Educação infantil precisa de mais recursos e formação profissional

Por: GIFE| Notícias| 15/09/2003

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Na última segunda-feira (8/9), foi comemorado o Dia Internacional da Alfabetização. Em meio a diversos eventos sobre o tema, um dos assuntos que mereceu destaque foi a educação infantil, que envolve o atendimento a crianças de 0 a 6 anos de idade. Um estudo feito pelo Banco Mundial e pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em 2001 revelou que cada ano de pré-escola aumenta em 0,4 anos a escolaridade final, diminui em até 5% o nível de repetência e aumenta em até 6% a renda no futuro.

De acordo com dados preliminares do Censo Escolar 2003, divulgados no início do mês pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, do Ministério da Educação), no último ano houve um aumento de 3% no número de alunos matriculados em creches e na pré-escola, atingindo 6,4 milhões de crianças atendidas. No entanto, o Brasil possui cerca de 23 milhões de crianças entre 0 e 6 anos, o que significa que apenas 27,8% delas estão freqüentando essas instituições.

Não há no país um fundo específico para a área de educação infantil e o responsável por esse nível educacional é o município. A coordenadora do comitê Pernambuco da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Liz Ramos, afirma que 25% dos recursos arrecadados pelos municípios devem ser destinados à educação. “”Desses, 15% são para a educação fundamental. Os 10% que sobram são para educação infantil, ensino médio, educação de jovens e adultos, transporte escolar e outros. Daí a importância das ações de empresas e organizações da sociedade civil no apoio à cobertura do ensino infantil.””

A Fundação Orsa é um exemplo de organização que atua fortemente nessa área. Entre suas ações estão um programa de formação continuada de profissionais, um prêmio de qualidade e um movimento para a organização de fóruns estaduais sobre o tema. Na semana passada, durante o Seminário Nacional Financiamento à Educação Infantil, a fundação lançou o livro Município Feliz. A publicação orienta os prefeitos a buscarem financiamentos alternativos e parcerias com a sociedade civil para que seja implantada uma nova política pública à educação infantil.

Um dos destaques é Programa de Gestão Pedagógica para Infância (Progepi), desenvolvido por meio de parcerias com prefeituras locais, visando a implantação de projetos técnicos e pedagógicos em espaços denominados Centros de Educação Infantil (CEI). “”Criado para promover o desenvolvimento integral das crianças de 0 a 6 anos, contemplando a ação da família e a melhoria da qualidade do trabalho dos profissionais envolvidos, o Progepi favorece a integração do CEI, da família e da comunidade””, conta Vera Melis, coordenadora da área de educação da Fundação Orsa.

Orientar para o trabalho de aproximação com a família é um dos aspectos que Cisele Ortiz e Silvia Carvalho, coordenadoras do Instituto Avisa Lá – Formação Continuada de Educadores, dizem ser fundamental. “”Quando o trabalho na educação infantil é consistente, ele respeita a criança e sua família, tomando-a como interlocutora e parceira. É importante o estabelecimento de uma rede de apoio à família. Não planejar e acompanhar o trabalho com elas é desperdício de recursos, tanto humanos como econômicos””, afirmam.

Liz Ramos, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, diz que a relação com a família é hoje um dos grandes desafios e que o papel do professor é estratégico. “”Não estou dizendo que a casa caindo aos pedaços não tenha impacto sobre isso, mas se consertamos a casa e não investimos no professor, não teremos grandes resultados. Além disso, ele é um elo de ligação entre a criança, a estrutura administrativa da escola e a família.””

Para isso, a formação continuada dos profissionais das creches e pré-escolas é uma das principais ações a serem apoiadas. “”Os professores precisam construir conhecimentos a partir de sua prática, aprender a refletir, planejar, promover o acesso das crianças ao patrimônio cultural brasileiro e saber como fazer isso de maneira adequada à faixa etária. É necessária reflexão constante sobre seu papel na promoção da autonomia da criança””, explicam Cisele e Sílvia, do Avisa Lá.

Apoio – Nesta terça-feira (16/9), a Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho lança o Programa Fundo do Milênio para a Primeira Infância, em parceria com o Banco Mundial e a Unesco. Serão beneficiadas cerca de 5.000 crianças de 0 a 6 anos, no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. O objetivo é qualificar o atendimento prestado por creches e escolas de educação infantil comunitárias, com o apoio das empresas da região.

O programa é composto por duas etapas: sensibilização do setor empresarial para financiar a iniciativa e capacitação dos profissionais e melhorias na infra-estrutura. A instituição desenvolveu uma franquia social, chamada Mesa Educadora, por meio da qual professores de diversas organizações poderão estudar e trocar experiências.

Alceu Terra Nascimento, gerente executivo da fundação, conta que uma das principais dificuldades na implementação de um programa voltado à educação infantil é a fragilidade institucional das organizações que atendem a esse público. “”As melhorias são possíveis a longo prazo, com programas de formação continuada. Isso exige compromisso e recursos.””

No Instituto C&A, a educação infantil detém cerca de 35% dos recursos alocados para projetos sociais. O apoio a essa área visa a fortalecer a ação pedagógica das instituições, mediante o investimento na estruturação e na adequação tanto do programa pedagógico quanto das instalações físicas.

Alais Ávila, coordenadora de projetos do Instituto C&A no estado de São Paulo e na região Sul, diz que a atuação das organizações não-governamentais nessa área é visível, no entanto, a maioria delas ainda está distante de um desempenho efetivo. “”Estão reproduzindo práticas assistencialistas ou contencionistas, que não deflagram a autonomia da criança. Por outro lado, ações de formação de profissionais de educação infantil para instituições comunitárias vêm se tornando freqüentes, indicando aí um campo propício para o investimento social privado.””

Ela alerta para o fato de que ainda não houve uma atenção concreta, para além dos textos das leis, que pudesse transformar paradigmas da educação infantil. “”É necessário, sobretudo, rever os sistemas de convênios com as chamadas creches comunitárias e criar estruturas eficazes para que os órgãos de educação conduzam a educação infantil.””

Para Elaine Fiori, supervisora técnica educacional do Instituto Criança Cidadã (ICC), as discussões e as reflexões sobre educação infantil precisam ser mais responsáveis e aprofundadas. “”Especialmente no que se refere à qualidade, levando-se em conta a prática pedagógica e tendo como perspectiva uma educação significativa, garantindo o respeito às necessidades de cada comunidade atendida.””

Desde 1999, o ICC administra o Projeto Creche Pré-Escola. As creches têm como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 6 anos, em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectuais e sociais. Além disso, desenvolve o Projeto Arte-Educação Infantil, que tem como proposta de trabalho a complementação escolar por meio de atividades artísticas e culturais em salas instaladas em três circos-escola.

Para Vera Melis, da Orsa, é necessário criar políticas públicas municipais de atenção à primeira infância e ampliar as fontes de recursos. “”Além disso, é preciso garantir maior divulgação de projetos de professores de educação infantil, para que um profissional possa aprender com a experiência do outro e colocar na agenda política a importância do atendimento a essa faixa etária.””

Cisele e Sílvia, do Avisa Lá, acreditam que será preciso percorrer, avaliar e aperfeiçoar caminhos que já foram abertos. Elas citam a exigência de formação inicial adequada aos profissionais de educação infantil e a publicação do Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil como exemplos desses caminhos. “”Além disso, temos a discussão do financiamento para a educação infantil, com o advento do Fundeb (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica). Todos esses aspectos precisam estar presentes nas discussões de políticas para o atendimento dessa faixa etária, pois as leis existem, mas ainda não estão implantadas e precisam ser acompanhadas pela sociedade civil.””

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