Como os investidores sociais podem atuar na área da promoção da saúde?

Por: GIFE| Notícias| 18/10/2013

A mestre e doutora em Saúde Pública, Regina Canel, defendeu recentemente sua tese de doutorado na Faculdade de Saúde Pública (USP) que tratava o tema da contribuição para a elaboração de diretrizes e estratégias para o Investimento Social Privado em Saúde no Brasil.

Regina realizou um estudo com investidores sociais que atuam na área para entender como os projetos são planejados e executados e como eles poderiam ser potencializados para gerar um maior impacto na saúde do país.

Apesar do resultado encontrado de que muitos atores trabalham baseados em atendimentos e prevenção a doença, a pesquisadora defende que o processo saúde-doença não é apenas linear (resultante de causa-efeito) e nem tampouco restrito ao ponto de vista biomédico, mas deve ser percebido dentro de um modelo holístico, no qual as metas da saúde são atingidas juntamente com a melhoria da qualidade de vida, a justiça social e o desenvolvimento sustentável- o que é chamado de Promoção da Saúde.

O redeGIFE conversou com a Regina para entender melhor quais os resultados alcançados em seu estudo e como o investidor social que atua na área da saúde pode se envolver mais com o tema da Promoção da Saúde. Confira a entrevista:

redeGIFE- Como você explica a afirmação de que a Saúde é um estado gerado pela sociedade?
Regina Canel– A Saúde é resultante de condições de vida e é diretamente impactada por fatores ambientais, sociais e econômicos. E a forma como a sociedade se estrutura, e os valores sociais que fundamentam ou sustentam essa estrutura, nos diversos setores sociais como educação, lazer, habitação, Meio Ambiente,…Saúde, impacta diretamente nas condições de vida de seus cidadãos.

Políticas e práticas de Promoção da Saúde operam sobre as causas ou fatores que geram ou mantêm as doenças, num determinado tempo e espaço ou contexto (que pode ser mundial, regional ou local); operam sobre múltiplos determinantes.

Há uma série de questões novas para as diversas áreas sociais, inclusive a da Saúde. Os problemas ou questões em pauta são coletivos, de todos, porque seus determinantes e consequências afetam a todos, direta ou indiretamente. Mesmo com a coexistência de interesses individuais, de grupos e coletivos, as soluções e o processo até elas são de interesse e responsabilidade de cada um e de todos.

Algumas reflexões são procedentes neste momento da nossa história, como: o que interliga uma multidão heterogênea, nos movimentos atuais de rua, onde a saúde é um dos temas em questão? Quais as novas formas de participação, associação e cooperação? Como se constroi o que é comum e o que é público em uma sociedade desigual? A luta pelo direito à saúde é uma questão de cidadania?

redeGIFE- Por que os modelos de saúde baseados em atendimento a doenças e na prevenção são inviáveis a longo prazo?
Regina- Porque perpetuam as doenças, uma vez que não focam as ações sobre as causas que geram as doenças, e sim sobre os efeitos que as doenças geram.

Soma-se a isso o fato que a população cresce, o que aumenta o número de usuários do sistema, e cresce a demanda pela inclusão dos excluídos desse sistema, quer essa inclusão se deva por uma questão de direitos humanos, quer pelo acesso a medicamentos e serviços como consumidores.

Além disso, ao longo do tempo surgem novos agravos à saúde. A sociedade atual apresenta novos problemas de saúde, como aqueles relacionados ao aumento da população idosa, ao uso de drogas, à violência civil e doméstica, às doenças infecciosas novas e reemergentes, à degradação ambiental, entre outros, além da ineficiência do modelo biomédico para muitos desse problemas.

E em países emergentes como o Brasil, a Saúde depara-se com um difícil enfrentamento, uma vez que convivem problemas resultantes de transformações sociais e culturais (como o uso do tabaco), com aqueles característicos da pobreza (como a desnutrição) e aqueles que eram característicos de países ricos (como a obesidade).

