Comunicação ainda é um desafio para organizações do terceiro setor

Por: GIFE| Notícias| 12/10/2003

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Neste fim de semana (17 e 18/10), o GIFE realiza o sexto módulo do curso Ferramentas de Gestão 2003, em Curitiba (PR). Com o tema Comunicação e Marketing na Área Social, este módulo aborda as estratégias e as ferramentas para o planejamento da comunicação de organizações sociais. A forma como elas são utilizadas é um dos temas mais discutidos no terceiro setor.

O debate ocorre principalmente em torno dos motivos que direcionam a divulgação das iniciativas sociais: de um lado está a exposição da marca e de produtos; do outro a difusão dos resultados dos projetos como uma forma de estimular a participação de outros investidores e de sistematizar uma experiência que rendeu bons resultados.

Para a jornalista Sandra Mara Costa, redatora de publicações como o Guia GIFE sobre Investimento Social Privado e Investimento Social na Idade Mídia, apesar de alguns avanços, a comunicação ainda está mais a serviço da busca de visibilidade do que da missão institucional. Ela também acredita que ainda não existe, de modo geral, uma consciência sobre a importância de comunicar resultados.

“”No apanhado geral de reportagens que povoam a grande imprensa ou mesmo nos relatórios anuais, a tendência é comunicar ações ou explicar a destinação de recursos em um determinado exercício orçamentário, sem detalhar seus efeitos. A avaliação de impacto ainda é uma sofisticação para muitas organizações sem fins lucrativos.””

Quem primeiro deve se apropriar de um investimento social privado é a comunidade para a qual os recursos são destinados. Se uma ação na área social é difundida antes que ela tenha seus primeiros resultados, seja por meio de propaganda seja em reportagens jornalísticas, quem está se beneficiando em primeiro lugar é a organização, e não a comunidade.

“”É preciso centrar a divulgação nos resultados do investimento social. Uma reportagem que mostra os frutos de um projeto é muito mais rica do que a que simplesmente diz que foi doada uma grande quantia para determinada ação social””, analisa Vinicius Precioso, coordenador de comunicação do GIFE.

De acordo com Ricardo Voltolini, professor de marketing social da Universidade de São Paulo e consultor de terceiro setor da TV Cultura e da Ofício Social Consultoria, as organizações aos poucos estão tomando essa consciência. Um dos motivos é a crescente crítica e a exigência dos diversos públicos de interesse – beneficiários, doadores, voluntários, imprensa, entre outros – em relação à qualidade dos resultados das ações.

“”As mensagens estão mais propositivas e passaram a focar mais as soluções do que os problemas. Estão menos centradas nas conveniências dos emissores e mais nas necessidades dos receptores. A credibilidade e o modo como as pessoas percebem a marca passaram a ser ativos importantes no sucesso de uma organização.””

Para isso, Miguel Fontes, diretor da John Snow Brasil Consultoria, afirma que é imprescindível ter precisão de indicadores e valorização da missão organizacional. “”Muitas organizações confundem resultados com suas próprias ações e não os associam a indicadores de impacto. É comum, por exemplo, verificar nos relatórios números sobre a população beneficiada por uma determinada ação. No entanto, isso não pode ser considerado um indicador, pois o verdadeiro resultado é o número de pessoas que adotaram uma determinada conduta ou prática a partir de uma intervenção social.””

Ele conta que muitos profissionais de comunicação tentam tirar “”leite de pedra””, já que os indicadores não estão disponíveis, e utilizam qualquer número para demonstrar que as ações tiveram algum impacto. “”A comunicação não é algo isolado. Se a organização não estabelece mecanismos de gestão estratégica de suas atividades, a área de comunicação não poderá fazer milagres””, explica.

Cynthia Rosemburg, responsável pelo Guia da Boa Cidadania, editado anualmente pela Revista Exame e que em 2003 tem o apoio do GIFE, conta que, para algumas empresas que fazem investimento social, ainda falta uma preocupação em sistematizar as informações sobre suas ações. “”Percebemos menos uma dificuldade de comunicação e mais uma falta de entendimento a respeito do próprio projeto. Em alguns casos, elas não deixam claro o que fazem exatamente, não entendem ou confundem conceitos essenciais do investimento social, como metas, objetivos e monitoramento.””

