Campinas: após um ano, Coalizão articula redes locais e fortalece ecossistema de impacto
Por: Fundação FEAC| Notícias| 07/08/2023A chegada da Coalizão pelo Impacto em Campinas, há um ano, jogou luz sobre o ecossistema de negócios de impacto social no município. Nesses 12 meses, um plano de ação foi posto em prática, com a articulação de empresas, organizações da sociedade civil, universidades, startups e fundações. O objetivo? Encontrar novos caminhos de atuação e cooperação na solução de antigos problemas sociais e ambientais do Brasil.
A Fundação FEAC é uma das parceiras estratégicas da Coalizão pelo Impacto, uma iniciativa nacional liderada pelo Instituto de Cidadania Empresarial (ICE). A ação prevê aportar R$ 34 milhões até 2026 em seis cidades: Campinas (SP), Brasília (DF), Porto Alegre (RS), Fortaleza (CE), Belém (PA) e Paranaguá (PR).
O Instituto Helda Gerdau, Instituto Humanize e Somos Um são correalizadores da iniciativa. Além da FEAC, figuram como parceiros estratégicos Cosan, Fundação Educar DPaschoal, Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, Instituto Sabin, Raia Drogasil e o mais recente, Instituto BEJA.
Até o momento, o Conselho Local de Campinas mobiliza lideranças de diversas organizações ligadas a projetos de empreendedorismo com impacto direto na sociedade e no meio ambiente. Na reunião de maio, estiveram presentes representantes de Fundação FEAC, PUC-Campinas, Fundação Educar DPaschoal, ICE, Inova Unicamp, Phomenta, Senai, Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Tecnologia e Inovação (SMDETI) e dos negócios de impacto 2.5 Ventures, CampinasTech, CasaHacker e Venture Hub.
Por meio de chamada, três projetos foram aprovados na cidade (conheça mais sobre os projetos no quadro, no final do texto). Cerca de R$ 220 mil será partilhado entre os três. O orçamento total da Coalizão até o final de 2023 está estimado em R$ 8.086.303, sendo para Campinas: R$ 749.258.
“Em Campinas temos muitos atores que integram esse ecossistema de impacto. A jornada do empreendedor aqui oferece muitas oportunidades. Há aceleradoras, agências de inovação e de pesquisa, universidades e muitas organizações da sociedade civil atuantes. Além do poder público, que também apoia a iniciativa através da Secretaria de Desenvolvimento Econômico”, conta Karina Cappelli, especialista em Inclusão Produtiva, da Fundação FEAC.
Universidade mais engajadas e integradas
Cappelli acompanha de perto a agenda da Coalizão pelo Impacto, em Campinas, que vem trabalhando pelo fortalecimento do ecossistema local. “Uma das necessidades identificadas por professores que já trabalhavam com o tema do impacto foi a importância de envolver as universidades de forma institucionalizada”, explica.
Assim nasceu, no contexto da Coalizão pelo Impacto, o programa Universidades Mais Engajadas. Nele, as instituições – 12 ao todo, duas em cada cidade – se comprometem com recursos e carga horária dedicada ao tema. Em Campinas, PUC e o Mackenzie assinaram o acordo de cooperação com o programa.
O programa Universidades Mais Engajadas atua em âmbito nacional na Coalizão. À frente da missão está Camila Aloi, gerente do programa Academia, do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) e quem lidera a dimensão Instituições de Ensino Superior da Coalizão pelo Impacto. “Uma de nossas fontes de inspiração é o programa da Ashoka University, que vem há anos falando de formar agentes de transformação”, conta.
O programa construiu uma rede entre os docentes das instituições participantes, além de um mapeamento prévio dos desafios e potências de cada território. “Nós olhamos para as universidades e vimos se possuíam incubadora e aceleradora, quantas disciplinas abordavam negócios e investimentos de impacto, e quais professores dentro da universidade já lidavam com essa temática”, diz Camila Aloi.
Ela explica que o objetivo do programa é institucionalizar o tema de investimento e negócios de impacto, empreendedorismo e inovação social na grade de disciplinas das universidades. Para formar agentes transformadores que possam replicar este conhecimento começa em setembro e vai até dezembro uma jornada de ensino que terá a participação dos professores das universidades da Coalizão.
