Seminário reúne especialistas para discutir a política educacional brasileira

Por: GIFE| Notícias| 10/08/2015

“Como a política educacional brasileira irá alcançar os resultados que precisamos?” Foi o tema central do seminário promovido pelo Instituto Unibanco em parceria com a Fundação Getúlio Vargas e o Insper, no dia 3 de agosto, em São Paulo. Ao longo do dia, especialistas, representantes do governo e de instituições que atuam na área, trouxeram diversas questões essenciais sobre o tema em três mesas de debates: “O desempenho educacional brasileiro”, “Planos e compromissos” e “Como alcançar metas e resultado almejados”.

No painel de abertura, Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco, Ricardo Paes de Barros, professor titular da Cátedra Instituto Ayrton Senna no Insper e Naercio Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, apresentaram um panorama detalhado da atual situação educacional brasileira e a sua evolução nas últimas décadas em relações a seis questões: atraso em relação a outros países; limitações de acesso/matrícula/frequência; gargalos do fluxo educacional; aprendizado dos alunos; fluxo x aprendizado; e desigualdade educacional. Ricardo Madeira, professor da FEA/USP, foi o moderador deste painel.

O professor Ricardo Paes de Barros iniciou sua fala destacando que somente 37% dos países do mundo têm escolaridade inferior a da brasileira e, se o recorte for por públicos específicos a situação é ainda mais desafiante: só 15% dos países do mundo têm escolaridade menor do que a população que vive na área rural brasileira. “É até surpreendente como o país consegue produzir tanto com tão baixa escolaridade. Isso porque o Brasil tem a escolaridade similiar de países que vivem com 7 mil doláres per capital, sendo que a nossa é de 14 mil. O Brasil está conseguindo produzir duas vezes mais produtos do que era de se esperar frente à escolaridade temos”, disse.

Os professores Ricardo e Naércio apresentaram uma comparação dos anos de estudo dos brasileiros jovens frente a outros países. Em relação ao Chile, por exemplo, que é a referência na América Latina, o Brasil está demasiado atrasado em termos educacionais. Os jovens brasileiros com 25 anos têm uma média de escolaridade de dez anos, por exemplo, que já foi atingida pelos chilenos há 23 anos. “Temos um problema grave”, pontuou Paes de Barros.

Segundo Naércio, o Brasil chegou a esse cenário devido ao descuido no investimento na educação no passado. Em 1950, a população americana já tinha, em média, oito anos de estudo, algo que o Brasil só agora está atingindo. “O país ficou parado de 1950 a 1980 num período crucial do século 20. A Coreia, por exemplo, em 1960 tinha uma situação muito parecida com o Brasil, mas ela avancou bem mais, chegando a 12 anos de estudo. O Brasil só a partir de 1980 começou acelerar. Isso mostra o tamanho do esforço que teremos de fazer para recuperar o atraso histórico”, ponderou.

Uma pesquisa de 2012 apontou que o Brasil tem 32,7% dos adultos com Ensino Médio e 13,7% com Ensino Superior, sendo que a média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) é de 44% com Ensino Médio e 33,3% com Ensino Superior. “Se quisermos concorrer vamos ter que cobrir essa diferença”, acrescentou Naércio.

A respeito do segundo ítem a ser debatido neste painel, os professores apresentaram dados sobre a frequência das crianças e adolescentes nas escolas brasileiras. A percepção é de que a pré-escola (voltada para crianças de quatro e cinco anos de idade) teve um avanço significativo: aumentou de 44,6% (entre brancos) em 1992 para 83,9% em 2013. Em relação aos negros a taxa cresceu de 40,7% para 79,4% no mesmo período.

No Ensino Fundamental (de sete a 14 anos), o Brasil praticamente universalizou o acesso. Já no grupo de 15 a 17 anos, a frequência dos jovens permanece praticamente estagnada e, matendo-se a tendência atual, a universalização não será alcançada nem daqui a 50 anos.

