Antagonismo pontua mesa sobre Marco Legal
Por: GIFE| Notícias| 12/04/2010Consenso e fragmentação. Duas palavras tão antagônicas pontuaram a mesa “Marco regulatório e legitimidade da sociedade civil”, realizada na tarde de quinta-feira, 8 de abril, durante o 6º Congresso GIFE. Em meio ao tema polêmico, os palestrantes foram unânimes sobre a necessidade de a iniciativa privada e organizações do terceiro setor se unirem, na busca por um marco regulatório que dê diretrizes à área, cuja legislação, segundo eles, é confusa e multifacetada.
Na visão dos convidados à mesa, são leis, portarias e medidas provisórias que regem o setor com normas díspares, defasadas e que geram, além de dúvidas, entendimentos diversos. “Cada órgão oficial tem uma interpretação de uma área e muitas vezes um órgão não concorda com o outro. Um cenário esquizofrênico que gera um ambiente de insegurança jurídica muito grande”, sentenciou o mediador Eduardo Pannunzio, da Rubens Naves, Santo Jr Hesketh Escritórios Associados de Advocacia.
A polêmica inicial exposta na mesa ganhou coro. Até porque, em termos de regulação, o setor evoluiu muito pouco nos últimos anos. Leis como a do Voluntariado, das Organizações Sociais, ambas do fim dos anos 90, ou como a da Filantropia, editada no ano passado, foram apontadas como pequenos avanços da área de ISP.
Mas para alguns, nem isso. É o caso de Silvio Santa’ana, superintendente da Fundação Grupo Esquel Brasil. “Tivemos pequenas pioras”, reclamou o executivo, pontuando que foi multiplicada por dois a carga tributária para o setor e reduzida a capacidade de as entidades obterem recursos. “O marco legal está cada vez mais comprometido”, concluiu Santa’ana.
Por esta razão, todos os palestrantes se uniram em coro para reivindicar uma regulação para o terceiro setor. Um debate que, na opinião deles, deve seguir alguns pilares básicos. Um deles é o reforço da identidade das empresas e entidades – e o desafio de mostrar isso para a sociedade. Questões de carga tributária, trabalhistas e de incentivos fiscais também são apontadas como fundamentais para regulamentar a área. E, segundo os especialistas presentes no congresso, as normas, cobranças e obrigações devem levar em consideração o tamanho, a estrutura e a abrangência de cada um.
“As entidades na base são completamente diferentes das organizações empresariais, mas todas têm um denominador comum”, ponderou Flavia Regina de Souza, advogada e co-autora do estudo “Perspectivas para o Marco Legal do Terceiro Setor”, publicação elaborada pelo GIFE, como apoio da Ford Foundation e da W.K. Kellogg Foundation (leia aqui).
Essas disparidades foram ilustradas, durante a mesa de debates, pela palestrante Claudia Jeunon, assessora de Responsabilidade Social Empresarial da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). Ela revelou que um grupo de trabalho foi criado dentro da entidade justamente para discutir o marco regulatório depois de casos como o relatado por um empresário, que estava atônito pelo fato de a organização que ele apoiava ter sofrido 12 auditorias em pouco mais de um ano.
A representante da Firjan complementou o debate com outros exemplos de contradições da legislação. “Que setor é esse que fiscaliza 12 vezes uma entidade e outra não recebe qualquer auditoria? Como uma líder comunitária presta contas da mesma forma que uma ONG?”, questionou Jeunon.
Um dos caminhos apontados para minimizar essas disparidades foi justamente o da auto-regulação do setor. A assessora da Firjan, inclusive, citou o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) como um exemplo eficaz. Para os palestrantes, uma auto-regulação do terceiro setor seria um primeiro e importante passo para promover mudanças na legislação.
Mas não há solução simples para reger a área do Investimento Social Privado. “Mas a auto-regulação não pode substituir a regulação da sociedade, que é o marco legal. As duas funcionariam simultaneamente”, ressaltou Silvio Santa’ana, da Esquel.
Para alcançar a tão sonhada regulação do setor, contudo, o primeiro passo frisado por todos os participantes da mesa é um consenso entre as entidades, fundações, organizações e empresas. “O Governo editou a MP da filantropia porque precisava regularizar o setor e as entidades envolvidas não se entendiam”, alertou Flavia Regina de Souza.
Silvio Santa’ana destacou que o Congresso GIFE é uma importante ferramenta para buscar essa união. “Nossa intenção nessa articulação é fazer um chamado para definir uma identidade que nos permita negociar com o Governo e com os governantes por melhorias no sistema legal”, sugeriu o representante da Esquel.
Todos, contudo, foram realistas e estão cientes de que o caminho ainda é bastante longo. “O terceiro setor tem de conversar muito. E as organizações, a partir das suas próprias áreas de atuação, já poderiam se organizar participando dos conselhos de políticas públicas, pelo menos para melhorar o debate local”, sugeriu Flavia.