Encontro debate boa gestão dos recursos financeiros de organizações sociais
Por: GIFE| Notícias| 24/09/2012Andre Degenszajn
Especial para o redeGIFE.
Qual a pertinência de se discutir a gestão de fundos patrimoniais em um momento em que a questão central parece ser a de como assegurar os recursos operacionais de uma organização? E ainda: qual o sentido de se discutir o tema em um contexto de poucos fundos existentes?
É nesse espaço aparentemente paradoxal que o GIFE realizou evento dedicado a discutir a gestão de fundos patrimoniais de organizações sem fins lucrativos no dia 18 de setembro, no Rio de Janeiro. A discussão tem como pano de fundo o lançamento do Código de Conduta para Gestão de Investimento de Fundos Patrimoniais e Organizações Sem Fins Lucrativos, traduzido e adaptado pelo GIFE a partir da publicação elaborada pelo CFA Institute (Estados Unidos), que teve o patrocínio do Instituto Camargo Corrêa, do Instituto C&A e do Instituto Hedging-Griffo.
Para essa discussão, participaram o diretor presidente da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Eduardo Queiróz, o advogado e consultor jurídico do GIFE, Eduardo Szazi, e o sócio-fundador da Endowments do Brasil, Felipe Sotto-Maior. O evento contou ainda com a mediação do secretário-geral do GIFE, Fernando Rossetti.
Sabemos das diferenças que existem entre o contexto americano e brasileiro a respeito dos fundos patrimoniais. O setor filantrópico nos Estados Unidos está estruturado a partir de fundações que administram endowments, gerando recursos financeiros para o investimento social. No Brasil, ainda são poucas as fundações que operam a partir de endowments, ou fundos patrimoniais perpétuos, numa tradução aproximada (mesmo que alguns desses fundos possam ter prazo de validade).
O Código de Conduta traz recomendações para uma boa gestão dos fundos patrimoniais, mas também para a gestão dos ativos de qualquer organização sem fins lucrativos. Mas é evidente que, quanto mais recursos em jogo, maiores são os interesses, a responsabilidade e a decorrente preocupação sobre como são investidos.
Além de ser um documento orientador, segundo apontou Eduardo Szazi, um Código como esse tem ainda a função de legitimar e dar proteção a organizações que gerem fundos patrimoniais. Diante da ausência de uma legislação específica sobre o tema, pode ser muito útil a uma entidade se apoiar em recomendações formalizadas pelo GIFE – e com o selo do CFA – diante, por exemplo, de eventuais questionamentos de órgãos de controle.
A situação econômica atual do Brasil, ainda segundo o advogado, de estabilidade, inflação controlada, democracia consolidada e de contínua redução da taxa de juros, impõe uma nova situação às organizações: já não é tão simples de se obter lucro real a partir de investimentos financeiros. As organizações sem fins lucrativos, que antes eram levadas a investir apenas em renda fixa, podem começar a questionar se essa é realmente uma boa opção para a gestão de seus ativos. E, com isso, torna-se mais complexa a gestão, exigindo mais cuidado com aspectos de governança e atenção às políticas de investimento.
Ao refletir sobre as suas opções de investimento, seria esperado que entidades sociais buscassem fundos “socialmente responsáveis” ou “fundos verdes”, fazendo com que seus recursos rendessem e ao mesmo tempo contribuíssem com empresas que geram algum impacto positivo (ou que pelo menos reduzem seus impactos negativos).
Para Felipe Sotto-Maior, há diversas abordagens sobre essa questão. Em primeiro lugar, é um mito a oposição entre rendimento e investimento em fundos sociais. A premissa que o investidor abriria mão de rentabilidade em detrimento de investir nesses fundos é falsa. Frequentemente, empresas consideradas socialmente responsáveis são empresas mais bem-estruturadas, com melhor governança e aceitação do público. Mas isso não significa que o investimento nesses fundos seja uma maneira efetiva de se buscar algum impacto social. Essa contribuição é muito indireta, impactando mais a liquidez de suas ações do que sua operação direta. E os meios mais eficazes de se influenciar na atuação de uma empresa dependem de um volume muito grande de capital ou de participação direta no grupo controlador da empresa – que é o caso de algumas organizações associadas do GIFE.
Mas qual deve ser o limite? Deve haver exclusões, como no conhecido grupo “armas, álcool e tabaco”? Ou a decisão de investimento deve ser apartada de qualquer orientação estabelecida pela missão da organização? A política de investimento de uma organização deve estabelecer limites claros ao investimento de seus recursos e monitorar a sua aplicação, com a presença de profissionais com conhecimento técnico.
Eduardo Queiróz, que dirige uma Fundação que investe no desenvolvimento da primeira infância a partir de seu fundo patrimonial, apontou elementos de sua governança que buscam assegurar uma gestão sólida e profissional de seus recursos. A Fundação – que não investe em armas, álcool e tabaco — conta com um comitê de investimento que orienta o Conselho de Curadores e acompanha os investimentos do fundo. Além disso, a gestão do fundo patrimonial se dá de maneira independente da administração da Fundação – assegurando uma separação clara entre a operação e a administração do endowment.
Apesar de ainda insipientes no Brasil, os endowments funcionam como importantes fontes de financiamento para organizações da sociedade civil, a exemplo dos diversos fundos criados nos últimos anos na área de desenvolvimento e defesa de direitos. O desafio que se coloca aos fundos patrimoniais de fundações familiares e empresariais, além da boa gestão e governança introduzidas pelo Código, é o reconhecimento do seu papel ativo no fortalecimento das organizações da sociedade civil no Brasil.
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