação da população sobre seus direitos frente ao poder público, três sócios criaram em 2011 um buscador online que, de forma ilustrativa e em apenas 02 cliques, fornece informações sobre unidades de atendimento, disponibilidade e preços de medicamentos, vacinação e outros serviços de saúde. Com mais de sete milhões de buscas realizadas e 1,6 milhão de visitantes únicos, o Saútil procura reverter o quadro onde 49% dos consumidores de remédios no Brasil consideram pouco o dinheiro que dispõem para gastarem com medicamentos. Aliado à constatação de que quanto menor a renda pessoal, menor é o gasto com planos e maior com medicamentos; o Saútil é um serviço que facilmente atenderia uma parcela da população que afirma gastar R$ 112,00 mensais com remédios, podendo diminuir até pela metade este gasto, se mais pessoas soubessem onde encontrar o medicamento num preço mais acessível e fossem mais cientes quanto aos seus direitos.
Serviços como o Saútil ainda não vingaram em escala no Brasil, devido a alguns fatores, como o acesso à rede online, que ainda não é uma realidade difundida entre as classes mais baixas, a resistência da classe médica, ainda grande para implementar ferramentas digitais e a regulamentação feita pelo Conselho Federal de Medicina, ainda conservadora quanto à interação médico e paciente. Obstáculos que carecem de maior diálogo e ação organizada por parte da sociedade civil.
Tecnologia social consolidada
Com apresentação mais informativa e focada na saúde infantil, o doutor Nelson Arns, da Pastoral da Criança trouxe a teoria do médico e pesquisador Dr. Barker sobre a relação entre pessoas que nascem com baixo peso e a maior probabilidade de desenvolver doenças cardíacas coronarianas. Em cima da pesquisa, a pastoral discutiu a importância da medicina preventiva e como ela pode evitar uma onda de doenças em larga escala. Com o tema “Como os primeiros 1.000 dias de vida podem afetar nossa saúde para sempre”, Arns mostrou a relação entre o baixo peso ao nascer e a maior probabilidade de desenvolver doenças como a osteoporose, doenças renais, diabetes tipo II, até mesmo a obesidade e as já citadas doenças cardíacas.
A Pastoral da Criança elaborou uma série de ações para trabalhar com a Teoria dos 1000 dias. O simples trabalho informativo através de suas equipes de coordenadores e líderes comunitários, o desenvolvimento do projeto Acampamento Nutricional para crianças de 0 a 6 anos, a busca por influência em políticas de saúde para diminuir os fatores de risco perinatais e a produção e livre reprodução de seus materiais publicados acerca do tema são algumas das ações que uma tecnologia social pode trabalhar para a prevenção em larga escala.
O encontro trouxe um quadro de grandes oportunidades para o investimento social e o desenvolvimento de tecnologias sociais para a saúde, ao mesmo tempo que evidenciou as dificuldades enfrentadas por quem já está em ação e esbarra nos aspectos coorporativos, políticos e falta de apoio.
Todos os dados mostrados na reportagem podem ser conferidos nas apresentações em anexo.
Estudo sobre oportunidades de negócios de saúde para a população de baixa renda