Diversidade aumenta criatividade de equipes em empresas e organizações da sociedade civil
Por: GIFE| Notícias| 22/07/2002MÔNICA HERCULANO
A diversidade de gênero e raça tem sido um tema de grande relevância e discussão, podendo garantir sustentabilidade e novas perspectivas na atuação das empresas e em suas ações sociais. Além de ser fator de competitividade – já que no mercado atual entende-se que equipes de trabalho muito homogêneas acabam por se tornar pouco criativas e mais fechadas ao diálogo com os diferentes segmentos de mercado -, a expressão da diversidade passou a ser vista como valor e princípio. Daí a busca por ações afirmativas que criem condições e demonstrem um compromisso efetivo para a superação das desigualdades.
No entanto, quem implanta programas de diversidade por princípios éticos tende a ter resultados mais duradouros. “”As empresas que apostam na diversidade apenas como mais uma moda no mundo da gestão empresarial também estão contribuindo de alguma forma contra a discriminação e se beneficiam disso por terem uma equipe marcada pelo mix de visões e de experiências. Mas as modas passam, e a diversidade como valor significa algo mais profundo e marca a forma de ser e agir da organização, agregando uma visão mais ampla da realidade e mais respeito às pessoas, e os seus esforços no campo da gestão e do bem comum””, explicao educador e diretor executivo da consultoria Amce, Reinaldo Bulgarelli.
Estabelecida pelo Ministério do Trabalho, a portaria 1.740/99 determina que o empregador informe a raça/cor do servidor na declaração da Rais (Relação Anual de Informações Sociais). A informação é obrigatória e está dentro do Programa Contra a Discriminação no Trabalho, atendendo a compromissos internacionais, mas foi questionada como uma prática racista.
O educador diz que o levantamento causou receio de tornar as diferenças explícitas, mas lembra que isso pode ser mais uma forma de preconceito. “”Uma organização que divulga a idéia de que somos todos diversos não tem problemas em identificar as pessoas nem as pessoas se sentem ameaçadas com isso. Os censos são instrumentos importantes para as organizações se perceberem e adotarem medidas para corrigir situações de discriminação e exclusão.””
Mas quando se trata da diversidade nas empresas e nas organizações de caráter social os números são distintos. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Ethos de Responsabilidade Social, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem), lançada no início deste ano, demonstrou que mulheres e negros ocupam apenas 6% dos postos de gerência nas empresas. Já o perfil dos associados à Abong (Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais), também divulgado neste ano, constatou que 65,69% do total das pessoas que trabalham nas organizações são mulheres, e 48,47% das funções de direção são ocupadas por contingente feminino.
Projeto da Fundação BankBoston, em parceira com a ONG Geledés – Instituto da Mulher Negra e a Fundação Cultural Palmares, o Geração XXI é um exemplo de ação afirmativa para pessoas negras e que conta com coordenação feminina. Criado em 1999, dirige-se na perspectiva do desenvolvimento humano sustentável, acompanhando 21 jovens negros, integrantes de famílias com renda per capita entre um e dois salários mínimos, residentes na cidade de São Paulo, e custeando seus estudos da 8ª série do Ensino Fundamental ao término da graduação universitária, por um período de nove anos. Além disso, ainda existem programas de geração de trabalho e renda, realização de cursos de formação de educadores para o combate ao racismo e à discriminação racial e de gênero nas escolas integrantes do projeto (17 escolas públicas e 5 particulares) e cafés culturais mensais, entre outros.
O projeto parte do princípio de que o acesso ao conhecimento interfere qualitativamente na vida cotidiana, na apropriação e na análise crítica do legado cultural da humanidade e na solução dos problemas práticos. Sendo assim, está estruturado de forma que os integrantes sejam motivados a tomar decisões, solicitar a colaboração dos demais companheiros, debater e criticar sem medo de serem sancionados por defender suas idéias.
“”Até a realização da III Conferência Mundial Contra o Racismo (na cidade de Durban, África do Sul, entre agosto e setembro de 2001), quando o debate sobre as ações afirmativas tomou vulto, o Geração XXI foi a lenha que manteve a chama do debate acesa, por ser a única experiência concreta existente. Agora, nosso principal objetivo está sendo alcançado, ou seja, constituir o programa como uma referência para outros projetos de ação afirmativa similares””, diz a coordenadora do projeto e presidente do Geledés, Maria Aparecida da Silva.
Reinaldo Bulgarelli ressalta a importância de as empresas e organizações sem fins lucrativos estabelecerem cronogramas e metas para realizarem uma ação afirmativa. “”Ao assumir um compromisso com a valorização e a promoção da diversidade, é preciso olhar a realidade, saber qual o grau de diversidade da organização, seja ela uma empresa ou uma entidade de terceiro setor, estabelecendo metas e um prazo para que a correção aconteça, geralmente tendo por base os dados da população da cidade ou do país. Quantas mulheres negras trabalham em nossas organizações? Que posições ocupam? O que faremos para melhorar essa situação? São algumas das questões que podem e devem ser feitas para começar””, explica.
A Natura é outro exemplo de organização que acredita na diversidade como fonte de vitalidade de todo o sistema e rede de relações institucionais. “”Trata-se de uma crença da Natura. Para a organização, a vida se manifesta através da diversidade. Acreditamos que do cultivo da interação entre os diferentes gera-se a energia necessária à evolução dos indivíduos, das organizações e da sociedade. Do ponto de vista do negócio de cosméticos, promover a diversidade nos quadros de funcionários oferece uma nova percepção sobre estética, beleza e uma perspectiva inovadora para conduzirmos os nossos projetos””, explica Cláudia Falcão, diretora de Recursos Humanos da empresa.
Para que o investimento social voltado à diversidade seja mais efetivo, além de contar com uma maior participação de mulheres e negros, Bulgarelli acredita ser necessária uma revisão da distribuição de oportunidades e benefícios nos programas. “”Nossa situação racial é tão grave que é preciso também realizar programas governamentais e não-governamentais de ação afirmativa que favoreçam as minorias na busca da construção da igualdade. Estamos longe disso porque temos medo de corrigir a situação achando que estamos discriminando.””