Como resultante, ocorre uma demanda crescente de recursos e acaba por inviabilizar qualquer Sistema de Saúde.

redeGIFE- Quais são as áreas de atuação da Promoção da Saúde?
Regina- A área da Saúde é transversal a todos os setores e a PS é uma forma de entendimento e ação em Saúde. Como dito anteriormente, essa concepção tem como objetivo promover a melhoria da qualidade de vida da população e reduzir a vulnerabilidade e os riscos à saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes. Propõe que se atue sobre esses determinantes, ou seja, sobre as condições de vida da população.

As falas sobre Sustentabilidade, Responsabilidade Social Empresarial (RSE), Investimento Social Privado (ISP) costumam envolver o elemento Saúde. Recebem o “sobrenome” de saudável: políticas públicas, economia, consumo, ambiente, comunidade, “”empresa………saudável””.

O que isso quer dizer? A Sustentabilidade ou Desenvolvimento Sustentável objetiva, em última instância, a continuidade da vida e das organizações humanas no planeta e, podemos acrescentar, acima de tudo com qualidade de vida, o que necessariamente envolve saúde e bem-estar, nos aspectos econômico, ambiental e social (o triple bottom line da Sustentabilidade).

Tal qual a PS propõe, deve-se atuar nos determinantes da Saúde, o que envolve todos os setores produtivos e sociais e a sociedade civil, para impulsionar medidas sustentáveis frente aos desafios de um mundo globalizado.

redeGIFE- Em sua tese, você identificou que a maioria dos investidores sociais que atuam em saúde realizam projetos voltados à assistência ou à prevenção. É possível o investimento social se envolver de forma estratégica na Promoção da Saúde?
Regina- Certamente. De acordo com os resultados obtidos na pesquisa da Tese, o ISP em Saúde não está suficientemente estruturado, é complexo, caro, especializado, voltado para a assistência, com resultados incertos e de difícil gestão para o setor privado. No Brasil, cabe ao Setor Público garantir a Saúde como um direito constitucional e definir Políticas Públicas. O setor privado pode contribuir com a inclusão da Saúde, voltada para seus determinantes, no planejamento estratégico dos programas de RSE, mas necessita ter suporte especializado na sua gestão.

Ainda de acordo com resultados das entrevistas realizadas na pesquisa da Tese, a composição entre os setores (sociais e produtivos) e a Academia pode favorecer resultados efetivos e fornecer suporte técnico “…para fazer a ponte e a mediação de engajamento do setor privado e de como investir, na área da saúde”. A pesquisa objetivou contribuir para a elaboração de diretrizes e estratégias que orientem administradores e gestores do setor privado na definição de políticas e práticas de ISP em Saúde, com o foco na PS.

redeGIFE- Quais são as estratégias para que o Investimento Social em Saúde seja eficaz no que diz respeito à promoção de saúde?
Regina- Nas conclusões da Tese, duas estratégias foram consideradas fundamentais: 1) inclusão da Educação em Saúde na área da Educação, ampliando a atuação dessa área do ISP e 2) a Intersetorialidade: inclusão da Promoção da Saúde em todas as áreas temáticas ou de atuação do ISP, com o foco nos determinantes da Saúde. Quanto à questão da gestão, a PS pode ser incorporada nos aspectos sociais, econômicos e ambientais do sistema de gestão da organização que esteja atuando baseada na RSE.

redeGIFE- Há algum projeto para apresentar os dados aos Investidores Sociais e envolvê-los mais no tema?
Regina- Em agosto deste ano foi realizado um Seminário, na Faculdade de Saúde Pública da USP, onde desenvolvi o Doutorado, para apresentação dos resultados da Tese às organizações que participaram da pesquisa (todas elas associadas do GIFE) e para o aprofundamento sobre esses resultados, a partir da contribuição dos participantes no evento.

Das questões abordadas no Seminário, concluiu-se pelo desenvolvimento de um Núcleo multi-institucional e transsetorial de Pesquisa e Ação sobre Responsabilidade Social Pública-Privada (e ISP) e Saúde, com foco na PS, o qual está em fase de estruturação.

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