“A temática pode estar nas disciplinas de Engenharia, Direito, Medicina, em todas as áreas. Podemos colocar esse olhar de impacto socioambiental positivo em todos os empreendimentos, negócios e serviços que prestamos. Nós queremos que a universidade forme profissionais que se vejam como agentes de transformação e que eles possam atuar nas suas práticas sempre com esse olhar de impacto socioambiental positivo”, reforça Aloi.
Formando agentes de transformação social
Ela considera que também é papel da universidade fazer as articulações com os agentes que podem acelerar um projeto universitário. “Por exemplo, o aluno faz um projeto para se formar no curso, um TCC. Ele idealiza o projeto, mas a ideia nunca sai do papel”, diz. Estas articulações, ao contrário, ajudam a transformar a ideia em realidade.
Como exemplo, Aloi cita a experiência paraense do negócio social Amana Katu, que significa “chuva boa”, em tupi guarani. O negócio investiu em tecnologias sustentáveis e de baixo custo para ampliar o acesso à água tratada nas comunidades ribeirinhas da Amazônia. O premiado projeto foi criado por estudantes da Universidade Federal do Pará, em 2017, e se tornou realidade com apoio de empresas parceiras e OSC de empreendedorismo social.
Ao transformar as chuvas em água potável, a inovação levou água limpa a mais de 10 mil pessoas na região. Com isso, o empreendimento tornou-se um bem-sucedido negócio de impacto social e ambiental que comercializa suas soluções com outros países.
Assim como a Amana Katu, existem muitas experiências nascidas de projetos promissores que acabam engavetados ou restritos a pequenos nichos, embora possuam potencial para impactar e beneficiar muito mais pessoas.
“[O negócio social Amana Katu] era o projeto de um aluno que ia se formar na universidade. Nesse caso, foi possível fazer essa ponte do que ele estava propondo com a necessidade do território, acelerar esse negócio e associá-lo a outros parceiros”, diz Aloi. Todos os anos, muitas outras boas ideias não têm a mesma sorte.
Projeto da PUC enfoca alunos do ensino médio público
A professora e pró-reitora de Inovação da PUC, Camila Brasil Gonçalves Campos, diz que nesse um ano de Coalizão a universidade se apropriou muito do tema e teve vários avanços importantes. “Nós já temos pelo menos uma proposta de negócio de impacto que derivou dos nossos alunos por conta de um professor, que trouxe esse debate para a sala de aula”, conta Campos.
Ela se refere ao projeto Cria Impacto, aprovado em edital, que tem como objetivo incentivar o desenvolvimento do empreendedorismo de impacto social e fomentar a aceleração de negócios de impacto entre jovens em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
“A partir de agosto, o programa Cria Impacto vai atuar com alunos do ensino médio público de Campinas. A ideia é que seja um programa permanente da Rede Mescla [espaço da PUC dedicado a estimular atividades de inovação e empreendedorismo] para startups interessadas em receber esse tipo de mentoria e de aceleração focadas em negócio de impacto social e ambiental.”
A pró-reitora diz que percebe que o tema está cada vez mais presente nas gerações que chegam à universidade. “Eles chegam na universidade com esse tipo de anseio de querer ter um papel no desenvolvimento de uma sociedade mais justa, mais solidária, mais igualitária e que a gente cuide do meio ambiente. Essa preocupação está cada vez mais presente nas gerações que estão chegando na universidade.”
Nova lógica econômica contraria pilares do capitalismo
Camila Campos destaca que é muito importante o debate público do tema para que as pessoas entendam melhor do que se trata. “Ainda falta esclarecer que trabalhar por uma sociedade mais justa não é uma ação filantrópica, que só pode ser feita pelo governo ou por uma iniciativa civil voluntária. Existem negócios que podem ajudar na resolução de problemas sociais. É possível ter uma participação economicamente ativa para transformar a sociedade, e que o fruto desse trabalho tenha impacto real e positivo na sociedade. Eu acho que é nesse ponto que a gente está. Precisamos ensinar que é possível empreender dessa forma. E aí acho que está o nosso papel na universidade. Levar essa mensagem e as formas de como isso pode ser feito”, avalia.
Ela acredita que essa “economia do bem” é a economia do futuro e que alcançá-la exigirá o enfrentamento de grandes desafios. “A lógica da sociedade de consumo tem impactos severos para o meio ambiente e para o social também. Aliás, embora falemos muito na economia circular, trata-se de uma nova lógica de funcionamento econômico que contraria alguns pilares do próprio capitalismo”, analisa.
