Campinas avança na efetiva implantação da Lei da Escuta Protegida

Por: Fundação FEAC| Notícias| 19/06/2023
Campinas avança na efetiva implantação da Lei da Escuta Protegida

Em vigor desde abril de 2018, a Lei Federal nº 13.431/2017 estabelece o sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes vítimas e testemunhas de violências. Também conhecida como Lei da Escuta Protegida, essa legislação é um grande marco para a causa da proteção à infância, especialmente no que se refere à prevenção secundária. Ou seja, para evitar que a criança ou adolescente sofra revitimização. Isso acontece porque, no curso do atendimento pelos diversos agentes da rede de proteção, em geral, a vítima precisa repetir sua história (revivendo a violência sofrida), muitas vezes em ambientes inadequados ou para pessoas sem treinamento.

Essa nova legislação criou uma série de mecanismos para organizar o papel de cada agente da rede de proteção. E, mais que isso, determina que cada município brasileiro crie instrumentos de coordenação, estabeleça fluxos e protocolos de atendimento integrados e implante sistemas de gestão dos casos de violência. Determina ainda que o Sistema de Justiça crie Salas de Depoimento Especializado para ouvir as vítimas ou testemunhas de violência.

“Esse mecanismo é fundamental, uma vez que, 80% dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes não deixam marcas. Se a vítima não falar, a melhor investigação policial ou a melhor perícia não dará conta. E ela só vai falar se estiver em ambiente seguro”, afirma Benedito Rodrigues dos Santos, professor da Universidade de Brasília (UnB) e consultor da Childhood Brasil e do Unicef.

Segundo a Childhood Brasil, Organização que atua pela proteção à infância e adolescência, já foram implantadas mais de mil dessas salas de depoimento especializado no Brasil, boa parte delas no Estado de São Paulo, que estão fazendo diferença. Nos casos de crianças e adolescentes que passam por essas salas especializadas, a taxa de responsabilização dos agressores sobe para 80% – sem esse recurso é de apenas 6%.

Mas para que a lei efetivamente saia do papel é preciso que cada município brasileiro cumpra sua parte, organizando a rede de proteção local. “A falta de integração dos serviços da rede de proteção termina por revitimizar as crianças e adolescentes quando do atendimento. A resposta a esta situação foi a criação da Lei 13.431/17, mas infelizmente poucos municípios a implantaram. Isso gera mais violência para as crianças e faz com que os autores de violência não sejam responsabilizados. Desta forma contribuem para a perpetuação do ciclo de impunidade”, explica Itamar Gonçalves, superintendente de Advocacy da Childhood Brasil.

Situação em Campinas

Pensando em contribuir para a implementação da lei nº 13.431/2017, a FEAC, em parceria com a Childhood Brasil, investiu no projeto Município Livre de Violências contra crianças e adolescentes: cumprimento das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. “Esse projeto foi lançado em 2021 e já cumprimos algumas etapas importantes”, afirma Natália Valente, especialista em violências da FEAC.

Uma dessas etapas foi a assessoria prestada ao Conselho Municipal da Criança e do Adolescente (CMDCA) para criação do Comitê de Gestão Colegiado da Rede de Cuidado e de Proteção Social de Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência de Campinas.

Para qualificar o atendimento também é necessário investir em formação, como destaca Maria Angélica Bossolane Batista, presidente do CMDCA de Campinas. “É preciso investir massivamente em processo formativos e no trabalho de conscientização dos profissionais e de toda a comunidade quanto à importância da notificação e visibilidade dos dados de abuso, violência e exploração sexual de crianças e adolescentes”, defende. Essa é outra linha de ação da FEAC. Em junho do ano passado, por exemplo, a FEAC promoveu a formação do Crescer Sem Violência. O projeto contou com a participação de 101 profissionais da Rede de Proteção.

Agora, está em curso mais uma fase do Município Livre de Violências: a de coleta de dados para mapeamento dos gargalos e potencialidades da Rede de Proteção de Campinas. “Esses dados são importantes para o próximo passo que será a elaboração dos fluxos de atendimento e dos protocolos integrados a serem implantados no município”, diz Itamar.

Depois disso, adianta Itamar, a próxima fase do projeto prevê a possibilidade de se pensar a criação de Centros de Atendimento Integrado. A ideia é oferecer todos os serviços da rede de proteção, como saúde e assistência social. “Hoje, a criança ou adolescente vítima de violência faz uma verdadeira via crucis. Queremos que seja ela acolhida em um único equipamento, que concentre todos esses serviços, para que se sinta acolhida, protegida, não sofra pressão social e não desista de falar”. Segundo Itamar, Campinas é vista com um berço de novas metodologias. Com a conclusão da implementação da Lei da Escuta Protegida, certamente será um centro de referência contra a revitimização de crianças e adolescentes que irá inspirar outros municípios.

O que é a escuta protegida?

A lei nº 13.431/2017, conhecida como Lei da Escuta Protegida, foi criada para evitar que a vítima ou testemunha de violência sexual seja revitimizada ao longo do atendimento da Rede de Proteção.
Para isso, criou vários mecanismos que possibilitam que cada um dos atores dessa Rede de Proteção atue de acordo com suas atribuições, de forma integrada, e a vítima não tenha que repetir sua história inúmeras vezes, revivendo a violência que sofreu.

Nos municípios, estipula que o poder público crie um Comitê de Gestão Colegiada para coordenar esse atendimento e fluxos e protocolos de atendimentos integrados. O Sistema de Justiça deve criar Salas de Depoimento Especializadas, com pessoal treinado para ouvir as vítimas. Também é importante que haja um ambiente seguro para que ela se sinta encorajada e não tenha medo de falar.

Por Iracy Paulina

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