Em discussão o sentido público do investimento social privado

Por: GIFE| 9º Congresso GIFE| 02/02/2016

Publicado em Fundação Assis Chateaubriand.  Veja a matéria original aqui.

Em entrevista, Andre Degenszajn, secretário-geral do Grupo de Institutos Fundações e Empresas (GIFE), fala sobre o sentido público do investimento social privado e a pertinência do tema para os dias atuais. Segundo ele, é reconhecido que institutos e fundações podem exercer influência sobre atores públicos e privados.

O secretário-geral afirma que o debate é fundamental e inclusive por isso o assunto é o tema do 9º Congresso GIFE, principal encontro sobre investimento social do Brasil, realizado desde 2000 a cada dois anos. O evento, que ocorrerá em São Paulo no período de 30 de março a 1º de abril, reúne as principais lideranças de investidores sociais do país, além de dirigentes de organizações da sociedade civil, acadêmicos, consultores e representantes de governos, proporcionando um espaço para aprendizado, relacionamento e troca de experiências.

Confira a entrevista abaixo:

Quais as discussões relevantes da relação público-privada?
Esta relação público-privada está inserida na matriz do que é o investimento social privado, ou seja, organizações de origem privada que aportam seus recursos com uma finalidade pública. Essas instituições lidam com uma peculiaridade importante, pois elas não estão sujeitas aos mesmos regimes do recurso público, mas ao mesmo tempo interferem na esfera pública; portanto não podem se comportar como uma organização privada. Isso gera uma série de desafios. Além disso, hoje no Brasil muitas das questões nacionais têm haver com a relação público-privada, seja no contexto da corrupção, seja nas discussões da reforma política, como o financiamento empresarial de campanhas. Então a discussão do sentido público do investimento social privado não pode estar dissociada do debate mais amplo que acontece no país. Além disso, em temas mais específicos como educação, há o debate do papel das instituições privadas na educação pública. Qual papel é admissível, desejável? Existe a perspectiva de que não deve haver uma interferência das instituições privadas na educação pública, pois isso é um problema em si. E outros defendem que é uma contribuição muito grande que pode ser dada e é bem-vinda, contanto que alguns princípios sejam observados. Esse tipo de discussão que interessa ao falar dessa relação.

Como alguns acontecimentos recentes do país, como o desastre ocorrido em Mariana (MG) devido ao rompimento das barragens administradas pela Samarco, têm impacto direto no investimento social privado? Qual sua opinião sobre isso?
Há dois caminhos. A gente poderia falar: esse desastre em Mariana (MG) é uma questão da empresa, não tem nada haver com os investimentos sociais que ela realiza. No entanto, é muito difícil sustentar isso no momento que afirmamos que essas questões estão interligadas. Não tem como dissociar completamente o investimento social que a empresa faz com as suas práticas internas, de gestão e de relacionamento com outros atores. Diante disso, não é aceitável que haja uma dicotomia. A empresa não pode se pautar por práticas que entram em contradição com os valores que ela defende no seu investimento social. A dimensão do impacto negativo gerado por uma situação assim ofusca qualquer eventual programa de investimento social da empresa. No caso de Mariana, por exemplo, envolvia empresas cuja as práticas são referência no mercado, em termos de indicadores; são empresas que têm práticas de ponta, mas que não foram capazes de inibir, coibir, esse tipo de evento.
A relação público-privada se desdobra de muitas maneiras. Por exemplo, essas instituições e fundações sem fins lucrativos utilizam em algum grau incentivos fiscais, desde não pagar imposto de renda até usar leis específicas, como a Lei Rouanet. Só pelo fato de atuarem publicamente deveriam ter certos cuidados. Se elas têm algum beneficio fiscal, isso se torna ainda mais relevante. São organizações que precisam se pautar por critérios de transparência do uso de recursos e critérios mínimos de governança. Essa relação público-privada precisa ser muito clara, perceptível e que não haja qualquer tipo de apropriação do benefício fiscal aplicado na direção do interesse privado dessas instituições.