Para ela, a formação dessas redes ajuda a pensar e entender melhor essa nova lógica. “Juntos, a gente consegue pensar melhor, fazer mais e essa já é uma lógica dessa nova economia que vem surgindo.”
O próximo passo da jornada será entre os dias 4 e 6 de setembro, em São Paulo: um encontro nacional presencial de lideranças dos 15 projetos aprovados nas seis cidades da Coalizão para acompanhamento e troca de experiências.
Campanholi: “Negócio de impacto é estratégia eficaz de mitigação de riscos sociais e ambientais”
O paulista Wilson Campanholi Jr. é coordenador local da Coalizão pelo Impacto, em Campinas, e CEO fundador da 2.5 Ventures. Ele destaca que a cidade possui um ecossistema robusto de inovação e tecnologia, composto por diversas organizações, hubs e centros de excelência.
Para Campanholi, o crescimento significativo no campo do investimento de impacto reflete a conscientização crescente dos investidores em relação às questões sociais e ambientais. “A importância de abordar estas questões transcende a finalidade moral, já que esses problemas também representam riscos reais e significativos para a economia global”, avalia.
Confira a entrevista:
Após a seleção dos três projetos, etapa já concluída, quais são os próximos passos da Coalizão em Campinas?
Wilson Campanholi Jr. – Todos os três projetos já participaram de uma reunião nacional de alinhamento com time da Secretaria Executiva Nacional da Coalizão pelo Impacto, responsável por essa dimensão, que cuida do apoio às organizações de impacto. Eles puderam tirar dúvidas sobre o processo de acompanhamento e conhecer as outras iniciativas aprovadas.
Em Campinas, dois dos três projetos aprovados já assinaram contratos e iniciaram algumas atividades previstas no planejamento. Neste mês de julho, a secretaria terá uma segunda reunião com as organizações responsáveis pelos projetos selecionados para dar continuidade ao processo de acompanhamento e identificar oportunidades de apoio direto.
Na sua visão, como os negócios de impacto social em geral podem ajudar a enfrentar vulnerabilidades sociais nos municípios?
Campanholi – Os negócios de impacto têm como missão resolver problemas ou vulnerabilidades sociais ou socioambientais e, ao mesmo tempo, com igual importância, gerar resultado/retorno financeiro para retroalimentar o próprio negócio.
Sendo assim, podem combater vulnerabilidades sociais nos municípios por meio da geração de emprego e renda para populações vulneráveis, fornecimento de produtos e serviços acessíveis e capacitação de indivíduos para melhorar suas próprias vidas.
Por exemplo, a MeuChapa é um exemplo de negócio social, que nasceu em Campinas, funcionando como uma plataforma que conecta empresas com trabalhadores autônomos para serviços de carga e descarga. Ao proporcionar oportunidades de trabalho mais seguras e previsíveis para os trabalhadores informais, promove inclusão econômica e melhoria das condições de trabalho.
O outro exemplo que gosto também é a duLocal, pois aborda múltiplas questões sociais e ambientais em seu modelo de operação. Com foco na alimentação orgânica, a empresa conecta pequenos agricultores locais e cozinheiras da periferia de São Paulo, incentivando a economia local, promovendo a produção sustentável e o consumo consciente.
Além disso, ao utilizar ingredientes sazonais e locais, reduz a pegada de carbono das refeições, contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas. A duLocal também promove a educação alimentar e a capacitação de suas cozinheiras, contribuindo para o empoderamento dessas mulheres e para a redução da desigualdade social.
Quais desafios e potências você destacaria no trabalho realizado na região de Campinas?
Campanholi – A cidade de Campinas, apesar de seu potente ecossistema de inovação e tecnologia, enfrenta desafios significativos na construção de um ambiente robusto para negócios de impacto. A complexidade resultante da presença de múltiplas organizações favorece a formação de silos – microecossistemas com agendas próprias, o que dificulta a articulação de uma agenda unificada de impacto. Embora a cidade tenha uma abundância de recursos e infraestrutura, a jornada do empreendedor ainda apresenta obstáculos. O acesso ao financiamento permanece como uma barreira, pois investidores ainda se mostram cautelosos ao lidar com negócios de impacto.
