Disposto a aprender?

Por: GIFE| Notícias| 12/03/2007

Carolyn Reynolds Mandell*

Quando, após uma década no cargo, Jim Wolfensohn deixou a presidência do Banco Mundial no ano passado, alguns grupos sociais expressaram sua preocupação com o que aconteceria ao seu legado de crescente participação da sociedade civil no trabalho do Banco Mundial. A preocupação era compartilhada por vários funcionários do banco, inclusive eu, que advogam o engajamento da sociedade civil e cujos cargos foram criados ou fortalecidos durante a era Wolfensohn.

Entretanto, em seu primeiro ano como presidente, Paul Wolfowitz demonstrou um forte compromisso, não apenas com a continuação, mas com o fortalecimento do envolvimento do Banco com a sociedade civil. Desde o início de sua presidência, em junho de 2005, Wolfowitz definiu como prioridade a busca das opiniões dos representantes da sociedade civil. Em seu discurso na primeira reunião anual, em setembro de 2005, ele salientou o papel-chave da sociedade civil na prestação de serviços essenciais aos pobres e na exigência de prestação de contas pelos governos [1]

Desde então, ele tem sempre enfatizado essa mensagem. A sociedade civil aparece em destaque no foco renovado do Banco Mundial, durante o último ano, na boa governança e na luta contra a corrupção como meio de reduzir a pobreza e alcançar melhores resultados econômicos. Em discurso proferido em abril de 2006 em Jacarta, Wolfowitz destacou que o Banco deve fazer mais para fortalecer as instituições que exigem a prestação de contas, incluindo a mídia independente e a sociedade civil. O esforço do assim chamado lado da “”demanda”” da boa governança passou a ser um pilar central da nova estratégia do banco na promoção da boa governança e no combate à corrupção. [2]

Na reunião anual entre o Banco e o FMI em 2006 em Cingapura, Wolfowitz instou junto ao governo anfitrião que revisse sua decisão de bloquear a entrada no país de representantes credenciados de Organizações da Sociedade Civil. Ele defendeu veementemente o direito da sociedade civil, inclusive dos críticos do Banco, de participar das reuniões anuais e de protestar pacificamente. “”Podemos concordar ou não com as críticas””, disse ele, “”mas faremos um trabalho muito melhor se nossos ouvidos estiverem abertos e ouvirmos.””

A sociedade civil como parte do modelo de negócios

Como um elemento da tendência do Banco, nos últimos anos, de trabalhar mais de perto com os parceiros externos, ser mais transparente e adotar uma abordagem mais holística do desenvolvimento, o engajamento da sociedade civil se tornou parte do modelo de negócios do Banco. No nível dos países, mais de dois terços dos novos projetos do Banco aprovados a cada ano envolvem Organizações da Sociedade Civil na sua elaboração, implementação e monitoramento. Quase metade dos mais de $1,1 bilhões que o Banco emprestou a Programas de AIDS em Múltiplos Países foi concedida a Organizações da Sociedade Civil, especialmente as que desenvolvem trabalhos nas comunidades.

O Banco consulta às Organizações da Sociedade Civil sobre a maioria de suas novas estratégias de assistência nos países e apóia as abordagens do desenvolvimento baseadas na “”prestação de contas sociais””, em que grupos de cidadãos são capacitados a monitorar os resultados do governo, desde o fluxo de recursos do HIPC em Gana e Zâmbia, até a qualidade dos serviços de saúde em Malavi.

No nível institucional, o Banco consulta periodicamente as Organizações da Sociedade Civil sobre suas políticas novas ou revistas, como divulgação de empréstimos e informações de política de desenvolvimento, e sobre questões como alterações climáticas e alívio de dívida. Parcerias estratégicas têm sido firmadas entre o Banco e Organizações da Sociedade Civil, como a World Bank-World Wildlife Fund Global Forest Alliance e o Critical Ecosystems Partnership Fund.

O Banco também fornece algum suporte financeiro direto a Organizações da Sociedade Civil, como em situações pós-conflito, para promover atividades cívicas ou projetos-piloto inovadores. O Banco regularmente convida a sociedade civil a participar do diálogo em eventos globais, como suas reuniões anuais e conferências da ONU, e estabeleceu mecanismos de envolvimento com clientelas específicas da sociedade civil, como sindicatos, organizações de cunho religioso, organizações de portadores de deficiência e redes de jovens.

Desafios do engajamento

Entretanto, muitos desafios antigos do engajamento efetivo da sociedade civil com o Banco ainda permanecem. Um relatório de março de 2005 intitulado Issues and Options for Strengthening Engagement Between the World Bank and Civil Society Organizations concluiu que o Banco precisa (a) aplicar de maneira mais consistente as lições aprendidas e melhores práticas no engajamento da sociedade civil; (b) diminuir a distância entre a sua retórica e as suas políticas e práticas; (c) mudar a sua maneira de fazer negócios para refletir as novas realidades da sociedade civil local e global; e (d) garantir ampla coerência e prestação de contas de seu envolvimento com as Organizações da Sociedade Civil.

