Empresas devem disseminar a conscientização socioambiental

Por: GIFE| Notícias| 02/06/2003

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Nesta quinta-feira (5/6), Dia Internacional do Meio Ambiente, a Editora Senac lança o livro Sociedade de Risco e Responsabilidade Socioambiental – Perspectivas para a Educação Corporativa.

Em entrevista ao redeGIFE, o economista e doutor em educação Jacques Demajorovic, autor do livro, fala sobre a evolução da consciência socioambiental nas empresas e a participação delas na educação ambiental.

redeGIFE – Quando começou a surgir nas empresas a consciência de sua responsabilidade por danos ambientais?
Jacques Demajorovic – Até as décadas de 70 e 80, temos um discurso e uma ação das empresas focados no que chamo de responsabilidade social tradicional, ou seja, a responsabilidade da empresa limitada ao pagamento de salários, impostos e dividendos para os acionistas. Existia uma resistência das empresas em incorporar essa preocupação socioambiental a partir da idéia de que, se investisse nas áreas social e ambiental, comprometeria seu lucro e prejudicaria seu principal objetivo. Foram fundamentais para a mudança os acidentes industriais que ocorreram ao longo do século, mas particularmente no final dos anos 70 e início dos 80. A partir da repercussão do acidente de Bophal, na Índia – um vazamento de gás de metila que matou mais de 2.500 pessoas -, teve início uma ação e um entendimento de que aquele discurso não tinha mais aderência na sociedade. Começa um processo de grande questionamento da ação empresarial, vista como uma das principais geradoras de risco. Esse discurso começa em meados dos anos 80 e passa a ter força nos anos 90.

redeGIFE – Como foi essa evolução?
Demajorovic – Podemos identificar esta evolução de forma bem precisa. Até os anos 70 tínhamos total descaso, não havia preocupação com os problemas ambientais, nem sequer se fazia o controle da poluição. Não havia uma legislação, como passa a existir a partir dos anos 70 e 80, exigindo das empresas um novo tipo de comportamento. A partir dos anos 80, quando se tem uma legislação e um público um pouco mais consciente, especialmente as grandes empresas, que são as mais afetadas pela ação da mídia e dos órgãos governamentais, começam a trabalhar fazendo um controle da poluição. Isso durou até meados da década de 80. A partir daí, entramos na fase que chamamos de prevenção à poluição, quando as organizações começam a perceber que não basta cumprir apenas o que está previsto em lei, mas que a prevenção da poluição também pode significar redução de custos, na medida em que se evita danos ambientais.

redeGIFE – Então, o principal motivador de mudanças de ação no campo socioambiental foram as pressões externas, as leis e proibições que forçaram as empresas a tomar uma atitude responsável neste sentido?
Demajorovic – Exatamente. O que eu gosto de deixar bem claro é que essa preocupação socioambiental teve como principais motivadores o crescimento, a diversificação e as restrições da legislação neste campo. E essa legislação é uma resposta do setor governamental às pressões da sociedade.

redeGIFE – Mas está crescendo nas empresas a consciência de que é necessário ir além das normas impostas pela legislação?
Demajorovic – O que temos de fato é uma soma da legislação, de ganhos econômicos e de uma sociedade que cada vez mais questiona a ação empresarial. Isso leva à percepção de que a área socioambiental é inerente ao negócio. Hoje, muitas empresas estão indo além da legislação no campo ambiental porque percebem que investir na prevenção tem retorno financeiro. As empresas pouco faziam, por exemplo, com relação aos seus resíduos sólidos. Mandavam para um aterro industrial. Atualmente temos uma série de empresas com centrais de triagem de resíduos e que passaram a vendê-los. Dessa forma, elas deixam de gastar um recurso para levar os resíduos para um aterro e transformaram em receita.

redeGIFE – Quais dificuldades a empresa que quer assumir uma posição ambientalmente responsável encontra?
Demajorovic – Existem várias. Uma é estar consciente de que os danos na área ambiental não têm volta. Outra é estar preparada para criar e difundir conhecimento na área socioambiental. Além disso, é preciso profissionalizar as ações sociais e ambientais, libertar-se da idéia de que área social é filantropia. Acredito que um dos grandes desafios seja transformar a ação social por meio de parcerias, fazer projetos afirmativos nos campos ambiental e da educação, mas de forma profissionalizada, por meio de parceria com prefeitura, governo do estado, ONGs, associações de moradores, sindicatos, etc.

