Desenvolvimento sustentado depende de luta contra a pobreza

Por: GIFE| Notícias| 19/11/2001

Segundo o relatório Situação da População Mundial 2001, divulgado pela ONU no início de novembro, o desenvolvimento sustentável do planeta está intrinsecamente ligado à luta contra a pobreza e à reversão do processo de destruição ambiental.

Para o vice-presidente do GIFE para o Meio Ambiente e diretor da Fundação O Boticário, Miguel Milano, os países ricos ocupam um importante papel nesta batalha.

redeGIFE – Qual sua opinião sobre o relatório?
Miguel Milano – Existe uma relação comprovadamente forte entre pobreza e destruição ambiental. Mas também existe uma relação com a riqueza. No primeiro caso os motivadores são a falta de tecnologia, o crescimento populacional e o uso inadequado dos recursos decorrentes da falta de conhecimento, de educação e de cultura.

redeGIFE – E no caso dos países ricos?
Milano – No caso da riqueza, a destruição ambiental se dá pelo excesso de consumo. Dessa forma, tanto uma situação quanto outra pode ser prejudicial. Porém, às vezes estatísticas podem enganar. O crescimento das florestas em termos de cobertura de área nos países mais desenvolvidos é estável, ao contrário das regiões mais pobres, onde há desmatamento para a utilização das terras para fins agrícolas ou para produção madeireira, por exemplo. Só que esta expansão da fronteira agrícola geralmente é para a produção de exportação para as nações ricas. Portanto, ao mesmo tempo em que os mais desenvolvidos têm melhor tecnologia para utilizar de maneira racional suas florestas, eles têm suas necessidades importadas de regiões em desenvolvimento.

redeGIFE – O relatório aponta que o crescimento da população mundial vai levar com que, em 2050, cerca de 45% das pessoas não tenham a cota mínima de 50 litros de água por dia para suas necessidades básicas. O senhor acha que este quadro ainda pode ser revertido?
Milano – Esse exercício de futurologia é extremamente difícil de fazer. Podemos até trabalhar com tendências e visualizar o futuro com base em todos os dados acumulados do passado. Porém, o ser humano é dotado de conhecimento, tecnologias e capacidades de desenvolver políticas que podem cercear algumas coisas e promover outras. O que eu quero dizer é que, com base nas tendências existentes, é possível se traçar planos que reduzam o risco de que este problema ocorra.

redeGIFE – Outra questão que vem sendo muito debatida é o Protocolo de Kyoto. Qual é a importância deste documento?
Milano – Um de seus pontos mais polêmicos é a questão da reposição florestal como forma de “”sugar”” gás carbônico da atmosfera. Esta questão chama muita atenção de países como o Brasil. Nossa grande extensão territorial faz com que sejamos atraentes num programa de investimentos para o plantio de florestas para a redução do aquecimento global. Isso é extremamente importante, mas não pode estar dissociado de uma política efetiva de redução de emissão de gases nocivos. Desde que foi criado o Protocolo, o único país do mundo que logrou algum resultado minimamente consistente, estabilizando ou retroagindo seus índices, foi a Inglaterra.

redeGIFE – O senhor acredita que as empresas estão conscientes de seu papel na diminuição da emissão de gases prejudiciais à atmosfera?
Milano – Existe tecnologia disponível e há uma consciência mundial da importância deste fato. Mas ambas são sistematicamente rejeitadas pelo poder econômico. Os grandes poluidores e consumidores de energia não-renovável resistem em mudar. Afinal de contas, o negócio deles está em jogo.

redeGIFE – Além de não poluir as águas e o ar, qual é o papel da iniciativa privada na preservação do ambiente?
Milano – O primeiro papel importante da iniciativa privada, e aqui deixo claro de que seja ela pessoa física ou jurídica, é cumprir a lei. É não agredir a natureza com poluição, não desmatar e não querer mudar a lei para piorar a situação, como a gente pode observar na questão do Código Florestal. Não é possível ser socialmente responsável tentando não cumprir a lei ou piorando-a. Além disso, é importante a iniciativa privada trabalhar como um investidor social, como fazem os associados do GIFE não só em meio ambiente, mas nas diferentes áreas em que atuam.

redeGIFE – Quais seriam os exemplos de atuação de um investidor social privado em meio ambiente?
Milano – As organizações de origem privada podem, por exemplo, investir na compra de terras para a criação de reservas e promover a conservação diretamente. Também podem desenvolver projetos de educação ambiental, pesquisa científica ou mesmo apoiar ONGs que trabalham na área ambiental de uma maneira geral.

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