O relatório cita, especificamente, as frustrações da sociedade civil com os recentes processos de consulta global, restrições à divulgação de informações, pouca supervisão e incentivos para os funcionários, e processos de negócios que não são adequados a estimular a participação da sociedade civil.

Para tratar dessas questões, o relatório fez uma série de recomendações, inclusive a de se encontrar maneiras mais inclusivas e mais estratégicas de se relacionar com as Organizações da Sociedade Civil, especialmente em nível global, melhorar as consultas aos interessados, fortalecer os sistemas internos de monitoramento do Banco, fornecer melhor orientação e suporte aos funcionários do Banco e fazer revisões periódicas do envolvimento do Banco com a sociedade civil. As conclusões e recomendações deste relatório complementam as contidas em um relatório de junho de 2005 intitulado A Call for Participatory Decisionmaking, encomendado por 16 redes globais da sociedade civil.

Tensões.

Devido ao papel que muitas Organizações da Sociedade Civil desempenham como “”vigias”” do governo e das instituições financiadas por fundos públicos, como o Banco, sempre haverá áreas de tensão entre os dois. As críticas da sociedade civil ao Banco, muitas vezes, resultam da falta de consenso entre os 184 governos-membros representados no Conselho do Banco sobre essas questões, como, por exemplo como aumentar a participação de países em desenvolvimento na estrutura de governança do banco, onde colocar os limites para a divulgação de informações, padrões mínimos para consultoria, e condicionalidade da ajuda.

Também não existe consenso entre as Organizações da Sociedade Civil sobre o seu envolvimento com o Banco. Alguns grupos desejam fazer parcerias em projetos financiados pelo Banco, outros se opõem a qualquer envolvimento ou se preocupam com a possibilidade de co-optação. Alguns países que tomam empréstimos do Banco têm sociedades civis fortes, com mecanismos estabelecidos de diálogo com seus governos, em outros, a falta de um ambiente facilitador é um grande impedimento à própria capacidade do Banco de chegar à sociedade civil.

. e oportunidades

Mesmo assim, o foco renovado do Banco na boa governança e no combate à corrupção apresenta uma oportunidade para a sociedade civil global. As Organizações da Sociedade Civil podem ajudar o Banco a direcionar e implementar o seu trabalho nessas áreas e pressionar os seus próprios governos a removerem alguns dos obstáculos ao envolvimento da sociedade civil na definição de políticas. Wolfowitz sinalizou sua disposição de questionar o modo como o Banco faz negócios com suas decisões de investigar, suspender ou postergar os empréstimos do Banco a países em que haja evidências de fraude ou corrupção.

Outro indicador de mudança dentro do Banco é sua disposição de atacar outros assuntos, uma vez tidos como políticos demais, como liberdade de imprensa e direitos humanos. O número de outubro de 2006 da revista trimestral do Banco Mundial, Development Outreach, enfocava direitos humanos e desenvolvimento. A revista incluiu um artigo da nova Consultora Geral do Banco, Ana Palacio, que escreve: “”Está claro agora que o Banco pode e, às vezes, deve, levar em conta os direitos humanos como parte de seu processo decisório.”” Ela prossegue propondo uma arcabouço legal para guiar o banco nesta área. Ainda assim, tanto para a governança quanto os direitos humanos, a falta de consenso do Conselho pode limitar o escopo e o ritmo da mudança.

Finalmente, o Banco e muitas Organizações da Sociedade Civil hoje têm um número crescente de agendas em comum – promoção de fluxos de ajuda maiores e mais efetivos, fair trade, educação para todos, alívio de dívida e sustentabilidade, combate às mudanças climáticas e garantia de que os investimentos em infra-estrutura sejam mais ecológica e socialmente sustentáveis – com atenção especial aos povos mais pobres da África ao Sul do Saara. Isso demonstra como a sociedade civil já teve um impacto no período inicial do mandato de Wolfowitz no Banco. Para as Organizações da Sociedade Civil, a continuação de sua influência dependerá tanto do seu envolvimento constante com o Banco e seus governos-membros quanto da mobilização para pressão popular. Para o Banco, o teste será se ele está ou não disposto não apenas a ouvir, mas também a aprender e adotar as lições do passado.

1 Visite www.worldbank.org. Para encontrar conferências, artigos e relatórios citados, consulte www.worldbank.org/civilsociety.

2 Visite www.worldbank.org/devcomm

*Carolyn Reynolds Mandell é coordenadora do Global Civil Society Team, World Bank. E- mail [email protected]. As opiniões expressas neste artigo são exclusivamente da autora, não implicam em nenhum endosso do Banco Mundial.

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