“Somos um país que tivemos fantásticos progressos educacionais até os 14 anos de idade, com uma largada tardia de quatro a seis anos, mas acelerada. Só que dos 15 anos em diante os progressos são inacreditavelmente lentos. O que se percebe também é que o Brasil ‘trocou’ matrículas de jovens atrasados, pelos de idade correta em suas séries, mas ainda temos 15% dos alunos nessa faixa etária que estão fora da escola. E isso é muito preocupante pela quantidade de jovens que temos no país”, explicou Ricardo Paes de Barros.

De acordo com os especialistas, a situação é mais grave em relação ao nível Superior. A área ficou estagnada de 1980 a 1995, mas houve um aumento na evolução de matrículas, principalmente no setor privado: passando de 1 milhão para 5,4 milhões em 2013. O ensino a distância também teve um papel fundamental nesse crescimento: até 2005 era basicamante zero o número de matrículas e, em 2013, chegou a 1,15 milhão.

Outro ponto abordado no painel foi a questão do fluxo. Segundo os dados levantados, se no Chile 100% dos alunos terminam o Ensino Fundamental 1, no Brasil se perde 4% dos estudantes nesta etapa. Já no Ensino Fundamental 2, os concluintes são 85% e, no Ensino Médio, somente 65% dos que entram terminam esse ciclo e menos da metade termina na idade correta. “Há um atrito durante todo o processo e vamos perdendo os alunos ao longo dos anos. O que se percebe é que o aluno termina com atraso o Ensino Fundamental 1, depois entra no Ensino Fundamental 2 com defasagem e, devido às dificuldades, abandona o sistema educacional”, comentou Paes de Barros.

O Ensino Fundamental 1 conseguiu reduzir muito a defasagem idade/série, mas a capacidade de elimir a defasagem neste ciclo está no limite, principalmente nas escolas rurais e na áreas mais vulneráveis. O que se percebe é que todos os indicadores desaceleram desde 2010 quando deveriam ter aumentado e continuado a crescer. Assim, apesar dos avanços, mantida a tendência atual, serão necessários mais de dez anos para se conseguir uma taxa de conclusão do nível fundamental na idade correta correspondente a 95%.

Aprendizagem e qualidade

Em relação à aprendizagem, Naércio destacou as boas notícias sobre a evolução das médias em Matemática do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) entre os alunos do 5º ano do Ensino Fundamental, ou seja, estão aprendendo mais. Entretanto, ao analisar os dados dos estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental, percebe-se que o país está praticamente no mesmo nível de 1995 e, no Ensino Médio, piorou.

Ao analisar os dados do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), a situação é mais preocupante. A proeficiência do Brasil em Matemática permance muito inferior da média da OCDE, sendo a porcentagem de crianças com aprendizado inadequado três vezes maior no país. “A distância que nos separa dos países do OCDE é de 15 anos de aprendizado. Isso é preocupante, pois estudos mostram que os futuros professores estão concentrados nas notas mais baixas do ENEM. Ou seja, vamos ter que conseguir aumentar esse aprendizado dos alunos, mas sendo que os próprios professores têm um nivel de aprendizado bem baixo”, comentou Naércio.

Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco, apresentou alguns dados a respeito do progresso e rendimento, tendo como base o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). No EF 1, o Brasil conseguiu avançar, entre 2005 a 2013, de 3,6 para 4,9 no IDEB; no EF2, passou de 3,2 a 4,0; e, no EM de 3 para 3,4, mas permanece estagnado desde 2009 e a tendência é cair.

Segundo Ricardo, para o Brasil chegar a nota 6,0 do IDEB, que é a meta estabelecida, terá de avançar muito ainda, principalmente em algumas regiões do país. A partir de um estudo realizado, ao tomar como referência os dois itens centrais para do IDEB– proficiência e aprovação – os estados que conseguiram manter trajetórias mais consistentes foram Pernambuco, Goiás e Rio de Janeiro. A cidade de Sobral, inclusive, se tornou referência, alcançando índices mais altos do Estado e do Brasil – nota 8.0 –  assim como no comparativo com as escolas privadas de São Paulo.

“São exemplos como esse que mostram que é possível conseguir resultados rápidos com medidas corretas. Existe hoje no Brasil tecnologia para conseguirmos avanços importantes”, comentou o professor Naércio.