redeGIFE – E como o senhor tem visto o diálogo entre as empresas e esses possíveis parceiros?
Demajorovic – Com bons olhos, apesar de ser em número ainda reduzido. Nos anos 70 e 80 nem se considerava o diálogo, as organizações eram muito mais fechadas. Hoje, o que vejo é que existe uma consciência de que não se pode ignorar os stakeholders. Existe um campo maior de diálogo e as organizações reconhecem que isso é necessário e importante.

redeGIFE – Na sua opinião, qual o principal erro que as empresas que estão tomando atitudes socioambientais têm cometido?
Demajorovic – Talvez o mais importante seja não ter uma visão integrada do problema. Não entender que é impossível dissociar a variável ambiental da social. Não adianta ter uma política de público interno maravilhosa e desconsiderar completamente o seu entorno, ou fazer uma política ambiental e não fazer nenhum investimento social, ou fazer investimento social e ao mesmo tempo ter uma política ambiental que é um desastre. Outro problema é não ter os indicadores na área socioambiental de uma forma acessível ao público. Existe um número pequeno de empresas que desenvolve indicadores ou que não os faz de forma aberta. É preciso criar indicadores para usar como mecanismos efetivos de comunicação com a sociedade, para que tenhamos informação mais transparente sobre os desempenhos econômico, ambiental e social das empresas. E de maneira legitimada, porque seria fundamental, por exemplo, que houvesse acompanhamento de um auditor independente externo. Precisamos ter parâmetros que nos permitam fazer uma correta avaliação da evolução de cada empresa no campo socioambiental por números concretos. Todas as informações precisam ser compiladas, acessadas e entendidas pelo público.

redeGIFE – O senhor fala muito no livro sobre a educação corporativa, mas também fala dessa educação fora da empresa. A empresa que tem uma ação socioambientalmente responsável deve apoiar também essa educação fora da empresa?
Demajorovic – Primeiro: esse conhecimento na área ambiental dentro da empresa é uma ferramenta importante para aumentar o seu desempenho e gerar uma visão integrada do papel da organização, tanto interna quanto externamente. Segundo: as ações da empresa nunca são isoladas. A educação nas escolas e universidades e aquela feita por ONGs são fundamentais para que a educação socioambiental nas empresas se desenvolva e traga respostas mais eficientes. Somente se tivermos uma sociedade questionadora, formada e informada, haverá a cobrança que levará as organizações a gerarem conhecimento e a responderem a essas demandas. Além disso, desde que tenham isso profissionalizado internamente, as organizações têm papel fundamental ao fazer programas de educação ambiental em parceria com as escolas. As empresas podem contribuir bastante nessa disseminação da conscientização ambiental.

redeGIFE – Na apresentação do livro é dito que o conceito de desenvolvimento sustentável tem sido alvo de críticas. Porquê?
Demajorovic – Porque ele é um conceito tão amplo, que todo mundo acaba pegando carona e qualquer coisa hoje é desenvolvimento sustentável. O conceito em si não é o problema, mas ele foi muito usado e acabou sendo banalizado. Aquelas coisas que viram moda. Todo mundo é a favor do desenvolvimento sustentável, mas o que se entende por desenvolvimento sustentável? O que queremos com ele? Acho que o desenvolvimento sustentável só tem razão de ser se resultar, de fato, numa ampliação do bem-estar social e ambiental. Mas acredito que a discussão da sustentabilidade seja fundamental. E mais fundamental ainda é perceber que, hoje, não há como dissociar o desempenho social e o ambiental. A grande questão não é ser contra ou a favor, mas como podemos ter um desenvolvimento que se sustente ao longo do tempo, de forma equilibrada, e o quanto avançamos para uma sociedade, essa sim, sustentável.

redeGIFE – E estamos indo neste caminho?
Demajorovic – Eu sou um otimista. Acredito que apesar de todos os problemas que enfrentamos, existe um quadro de questionamento. Se esse tipo de desenvolvimento da sociedade contemporânea é plausível e se é realmente o que queremos. Eu não sei se estamos caminhando ou não, mas a base está sendo formada à medida que esse questionamento é cada vez mais forte e fundamentado. Cada vez mais estamos baseados em pesquisas, em informações da sociedade que nos cerca e das transformações que estão acontecendo. E é esse questionamento etalvez essa sociedade que vão determinar se já começamos ou se estamos caminhando em direção a uma sociedade mais equilibrada.

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