A Necessária Participação em Ações Políticas

Por: GIFE| Notícias| 24/03/2008

Luiz Carlos Merege*

As conquista do terceiro setor nos últimos anos foram significativas, mas ainda não são suficientes para colocá-lo como um ator na formulação de políticas sociais públicas. Da ausência de identidade até o seu reconhecimento como componente do PIB não se passaram 15 anos. Trata-se, portanto de um setor nascente que está aos poucos construindo seu papel na sociedade brasileira.

Foram os economistas latinos americanos que elaboraram uma concepção sobre o que seria um setor nascente e quais seriam as políticas econômicas necessárias para o seu fortalecimento. Tal teoria se referia ao reconhecimento de um frágil setor industrial que não crescia e não tinha condições para tanto, já que prevalecia uma visão hegemônica de que o país tinha um destino agrícola.

Era uma visão da classe dos grandes proprietários de terras que acumulavam riquezas com os saldos positivos de nossa balança comercial e, portanto, podiam formar e influenciar a classe política para defender seus interesses.

Os economistas desenvolvimentistas conseguiram provar que o quê era bom para uma classe social não era bom para o país. No longo prazo, se o país permanecesse essencialmente agrícola ele se empobreceria em relação aos países industrializados. Provaram que havia a necessidade de se aumentar constantemente a produção agrícola para se adquirir a mesma quantidade de bens de consumo industriais, já que estes, pela inovação tecnológica constante, agregam mais valor. Defenderam que o setor nascente industrial necessitava de proteção cambial e enorme incentivos para o seu crescimento. Foram adotadas medidas radicais tal como o fechamento do mercado brasileiro para importações de bens industriais e criado forte incentivo fiscal para garantir uma atrativa taxa de lucro para o setor.

A renúncia fiscal do Estado foi enorme, o que acabou criando uma colossal dívida interna. Mas, o nosso setor industrial se fortaleceu e se tornou um dos mais importantes do planeta. Tudo isto foi possível graças a uma forte articulação das lideranças do nascente setor industrial brasileiro. A defesa de seus interesses econômicos se constituiu em uma luta permanente frente ao poder legislativo e executivo para que a legislação fosse favorável ao crescimento do setor industrial.

O nascente terceiro setor ainda não tem forças para uma ação de tal envergadura. Constituído majoritariamente por micro organizações que atuam em campos dos mais distintos, o setor ainda se sente refém do poder público. Nos trabalhos de pesquisa de campo até agora realizados, nota-se uma forte dependência das organizações de favores dos governos locais. Como influenciar a formulação de políticas públicas se as organizações se sentem temerosas de perderem os parcos recursos que conseguem como uma dádiva que não deve ser questionada?

O papel hoje passivo das organizações deverá ser convertido em um papel ativo de tal forma que possa influenciar na formulação de políticas publicas que fortaleçam o setor. Assim como ocorreu no setor industrial, isto é possível através da organização das mais expressivas lideranças do setor em um forte “”lobby”” que atue nos mais distintos níveis de decisões governamentais. Influenciar a formulação da legislação social com o intuito de fortalecer o setor tem que fazer parte das prioridades na agenda das organizações.

Recentemente foi publicado pelo Instituto Aspen ( www.aspeninstitute.org) um livro intitulado “” Seen but not Heard: Strengthening Nonprofit Advocacy”” que faz um diagnóstico da atuação de defesa de interesses das organizações do terceiro setor apontando que elas são esporádicas e ainda fracas.

Para mudar tal cenário o livro faz cinco recomendações para que as organizações promovam cada vez mais a participação e comprometimento de suas lideranças em ações de defesa dos interesses do terceiro setor frente aos poderes governamentais. São elas:

(i) discutir advocacy com os conselhos e os dirigentes da organização. Os principais diretores devem explicitar o seu envolvimento e apoio nas ações que poderão influenciar políticas públicas;

(ii) estabelecer como um procedimento interno da organização a preparação e discussão de assuntos que melhorem a participação da organização em ações coletivas de defesa de interesses;

(iii) designar membros da direção que sejam responsáveis no dia a dia por assuntos de defesa de interesses da organização e do setor;

(iv) engajar a organização em redes que representem os interesses do setor frente a órgãos governamentais e (v) formar colaboradores especialistas em defesa de interesses, assim como uma estrutura que favoreça a sua ação.

Uma recente notícia exemplifica o tipo de ação necessário para que o setor se torne um protagonista na formulação de políticas públicas. Ela dizia respeito à formação de duas redes de organizações. Uma para exercer o controle e monitorar o poder legislativo municipal de São Paulo nas áreas de juventude, infância, adolescência, educação, arte e cultura. E, outra, para acompanhar o trabalho de vereadores com relação aos temas de diversidade e direitos humanos.

É o pontapé inicial que precisávamos. Cabe seguir o exemplo e semeá-lo pelo país afora. Os necessários frutos para fortalecer o setor certamente virão!

* Luiz Carlos Merege é professor titular, doutor pela Maxwell School of Citizenship and Public Affairs da Universidade de Syracuse, coordenador do Centro de Estudos do Terceiro Setor – CETS da FGV-EAESP, do curso de Administração para Organizações do Terceiro Setor e do Projeto Censo do Terceiro Setor do Pará .

(Este artigo foi originalmente publicado na edição de setembro da revista Integração, publicação do CETS). Leia a publicação on line.

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