No entanto, há alguns estados em que a proficiência não cresce  e os indicadores voltam ao mesmo lugar de onde partiram, como Amapá e Rio Grande do Norte. “Criamos um indicador e, agora, é nosso dever olhar para essas duas dimensões cruciais e tentar crescermos de forma balanceada. Mas, não estamos sendo bem sucedidos em perseguir esse indicador que criamos. As boas práticas são muito importantes para mostrar os caminhos possíveis”, comentou o mediador.

Em relação às desigualdades educacionais, percebe-se que os estados com pior desempenho têm avançado mais rapidamente do que os com melhor desempenho, levando à redução na desigualdade educacional entre os estados. No entanto, crianças e jovens com características pessoais e contextos socioeconômicos distintos continuam tendo oportunidades educacionais muito dispares em média.

Segundo Ricardo Henriques, do Instituto Unibanco, a probabilidade de um aluno completar cada ano de ensino com, no máximo, um ano de atraso em relação à idade correta no EF 2 em São Paulo é de 85%, sendo que em Alagoas é de apenas 48,3%. Já no Ensino Médio, passa para 75% em São Paulo e 37% em Alagoas.

Num cenário criado, por exemplo, no Ceará, tendo como perfil um aluno vindo de uma família chefiada por homem, branco, com pelo menos Ensino Médio, alta renda e residência urbana,  95% dos estudantes destas famílias têm probabilidade em concluir o EF2 com, no máximo, um ano de defasagem. Porém, se este mesmo aluno vier de uma família chefiada por mulher negra, analfabeta, negra, pobre e da área rural, essa probabilidade cai para 42%.

“Precisamos tirar o país da zona de conforto que esteve nos últimos anos por conta das conquistas importantes em relação ào acesso à escola. Temos metas muito ambiciosas para o segmento educacional e o que percebemos é que parte deste ganhos vem se esgotando. Outro componente importante a ser observado é o socioeconômico, tendo em vista que contexto da família é essencial. Na medida em que temos uma nova audiência nessa escola, que são as famílias com baixa escolaridade, as nossas escolas vão ter que compensar isso de alguma forma, pois os estudos indicam que até 70% da variação de aprendizagem é explicado pelo contexto familiar. É um grande desafio”, pontuou o mediador.

Debates

Na parte da tarde, o segundo painel – Planos e compromissos -, contou com a presença de Antônio Cesar Russi Callegari, do Conselho Nacional de Educação, e Dorinha Seabra Rezende, da Frente Parlamentar em Defesa da Implantação e Implementação do Plano Nacional de Educação, que discutiram sobre os avanços do país para planejar o seu futuro educacional, por meio de metas e compromissos com magnitude e data marcada para serem cumpridos.

Dorinha lembrou que o Plano Nacional de Educação é dinâmico e, por isso, precisa ser acompanhado e monitorado e que o Brasil deve assumir, de fato, se a educação é prioridade. “Deve ser um pacto de país, que vai muito além do governo federal. Estamos falando de todos nós, sociedade, estados e municípios”, disse.

Callegari também avaliou como positivo o PNE, mas ressaltou que é preciso planejar e ter uma visão de 50 anos à diante. Já em relação à base curricular comum, o conselheiro apontou a necessidade de se pensar para além da educação profissional como algo que irá atrair o jovem para o Ensino Médio. “Na reforma deste ciclo temos que rever o Ensino Médio em relação à criatividade,  ao experimentalismo e questões pelas quais a juventude se interessa. É preciso acabar com essa mística de que só profissionalizando resolveremos os problemas do Ensino Médio”, comentou.

Já no terrceiro painel, que teve como tema central “Como alcançar as metas e resultados almejados?”, Manuel Palácios, secretário de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), destacou a importância de um olhar mais atento aos anos finais do Ensino Fundamental, tendo em vista índices preocupantes, como o fato de que 25% dos alunos do 9º ano terminam o ciclo com proficiência abaixo de 200 pontos, algo que não é adequado nem para o 5º ano.

“Esse desafio deveria ser prioritário. Se não atacarmos a transição não teremos o aluno que o Ensino Médio precisa receber”, disse.

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