Dados? Para quê?
Por: GIFE| Notícias| 24/09/2012Maria Chertok*
Da maneira como enxergo isto, a tensão chave, quando se trata de dados, está entre o desejo de ter dados sobre tudo e com todos os detalhes possíveis e sua utilidade. A idéia de projeto genérico mais popular é desenvolver uma base de dados, colocá-la à disposição e online para ser usada por todos. A cada dois meses encontro projetos como este em diferentes áreas relacionadas à filantropia. Os seus criadores sinceramente acreditam que uma base de dados promoverá transparência e cooperação, ajudará a evitar duplicidades e, em geral, resolverá adequadamente todos os problemas do setor. Eu não tenho essa certeza.
Existe um refrão muito conhecido que diz: “Quando você vê uma fundação, você vê uma fundação.”. A maior dificuldade para coletar dados sobre fundações é que elas são muito diferentes entre si e, assim sendo, a generalização raramente funciona. Faço parte do grupo de trabalho do Fórum de Doadores Russos que está desenvolvendo diretrizes para mapear as fundações russas com a intenção de obter dados confiáveis sobre o setor filantrópico russo. Para chegar ao questionário universal tivemos que descartar uma série de importantes detalhes: as questões ou eram amplamente não aplicáveis ou sabíamos que a fundação não teria condições de fornecer as informações por motivos técnicos ou as informações não seriam comparáveis com outras. Porém os detalhes são muito importantes! Assim, quando coletamos os dados e os apresentamos de forma agregada ou de acordo com um padrão geral, poderíamos ter chegado a um cenário medíocre de informações, perdendo detalhes importantes ou perdendo completamente o objetivo.
Um exemplo clássico: não existe uma estrutura padrão para as informações gerenciais financeiras de uma fundação, portanto quando perguntado o quanto foi gasto em doações, se os seus próprios programas e gerenciamento que vão gerar os dados que não podem ser comparados com outros por serem medidos de forma diferente, digo que este não é apenas um problema russo. Uma vez eu dei uma rápida olhada nos relatórios anuais de algumas grandes fundações européias e norte-americanas com a mesma idéia em mente sobre os seus orçamentos e acabei com muitos itens e números que eram tão diferentes quanto o são alhos e bugalhos.
Devemos estar especialmente conscientes de estas limitações quando os dados são apresentados ao público. Em muitos países, incluindo a Rússia, a consciência pública sobre filantropia é limitada e com frequência desconfiam das organizações de caridade e fundações. Poderia ser muito fácil para o público enxergar nos dados algo muito diferente do que foi pretendido mostrar. Portanto, os dados para uso público, precisam de muito contexto e interpretação para assegurar que realmente refletem as particularidades de um setor específico. Caso contrário, podemos correr o risco de sermos mal entendidos ou mal interpretados. Não estou defendendo o sigilo, precisamos apenas estar cientes do tipo de público a que se destinam os dados para que sejam apresentados adequadamente.
Acredito que os dados que produzimos para o público devem ser simples e auto-explicativos. Nós também precisamos muito desse tipo de dados básicos para as nossas comunidades. Quantas fundações existem? Anualmente contribuem com quanto? Quantas pessoas se beneficiam de suas doações e programas? Dados como esses podem estimular a consciência do público e promover debates públicos sobre a filantropia.
A minha experiência mostra que a melhor maneira de apresentar os dados com esta finalidade é através de indicadores e avaliações. Uma simples Charities Aid Foundation World Giving Index (Índice mundial de doações a Fundação de ajuda a caridades) gera mais menções na mídia do que tudo o que temos feito na Rússia nos últimos 18 anos! Vejo três importantes benefícios desses indicadores: eles respondem a uma questão básica (quantas pessoas fazem doações no mundo?), mostram indicadores de tendências de fácil leitura (nosso país está melhor a cada ano) e podem ser comparados (nós estamos progredindo mais que os nossos vizinhos). Isto é muito atrativo para a mídia e compreensível para o público. Outros indicadores e classificações de valores podem ser desenvolvidos para definir objetos de políticas governamentais. Por exemplo, o governo russo tem feito progresso para melhorar a posição russa no Índice de Fazendo Negócios do Banco Mundial.
A grande desvantagem dos indicadores é que eles simplificam idéias complexas para números muito básicos e a sua metodologia é geralmente criticada por especialistas em pesquisas. Mas são bons para dar imagens vivas para serem interpretadas e discutidas. Também fornecem oportunidade para mostrar detalhes ao público que de outra forma não estaria em condições de entender.
Alguns filantropos profissionais precisam muito de dados complexos a fim de facilitar os intercâmbios profissionais, as parcerias, o aprendizado e o compartilhamento. Outras organizações, incluindo as circunscrições das fundações e os reguladores, também precisam de dados simples que podem ajudá-los a entender do que se trata o nosso setor. Se eu tiver que escolher como aplicar os meus limitados recursos, escolheria este último.
*Maria Chertok é Diretora da CAF Rússia.