A transformação de um município se dá pelas pessoas

Por: GIFE| Notícias| 29/09/2008

Por Michaela Rueda*

Raquel Severo e Rosilane Peres até há pouco tempo eram mulheres com poucas perspectivas profissionais além de promover o sustento básico de suas famílias. Raquel mantinha uma pequena loja de armarinhos com a mesma clientela e produtos há anos, e Rosilane vendia lingerie de porta-em-porta. As duas moradoras de Barroso, município mineiro de 20 mil habitantes a cerca de 200 km de Belo Horizonte, acreditavam que haviam conseguido o máximo que a vida profissional podia lhes dar em uma localidade pequena.

Em menos de dois anos, o comércio de Raquel foi ampliado e a receita cresceu 40%. A então sacoleira Rosilane agora é dona de uma loja e planeja abrir o primeiro sex-shop da cidade. O que mudou a vida dessas duas mulheres em tão pouco tempo foi uma receita simples: a redescoberta de sua auto-estima e a capacitação para os negócios.

Elas fazem parte do projeto Rumo Certo, apoiado pelo Instituto Holcim (IH), e que estimulou, em média, o aumento de 30% nas vendas do comércio barrosense em 12 meses. Ao iniciar suas atividades em Barroso, em 2002, o Instituto deparou com um desafio que parecia impossível: promover o desenvolvimento de uma localidade que durante décadas dependeu praticamente dos empregos na prefeitura e na fábrica de cimento, a única grande indústria local. A fábrica, de origem nacional e comprada pelo grupo suíço Holcim em 1996, ocupava a perigosa posição de único motor econômico do município.

Isso acontecia porque os moradores da cidade não conseguiam enxergar perspectivas na região e em si próprios. Mudar esse cenário se tornou a meta do Instituto em Barroso. Para sistematizar como essa revolução ocorreria, a coordenação do Instituto foi buscar inspiração nos antigos gregos e montou o Programa Ortópolis (Orto = correta e Polis = cidade), do qual o Rumo Certo faz parte.

A principal preocupação do Instituto ao iniciar o trabalho era de não criar outra forma de dependência. Daí a importância de se construir o trabalho em conjunto com a comunidade e com os mais diversos agentes locais. O início foi muito difícil. Eram longas conversas nem sempre providas de confiança da população na possibilidade de grandes mudanças. Para muitos parecia que andávamos em círculos, pois eram debates seguidos de debates, mas sem resultados tangíveis.

Aos poucos se começou a notar a mudança de comportamento. Aqueles que nãoviam outras possibilidades para si e para seus filhos além de trabalhar na prefeitura ou na fábrica passaram a mostrar espírito empreendedor. E a descobrir que a região poderia oferecer mais atrativos e potencialidades do que imaginavam.

No planejamento do Ortópolis estão, entre outros, o desenvolvimento dos setores eletromecânico, hoteleiro, gastronômico e de artesanato, além do incentivo a ações voltadas para a economia rural, cidadania e inclusão social. O olhar dos barrosenses para o mercado também vem sendo ampliado. A indústria de cimento e a prefeitura não são mais vistos como os únicos clientes em potencial de boa parte dos negócios. As artesãs e costureiras de Barroso, por exemplo, criaram há dois anos com o apoio do IH, uma coleção de roupas desenhadas pelo estilista Ronaldo Fraga. Os modelos foram apresentados na capital mineira e projetaram as barrosenses em nível estadual. Outro trabalho que vem ganhando corpo na região é o projeto Vaca Gorda, na área de pecuária leiteira, pois o município possui cerca de 150 pequenos proprietários rurais.

O Ortópolis conta hoje com parcerias importantes como Sebrae/MG, a Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis (Ascab), com a Fundação Interamericana e o Instituto Ecofuturo. O programa vai gradualmente tornando-se sustentável. É neste ponto que, nós do IH – que demos o passo inicial para a constituição de Ortópolis – medimos os principais avanços dos trabalhos. Afinal, não há mais espaço para o paternalismo empresarial.

Um instituto ou fundação seja ele qual for, ligado ou não a uma empresa ou governo, deve assumir o papel de facilitador e jamais ter uma postura paternalista nas comunidades em que atua. Essa é nossa principal preocupação. Por isso, faz parte do cronograma do Ortópolis uma participação cada vez menor do Instituto nas atividades. Como o tempo, vamos nos tornando apenas orientadores, consultores. Queremos que a população de Barroso não precise mais de nós.

Além da revitalização do comércio e desenvolvimento de vários setores da economia, o Ortópolis também atua nas áreas de cultura, educação e meio ambiente. Entre os projetos que já apresentam resultados concretos estão a formação de uma biblioteca comunitária e a realização um programa de incentivo à leitura nos ônibus municipais. São duas mil pessoas cadastradas. O Educando Verde, voltado para educação ambiental, já levou sua mensagem a aproximadamente 2 mil crianças e adultos barrosenses que se tornaram multiplicadores de conceitos ligados a reciclagem de lixo e uso racional de água, entre outros.

Ainda há muito a fazer, mas apresentar esse modelo de cidade a outras regiões do Brasil pode ser um começo para replicar um projeto em que acreditamos, apostamos e vimos florescer. Demos início, por meio do Instituto Holcim, ao trabalho também em Magé, no interior do Rio de Janeiro. É um pequeno passo, mas temos certeza que será um exemplo para empresas e entidades adotarem o modelo em outras comunidades. Um fato já nos é bastante claro e nos impulsiona para a conquista dos desafios que fazem parte da nova etapa: acreditar na proposta de Ortópolis, e em seu mais forte significado, que é o de desenvolver uma cidade correta, e porque não, mais justa.

* Michaela Rueda é vice-presidente executiva do Instituto Holcim e diretorade Recursos Humanos da Holcim Brasil.

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