Marketing social – Outro conceito bastante utilizado atualmente, mas muitas vezes de maneira equivocada, é marketing social. Miguel Fontes explica que o termo não é sinônimo de comunicação. “”Muitos confundem marketing social com marketing relacionado a causas ou promoção social de marketing. São coisas totalmente distintas. O marketing social visa à transformação social, não se rende a compromissos comerciais e sempre será gerido por organizações de interesse público.””

Para Voltolini, o termo marketing social é vago e superficial no Brasil. “”Para simplificar o complexo, a expressão passou a designar três outras coisas diferentes: o marketing praticado por organizações sociais, o marketing praticado por empresas interessadas em associar suas marcas a causas sociais e o marketing ético praticado por empresas. Assim, ele equivocadamente dá nome a práticas absolutamente distintas entre si.””

Ele explica que, conceitualmente, marketing social é o uso de ferramentas de marketing para mudar o comportamento de pessoas em relação a determinadas questões de natureza social. “”Ainda existe preconceito em relação ao marketing na área social, mas ele diminuiu muito na medida em que as organizações passaram a enxergá-lo como um instrumento para planejar as relações de troca com seus públicos de interesse. As ferramentas, como se sabe, não são boas ou ruins em si, dependem do uso que se faz delas””, afirma.

Ismael Rocha, coordenador da ESPM Social e professor do curso Ferramentas de Gestão, conta que poucos profissionais entendem que o marketing social só acontece quando há mudança de comportamento. “”Então, simplesmente transferem as ferramentas do marketing tradicional para o social, gerando mal-estar inúmeras vezes. Marketing social tem uma cara, uma maneira correta de ser abordado, uma ética própria.””

Ferramentas – Feita de maneira eficiente, a comunicação é capaz de render apoio a um projeto, promover a instituição e disseminar uma causa. Miguel Fontes lembra que, se houver mobilização estratégica da mídia, a organização poderá dar visibilidade também a suas metodologias e tecnologias sociais criadas para a solução de problemas ou promoção de causas. “”Assim, essa mobilização poderá se constituir em um meio para despertar a atenção e o interesse de outras instituições em utilizar essas tecnologias em diversas regiões do país.””

Os problemas de comunicação na área social, segundo ele, estão diretamente relacionados à falta de planejamento. “”As decisões sobre os materiais a serem produzidos, incluindo campanhas, ainda são tomadas sem uma pesquisa mercadológica sobre quais mensagens e audiências seriam mais apropriadas para o material a ser produzido.””

De acordo com Ricardo Voltolini, algumas organizações entendem que o fazer cotidiano e o planejamento são campos distintos. “”Um dos mais graves equívocos decorrentes da escassez de planejamento é o que se convencionou chamar de ′falta de foco′. Comunica-se mal por que não se sabe o quê comunicar, para quem comunicar, como comunicar e, principalmente, com quais objetivos.””

Ele aponta a falta de mais profissionais especializados como um dos motivos das falhas nas suas estratégias de comunicação de organizações sociais, além do fato disso ser visto como algo dispendioso. Mas existem alternativas quando a questão financeira prejudica esta área. Para Voltolini, isso é questão de atitude. “”Muitas organizações acreditam que um folheto bem impresso ou uma campanha na TV resolverá todos os seus problemas de comunicação. No entanto, conheço muitas que a fazem bem utilizando como ferramenta a velha e boa comunicação pessoal.””

Ismael Rocha concorda que as organizações precisam perceber que comunicação é muito mais que folhetos, sites ou telemarketing. “”Esses são mitos que comprometem um olhar mais estratégico sobre a comunicação. Muitas vezes a solução está dentro de casa. Comunicar é encantar pessoas e as ferramentas são muitas, mas devem ser utilizadas corretamente. O importante é que organizações se abram, mostrem-se e sejam pró-ativas com o ferramental que possuem.””

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