Quais as tendências e os desafios observados para este ano que se inicia em relação às parcerias público-privadas?
O contexto político e econômico deste ano é muito difícil. Os governos estão com menos capacidade de investimento, principalmente as prefeituras e governos estaduais, o que torna essas parcerias potencialmente mais relevantes. Só que no contexto de recessão também há menos recurso no setor privado, então esse volume de investimento está em cheque; não sabemos como vai ser em 2016. A leitura é que houve uma queda em 2015 e essa queda deve ser maior ainda em 2016. Estamos vivendo um período de recessão econômica que também impacta no investimento social. Claro que esse cenário tem um potencial de alinhar os investimentos – há a tendência de que os projetos que estavam sendo realizados passem por novas acomodações, como rever parcerias e aumentar coinvestimento –, mas no contexto geral é possivelmente de redução.

Como será abordada a colaboração público-privada durante o 9º Congresso GIFE?
Todo ano o GIFE define um tema para o congresso, que é menos um limitador do foco das discussões e mais uma afirmação política relacionada ao momento do investimento social no Brasil. Este ano o tema definido foi o sentido público do investimento social privado. O percurso que o congresso vai fazer parte um pouco dessa reflexão das relações público-privadas em âmbito nacional para chegar a temas próprios do investimento social. O congresso vai cumprir um leque amplo de temas; em algum deles essa questão está mais explícita, outras menos explícita. Um dos tópicos, por exemplo, tem haver com o movimento recente de aproximação dos institutos e fundações empresariais com as áreas de negócios. Os institutos passam a desenvolver seus investimentos vinculados às estratégias de negócios tentando aproveitar as oportunidades que a empresa gera para provocar algum tipo de impacto social positivo. Ao mesmo tempo que amplia as oportunidades e o potencial de impacto, isso também pode criar uma zona cinzenta nessa relação entre interesse público e privado. Então essa aproximação precisa ser acompanhada de um conjunto de cuidados para que esse sentido público da atuação de institutos e fundações seja preservado. E isso se desdobra em outros temas, como a questão da inovação política, da mineração no Brasil, da educação. Então as oportunidades e os riscos dessa aproximação estão em vários contextos.
Uma das principais novidades desta edição do Congresso será a realização da Semana do Investimento Social Privado. A ideia é que estimulemos outras organizações realizarem atividades que tenham alguma relação com investimento social, com o tema do congresso, de forma autogestionada. O GIFE fará uma curadoria dessas atividades, no modelo da Virada Sustentável, para ampliar as discussões sobre investimento social de maneira descentralizada. É a primeira vez que estamos promovendo essa atividade, então avaliaremos o que acontece, quanto de demanda isso vai gerar.

Para quem deseja saber mais sobre esse assunto, Andre Degenszajn recomenda o documentário Em Movimento: 20 anos de Investimento Social no Brasil, produzido pelo GIFE em comemoração aos seus 20 anos, completados em 2015. “Não é um filme institucional. Optamos por fazer algo que mostre uma perspectiva sobre a história do desenvolvimento da sociedade civil no Brasil. Conta essa história ao longo de mais de duas décadas, com depoimentos de personalidades que tiveram papel importante, além de uma reflexão feita por algumas pessoas ligadas hoje ao conselho sobre o contexto atual do investimento social e como ele foi mudando. Enfim, o documentário resgata essa trajetória para colocar luz às questões que estamos lidando nos dias atuais”, destaca. O vídeo está disponível no canal do GIFE no Youtube (https://www.youtube.com/watch?v=0_1HzzKl1vs).

*Andre Degenszajn é secretário-geral do GIFE. É bacharel e mestre em relações internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Integra o Conselho Diretor da Conectas Direitos Humanos. É membro do Conselho Diretor da Worldwide Initiatives for Grantmaker Support (WINGS) e do Conselho do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da Bovespa.

*O GIFE é uma organização sem fins lucrativos que reúne associados de origem empresarial, familiar, independente ou comunitária, que investem em projetos de finalidade pública. Reúne atualmente mais de 130 associados que, somados, investem por volta de R$ 2,4 bilhões por ano na área social, operando projetos próprios ou viabilizando os de terceiros. Saiba mais: www.gife.org.br.

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