No entanto, é inegável que Campinas também apresenta um conjunto de oportunidades propício ao desenvolvimento de negócios de impacto. Seu ecossistema robusto de inovação e tecnologia, composto por diversas organizações, hubs e centros de excelência, tem também universidades de alta qualidade, o que estabelece uma base sólida para o surgimento e crescimento da agenda e de negócios de impacto.
A cidade também dispõe de acesso a recursos abundantes e infraestrutura de qualidade, fatores fundamentais para a viabilidade desta agenda. Campinas conta com um Conselho Local da Coalizão pelo Impacto formado por organizações bastante representativas e engajadas com o projeto.
Investir em negócios que tenham finalidade social e/ou ambiental pode se tornar o novo “normal” do mundo dos negócios? Há espaço para isso ou ainda é utopia?
Campanholi – Investir em negócios com finalidade social e/ou ambiental está ganhando cada vez mais espaço no mundo dos negócios. O crescimento significativo no campo do investimento de impacto reflete a conscientização crescente dos investidores em relação às questões sociais e ambientais.
Eles estão procurando maneiras de alinhar seus portfólios de investimento com seus valores pessoais, ao mesmo tempo em que obtêm um bom retorno financeiro. Da mesma forma, os consumidores estão cada vez mais dispostos a apoiar empresas com impacto positivo, favorecendo o crescimento dessa agenda.
Além disso, a importância de abordar questões sociais e ambientais transcende a finalidade moral, já que esses problemas também representam riscos reais e significativos para a economia global. O investimento de impacto surge como uma estratégia eficaz de mitigação de riscos.
Os governos e reguladores estão exigindo maior transparência das empresas em relação ao seu impacto social e ambiental e incentivando ainda mais investimentos nestes tipos de negócios. Portanto, o espaço para negócios de impacto no mundo dos negócios não é apenas uma utopia, mas uma realidade emergente.
Saiba mais sobre os projetos aprovados em Campinas
Os três projetos em andamento possuem características complementares, com diferentes contribuições para a jornada de empreendedores de impacto em Campinas. São eles:
PerifaImpacto – Realizado pela Casa Hacker, é um projeto de apoio a negócios de impacto periféricos. Mobiliza pessoas das periferias para empreenderem com a lente de impacto.
As lideranças participam de capacitações para desenvolverem uma ideia ou desafio, visando impulsionar suas causas e seguir para a próxima fase da jornada, a incubação.
A incubação terá até 10 negócios de impacto social que participarão de imersões e mentorias, e ainda contarão com investimento de capital semente não reembolsável.
Conexões de Impacto 2.5 – 2.5 Ventures – O objetivo é fortalecer o ecossistema de empreendedorismo de impacto de Campinas. Faz isso identificando e apoiando negócios de impacto que contribuem para a solução dos problemas socioambientais da região metropolitana. Facilita conexões com investidores e o acesso ao mercado com grandes corporações da região.
Serão selecionados até 20 negócios de impacto que possam contribuir para a resolução de problemas socioambientais. Eles receberão workshops sobre o ecossistema de impacto e teoria da mudança, modelo de negócios e pitch (forma de apresentar o próprio negócio). O objetivo é preparar os empreendedores e seus negócios para a conexão com mercado e investidores.
Cada startup terá uma mentoria individual para cada um dos temas. Ao final do programa, haverá um encontro presencial, no qual as startups terão a oportunidade de fazer a apresentação dos seus pitches para uma banca formada por investidores, grandes corporações.
Cria Impacto – Realizado pela PUC-Campinas, o Programa de Pré-aceleração de Negócios de Impacto tem como objetivo incentivar o desenvolvimento do empreendedorismo de impacto social. Para isso, fomenta a aceleração de negócios de impacto entre jovens em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
O público-alvo são alunos de ensino médio de escola pública localizada em região que concentra jovens em situação de vulnerabilidade socioeconômica na cidade de Campinas. Os trabalhos se iniciam já em agosto.
Os participantes serão capacitados para a construção de soluções aos problemas sociais e/ou ambientais. Terão a participação de professores, alunos da graduação, da Liga Acadêmica de Negócios de Impacto e de eventuais entidades e/ou negócios de impacto que atuem na temática, em Campinas. Além do suporte e aconselhamento, durante todo o processo, dos professores especialistas da PUC-Campinas e mentores da Rede Mescla.