Desafios e oportunidades para a promoção da leitura e da escrita de qualidade no Brasil

Por: GIFE| Notícias| 02/06/2014

De acordo com o Indicador Nacional de Analfabetismo Funcional (Inaf), a população brasileira adulta que declara gostar muito de ler permanece estagnada em 30% há uma década. Já o IBGE (2009) mostra que nosso gasto médio mensal com livros é de apenas R$ 10. Por fim, uma pesquisa do Instituto Pró-Livro de 2011 aponta que 40% dos adolescentes brasileiros têm, no máximo, 10 livros em casa (no nosso vizinho Chile apenas 20% encontram-se nessa situação). Esse cenário mostra que ainda somos uma nação de poucos leitores.

Por outro lado, o mesmo Inaf sugere que temos alcançado avanços significativos nos níveis básicos de alfabetização. O país já conseguiu alcançar a meta de ao menos uma biblioteca pública em cada município e a indústria literária mostra sinais de aquecimento. Em meio a esse momento, repleto de desafios e oportunidades, a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, em parceria com o Instituto Ecofuturo e a Escola nacional de Administração Pública (EnAP), promoveram em 2013 a oficina “Leitura e escrita de qualidade para todos”, em Brasília (DF).

O encontro, que reuniu 36 especialistas – representando a academia, órgãos públicos e organizações da sociedade civil -, teve como objetivo discutir a importância da leitura de qualidade, identificar oportunidades e planejar iniciativas públicas e privadas dirigidas à promoção da leitura. O resultado das diversas mesas, oficinas e plenárias, fora sistematizado no relatório do evento.

O documento pretende apresentar os trabalhos realizados durante o encontro e destacar reflexões sobre temas fundamentais para a promoção da leitura, como o cenário da produção literária nacional, o acesso a bibliotecas públicas, a qualidade de acervos e o desafio de engajar famílias e escolas no estímulo e aprimoramento do hábito de ler e escrever.

Os registros da oficina e os apontamentos do grupo de trabalho, que continua coeso, apontam fragilidades e reflexões sobre o cenário atual, mas não deixam de ressaltar que a construção de um amplo sistema capaz de monitorar os progressos da leitura no Brasil é viável – sendo uma das metas em andamento do Plano Nacional do Livro e Leitura (PnLL). O cenário indica um momento de transição.

A cultura da leitura no Brasil

De acordo com Christine Fontelles, diretora de Educação e Cultura do Instituto Ecofuturo, o quadro geral é que não temos uma cultura de leitura consolidada no Brasil. Segunda ela, a leitura é um hábito cultural, social, que surge do convívio e do contato com os livros. Christine aponta dados da pesquisa “Retratos da Leitura no Brasil”, de 2009, realizada pelo Instituto Pró-Livro em parceria com a ABRELIVROS, Câmara Brasileira do Livro e Sindicato Nacional dos Editores de Livros, que mostra a influência da mãe, ou da responsável mulher pela família, nos hábitos de leitura das crianças.

O estudo indica que 73% das crianças têm as mães como maior influenciadora. Na resposta estimulada, em que se podia escolher duas alternativas, a figura da mãe alcançou 49%, seguida pela professora, com 33%, e pelo pai, com 30%. “A pesquisa mostra que a família pode influenciar contra ou a favor na formação de não leitores, quando os membros da família não oferecem o exemplo de ler ou quando não têm livros que circulam em suas casas”, analisa.

Patrícia Lacerda, gerente de Educação, Arte e Cultura do Instituto C&A, outra organização que atua fortemente em iniciativas voltadas à promoção da leitura, reforça a importância da família. “A escolarização da população melhorou de forma geral, mas os índices de analfabetismo ainda são muito altos o que dificulta a transmissão intergeracional do gosto pela leitura, ou seja, poucos filhos têm em casa esse tipo de estímulo, simplesmente porque seus pais não são leitores.”

Patrícia também propõe uma reflexão sobre o papel da escola. “A forma com que as escolas tradicionalmente introduzem a leitura aos alunos, especialmente a leitura literária, costuma ser muito normativa, instrumental, como se houvesse uma forma certa de ler e entender e não uma relação onde cada livro ‘conversa’ com cada leitor de uma forma singular.”

Outro ponto fundamental é o acesso à produção literária. Christine explica que é preciso garantir a oferta de livros em bibliotecas e, principalmente, de maneira que atraia o público leitor. “Parece evidente que peso igual à existência de bibliotecas é a sua atratividade, inclusive para a realização de pesquisas escolares. O acervo deve ser pensado de forma a compor um estimulante conjunto de livros, bem como deve prever sua constante renovação e atualização, para manter e atrair o interesse de seus frequentadores.”

Para a diretora do Instituto Ecofuturo, é possível reverter um quadro de leitores desinteressados, ou com pouco acesso a livros, para um modelo pleno de cultura da leitura. Ela explica que o processo é complexo, exige atuação de diferentes setores da sociedade, mas é viável. “Devemos agir de forma cooperada e integrada, setores governamental, privado e a sociedade civil, para criar e assegurar a sustentabilidade de uma política pública que, de fato, contribua para a promoção do avanço dos indicadores de leitura e que tenha elevado poder de transformação.”

Patrícia Lacerda endossa a ideia de que é importante buscar sinergia entre investimentos públicos e privados. “Os investidores privados têm tido um importante papel de experimentar metodologias inovadoras, apoiar organizações da sociedade civil que fazem controle social, construir conhecimento, promover campanhas etc. A escala será dada na medida em que projetos e programas forem avaliados com consistência e seus aprendizados forem incorporados às politicas públicas. Penso que vivemos um momento maduro para uma colaboração, com negociação clara das responsabilidades de cada setor, agente e ator social.”

Para continuar lendo e conferir a entrevista com Christine Fontelles do Instituto Ecofutuco, clique aqui.

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