Captação de recursos exige criatividade e capacitação
Por: GIFE| Notícias| 04/03/2002O Presidente da Associação Brasileira de Captação de Recursos, Custódio Pereira, lançou recentemente o livro Captação de Recursos – Fund Raising: conhecendo melhor porque as pessoas contribuem. A obra é uma adaptação da dissertação do mestrado do autor, que reúne desde conceitos sobre o tema até as principais legislações vigentes em outros países.
redeGIFE – Como foi feita sua pesquisa?
Custódio Pereira – Foi feita com mais de 200 pessoas vinculadas a instituições ou não, principalmente no estado de São Paulo. O questionário foi destinado a saber se as pessoas contribuem com causas sociais, além dos aspectos que o motivam ou impedem a doação.
redeGIFE – Qual a principal revelação que sua pesquisa traz? Houve alguma surpresa ao conhecer as motivações das pessoas que contribuem com organizações sem fins lucrativos?
Pereira – O que me surpreendeu foi a semelhança que existe entre o comportamento do doador de outros países com o nosso. Tem-se a idéia de que os doadores brasileiros têm características muito diferentes dos outros, mas isso não é verdade. É claro que há variações percentuais importantes, mas este fato não muda o perfil.
redeGIFE – Independente da situação econômica dos países?
Pereira – Sim, independente da economia do país.
redeGIFE – Que fatores levam as pessoas a não contribuir?
Pereira – A falta de credibilidade nas instituições. Nos Estados Unidos, as organizações têm credibilidade e visibilidade maiores do que no Brasil. Mas lá o respondente da pesquisa afirma que se sente muito mais seguro quando recebe os relatórios financeiros ou quando conhecem o dirigente da instituição filantrópica. Esses itens que dão credibilidade lá também são relevantes no Brasil também.
redeGIFE – Que outros destaques sua pesquisa a diferenciam de outras publicações sobre o tema já editadas no Brasil?
Pereira – Livros sobre captação de recursos de autores brasileiros, que eu conheço, só existem dois com o conteúdo total sobre o tema. Existem outros dois traduzidos para o português, somando quatro publicações. No entanto, a demanda sobre o assunto é muito grande, existe muita coisa que pode ser abordada. Nos Estados Unidos existem mais de 200 títulos sobre captação de recursos. Um ponto curioso da minha pesquisa é que grande parte dos respondentes, 92,7%, já fizeram alguma contribuição financeira para a causa social. Outra coisa interessante é que meio ambiente é o último item de interesse que motiva o doador. Crianças são as que mais mobilizam. Mas fica uma pergunta: como uma ONG como o Greenpeace, que trata de temas ambientais, capta tantos recursos? Porque é uma instituição com credibilidade, sabe apresentar sua causa e acaba sensibilizando as pessoas.
redeGIFE – Qual seria o perfil de um bom captador de recursos para o terceiro setor?
Pereira – A organização que tem interesse em captar recursos precisa transmitir credibilidade. As pessoas não doam porque acham que as instituições não são sérias ou mal administradas. É preciso saber apresentar a causa com criatividade e transparência. Os doadores gostam de se ligar a causas bem sucedidas. Existem vários métodos para atingir o doador. Esse assunto tem uma grande complexidade porque vai depender da causa, do doador que se deseja atingir, entre outros fatores.
redeGIFE – A sensibilização é essencial para a pessoa doar?
Pereira – Não. A pessoa pode fazer uma doação que não se encaixa dentro deste critério, porque de alguma maneira teve contato com a causa. Por exemplo, a pessoa que perdeu um pai com a doença de Parkinson ou teve um filho com a síndrome de Down tem muito mais propensão e afinidade em conhecer a causa. Ela se identifica com o problema. Às vezes pode não ter praticidade, pode não ter criatividade, mas a causa significa muito. Mas só isso não é suficiente. Existem pessoas que doam para causas desconhecidas. Fiz na minha pesquisa essa investigação.
redeGIFE – Porque a pessoa faz esse tipo de doação?
Pereira – Por constrangimento ou por oportunidade. Esses dados são do Brasil: 30,9% já doaram para causas ou instituições desconhecidas por uma questão prática como, por exemplo, no caso da Apae que recolhe moedinhas. Já 10% das pessoas esperam ter uma oportunidade. Ela pode doar até para causas desconhecidas se houver um jeito prático de captar a doação. Quando se fala em Clickarvore ou Clickfome, a pessoa pode estar doando sem gastar nada. Isso é um elemento importante.
redeGIFE – Quais são os erros mais comuns cometidos pelos captadores de recursos? Como podem ser evitados?
Pereira – Acho que não saber pedir é o erro mais comum. Constrangendo ela pode até captar um vez, mas na segunda vez fica mais difícil. Precisa ter o convencimento da causa. Ao fazer isso, ou mesmo pedir sob a condição “”que se você não me ajudar a creche vai fechar””, o captador está mostrando que a administração não está sendo competente. As pessoas não gostam de se aliar a causas fracassadas. Elas gostam de dizer que participam de ações bem sucedidas. Os outros erros podem acontecer na abordagem, apresentação da causa e na maneira como o projeto e a instituição são apresentados.
redeGIFE – Como o terceiro setor pode superar tais problemas e melhorar o seu desempenho na captação?
Pereira – Normalmente as instituições só sobrevivem com criatividade e captação de recursos, mas investem muito pouco no treinamento das pessoas envolvidas no processo. É muito empírico. A pessoa não está treinada ou preparada, faz aquilo por dom, por jeito, mas não recebe uma capacitação. Na medida do possível, as instituições que precisam captar têm que treinar, separar uma pessoa para ela fazer mais aquele tipo de papel, adquirindo experiência. Isso vai dar visibilidade à instituição, competência ao captador e condições para a organização captar. Para esse fim existe a Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR).
redeGIFE – Qual o trabalho desenvolvido pela ABCR?
Pereira – A missão é promover, desenvolver e regulamentar a atividade de captação de recursos no Brasil. Se a organização tiver um interlocutor com credibilidade e competente, ele consegue encontrar o doador e obter a doação, mas se você colocar uma pessoa despreparada pode estar comprometendo a sua instituição e a sua causa. Nosso objetivo é colaborar para que nossas instituições filantrópicas sérias possam progredir e manter sua causa com profissionais competentes e éticos na captação de recursos.
redeGIFE – Qual é a sua opinião sobre a qualidade dos captadores de recursos no Brasil?
Pereira – Temos pessoas com muita vocação e competentes, mas podemos ter mais captadores capacitados, treinados e preparados para isso. A maioria não tem treinamento ou troca de experiências. Está carente de informação e de integração. Quando a pessoa está preparada melhora sua qualidade na captação. Ela sabe preparar um projeto, sabe para quem e como apresentá-lo, procura mostrar de uma maneira que o doador se sensibilize. O resultado é muito melhor. O que acontece é que se você não tem o preparo profissional, acaba sempre por viver no limiar da crise, sempre tendo uma dificuldade enorme porque as coisas são feitas sem um programa, um planejamento ou uma estrutura. Essa é a situação do Brasil. Existem muitos com capacidade e competência, mas pouquíssimos com treinamento.
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