ECA 20 Anos: desafios superam conquistas?

Por: GIFE| Notícias| 19/07/2010

No último dia 14 de julho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou uma mensagem que encaminha ao Congresso projeto de lei sobre castigos corporais contra crianças e adolescentes. Defendendo o fim da palmada – já que “beliscão dói”, como disse -, o presidente trouxe polêmica na ressaca das comemorações dos 20 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O imbróglio pode ser explicado. Segundo o presidente, “vai ter muita gente reacionária nesse País, que vai dizer ′′Não, tão querendo impedir que a mãe eduque o filho′′”. No entanto, a discussão primeira não é simplesmente uma possível ingerência sobre o pátrio poder, mas a falta de prioridades na condução das políticas públicas fundamentais para a proteção integral da criança e do adolescente.

“”Há necessidade de assegurar que meninos e meninas cresçam livres de violência física ou psicológica””, disse a ministra do Desenvolvimento Social, Márcia Lopes. Chama a atenção, porém, que a restrição à “palmada educativa”, como foi chamada, não consta a lista dos grandes desafios para o setor.

A matéria, por exemplo, foi disciplinada há 70 anos pelo Código Penal, que prevê pena de 1 a 4 anos para qualquer “cuidador de criança” que a maltratar (sendo o ECA até redundante nesse ponto). Assim, há sempre uma chance do projeto enviado à Câmara ser apenas um jogo de cena.

Especialistas apontam que entre os principais obstáculos para a garantia de crianças e adolescente passam pela assistência social e justiça. Entre os principais problemas constam a falta especialização nas varas, pouco investimento na capacitação de magistrados e inexistência de equipes interdisciplinares trabalhando com o juiz.

Outro ponto fundamental é o fortalecimento dos Conselhos dos Direitos da Infância e da Adolescência – órgãos que formulam e acompanham a execução das políticas públicas de atendimento a esse público. Consideradas umas das maiores conquistas do Estatuto, essas instâncias são imprescindíveis para o cumprimento dos direitos da criança e do adolescente.

Apenas com o fortalecimento dessa rede de proteção é possível lutar contra os dramáticos índices nacionais de trabalho infantil (4,5 milhões de crianças e adolescentes estão em precárias situações de emprego) e o abuso sexual.

“O ECA veio para modernizar o modelo de doutrina, garantir direitos e determinar deveres. Mas cabe à sociedade – ou seja, a cada um de nós – garantir que seja mesmo aplicado, para melhorar a realidade a partir dele e vivermos de forma mais sustentável”, acredita o diretor-presidente da Fundação Telefônica, Sérgio Mindlin (leia artigo).

Educação
Os dados sobre ensino apresentaram resultados positivos depois de duas décadas de implementação do ECA. Atualmente, cerca de 7 milhões de crianças estão matriculadas na pré-escola, o que representa quase o dobro dos 3.628.285 alunos que frequentavam esta etapa do ensino em 1991.
No ensino médio, o número de estudantes matriculados é mais do que o dobro do total registrado em 1991. Naquele ano, eram 3.772.689 alunos nessa fase e, agora, são 8.288.520. Já no ensino fundamental, a quantidade de alunos teve um ligeiro aumento, passando de 29.203.724 para 31.512.884.
Os dados são do Censo Escolar, do Ministério da Educação, e referem-se a levantamentos dos anos de 1991 e 2009.

Reclusão
Apesar de o ECA prever que o jovem infrator poderá apenas cumprir medida de internação quando o crime considerado “grave ameaça ou atentado à vida”, a situação que se vê no país é outra. Segundo a subsecretária nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Carmem Oliveira, mais da metade dos adolescentes presos não cometeram delito grave.
Pelos dados apresentados por Carmem, hoje, mais de 50% dos adolescentes internos cumprem medida de internação por cometerem delitos contra o patrimônio (roubo ou furto). Para ela, nestes casos eles deveriam cumprir medidas alternativas, como prestação de serviço.
Por razões como o estas, o governo federal irá propor uma reforma para corrigir o que acredita ser “excesso de privação de liberdade”. Uma nova alteração do ECA –a 12ª da sua história–, em discussão no Ministério da Justiça, busca uma mudança de cultura do Judiciário.
Tecnologia
Um desafio para o Estatuto da Criança e do Adolescente também é evidenciado quando o assunto é tecnologia, ou melhor, a inclusão da internet e das novas tecnologias na rede de segurança dos menores.

Segundo o gerente de projetos do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), Mário Volpi, o ECA não contemplou um sistema de proteção que alcance o tráfico de imagens, a pedofilia, a pornografia e outros abusos que existem na internet. No entanto, Volpi acha que o estatuto promoveu novas metodologias com o uso da tecnologia, para fortalecer processos educativos.

“No plano da legislação, há também questões novas e urgentes, como marcos legais específicos que façam frente à pedofilia e à pornografia na internet. Faz-se urgente avançar no tema da convivência familiar e comunitária, reduzindo o abrigamento de crianças e jovens. Devemos nos mobilizar para a melhor estruturação dos Conselhos Tutelares e dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, instâncias de participação social estratégicas para o cumprimento do ECA. Enfim, há muito a fazer”, afirma o diretor-presidente do Instituto C&A, Paulo Castro, em artigo (clique aqui)
Plano
Com o objetivo de estabelecer políticas e metas para o setor durante os próximos dez anos, o Conanda está em processo de construção do Plano Decenal e da Política Nacional de Promoção dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes.

O documento estará disponível para consulta pública de 15 de agosto a 15 de setembro, no site do Conanda.

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