A oportunidade de escolher o futuro

Por: GIFE| Notícias| 17/06/2010

Geraldinho Vieira*

“Não é possível que a experiência que vivemos no Brasil quanto ao combate à fome, à pobreza e à desigualdade seja simplificada na corrida eleitoral para Presidente a ponto de resumir-se à questão de se os atuais candidatos de oposição continuarão ou não com o programa Bolsa Família”.

Veet Vivarta, Secretário Executivo da ong ANDI – Agência de Notícias dos Direitos da Infância (da qual, é bom saber, sou conselheiro) , quer mais do processo eleitoral: “Vivemos avanços importantes nesta área, rompemos o limite da descrença de que algo poderia ser mudado neste quadro, mas ainda há muito o que fazer, ainda há muita desigualdade e pobreza, e o Brasil não pode perder a oportunidade de aprofundar o debate sobre formas de combater tais mazelas”.

Vivarta é meu terceiro convidado para esses breves diálogos com lideranças sociais que venho publicando, aqui no Blog do Noblat, sempre aos domingos, em “Eleições & Sociedade Civil”.

A ANDI é uma das mais respeitadas ongs do país, com prêmios atribuídos pelo Unicef em nível iberoamericano e pelo governo do Japão em parceria com a The Global Development Network em nível mundial. Atua em rede com presença em 9 estados do Brasil e em 12 países da América Latina. Entre seus parceiros estão, além do Unicef (que está na origem mesma da agência), a Save The Children (Suécia), o Instituto C&A, as fundações Avina, Boticário e Ford, a Childhood Foundation, Petrobras e Secretaria Nacional de Direitos Humanos.

Na última disputa presidencial, a ANDI fez um rigoroso monitoramento dos temas mais presentes nos debates e de como a imprensa cobriu o processo eleitoral. Pode-se observar, por exemplo, que apesar de muito criticado como “candidato monotemático”, Cristovam Buarque conseguiu sim que a questão da educação fosse fortemente abordada, e não apenas por ele, mas pelos demais postulantes.

Agora, Vivarta desconfia que o mesmo pode ocorrer não meramente com a questão ambiental, porque a presença de Marina Silva e a crise climática certamente trarão o tema:

– “Dizem que vem por aí uma década de ouro, de crescimento e prosperidade… mas será uma irresponsabilidade se o Brasil não discutir, nestas eleições, o modelo de desenvolvimento sob o qual quer entrar e contribuir para este ciclo. O país tem condições de transitar para uma economia de baixo carbono, pode ser uma referência em novas matrizes energéticas, mas até aqui testemunhamos um coeficiente muito baixo de debate sobre ‘modelo de desenvolvimento’ na cobertura jornalística, por exemplo, do PAC. Se não aprofundamos o debate agora, quando o faremos?” – pergunta o jornalista.

A ANDI prepara-se para mais uma vez monitorar o quanto a imprensa contribui para a profundidade de discussões como estas no processo eleitoral. Mais que isso, se organiza para subsidiar os jornalistas com informações técnicas e fontes de informação confiáveis em torno de questões complementares como mudanças climáticas e preservação de biodiversidade.

As lideranças sociais com as quais conversei até aqui para esta série coincidem neste ponto: se o debate que os partidos promoverem tornar esta eleição um processo plebiscitário entre PSDB e PT perderemos a oportunidade de discutir o Brasil do futuro. E mais: a imprensa tem um papel a jogar para que isso não ocorra.

“O que vimos na eleição passada, e já agora, é que há méritos jornalísticos aqui e ali, quando a imprensa agenda temas que os candidatos não trazem espontaneamente ao espaço público, mas são méritos dispersos, circunstanciais,”, diz Vivarta.

“O hábito, o vício mesmo de cobrir a fofoca política, o fetiche da imprensa pelo jogo de cena dos políticos – que é feito para alimentar a própria mídia – impede um jornalismo de aprofundamento na investigação de tendências em políticas públicas” – diz o dirigente da ANDI com alguma esperança de que em 2010 possa haver algo novo.

Para a ANDI, há ainda uma questão que deveria ser prioridade absoluta na agenda nacional: a juventude. “O Brasil não acordou para a gravidade que representa a equação violência (número brutal de mortes de jovens) + educação sem qualidade + abandono da escola + falta de oportunidade de trabalho para a juventude. Não há políticas melhor estruturadas (embora existam avanços) nem vontade política suficiente para encarar a questão… e, de novo, a imprensa igualmente não trabalha sobre o tema a não ser quando do lançamento de algum novo estudo” – reclama Veet Vivarta.

Deixo como minha esta pergunta: será que precisaremos de um candidato de 20 e poucos anos para dar “atenção eleitoral” a este problema, que se observado sob as perspectivas de gênero e raça será ainda maior?



* Geraldinho Vieira
é Consultor na área da comunicação para a transformação social, Geraldinho Vieira é vice-presidente da ANDI – Agência de Notícias dos Direitos da Infância, professor da Fundación Nuevo Periodista Iberoamericano (Colômbia), colaborador da Fundação Ford na área do Direito à Comunicação e conselheiro do projeto Saúde Criança.

**este texto foi originalmente publicado no Blog do Noblat.
http://oglobo.globo.com/pais/noblat

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