Especialistas defendem autorregulação para o setor social

Por: GIFE| Notícias| 14/12/2009

Rodrigo Zavala

Com uma legislação para o terceiro setor fragmentada, contraditória e conflituosa, o ambiente regulatório da área no Brasil leva insegurança jurídica às organizações que a compõe. Mas qual é o caminho para mudar este cenário e quais são as etapas a serem percorridas?

Para os especialistas convidados ao lançamento do livro “”Perspectivas para o Marco Legal do Terceiro Setor”” – do GIFE, com apoio das fundações Ford e W.K. Kellogg -, o rumo ideal é mesmo o da autorregulação. Em evento realizado na sede do Sistema Firjam, no dia 30 de novembro, no Rio de Janeiro, eles rejeitaram a ideia de criar um estatuto para o setor, ou uma maior ingerência do Estado.

“”É diferente do setor econômico, em que cabe regra estatal por se tratar de uma empresa que busca o lucro. Mas não compete ao estado a decisão de quais áreas as entidades devem atuar. Não se pode controlar a sociedade””, afirmou o advogado Eduardo Szazi.

Segundo ele, o que a entidade faz e como ela expressa sua opinião não deve ser tolhido pelo Estado. “”A autorregulacao surge como elemento chave para as ONGs possam encaminhar suas atividades””, argumentou.

O presidente da Fundação Grupo Esquel Brasil, Silvio SantAna, concordou com o advogado e considerou ainda a heterogeneidade do terceiro setor como um motivo a mais para a autorregulação. Afinal, seria muito complexo criar normatizações que contemplassem uma organização de grande porte e pequenas entidades assistenciais.

Some-se a isso, o que SantaAna considerou como problema conceitual que uma regulação do Estado poderia trazer. “”Por exemplo, se for normatizado o nepotismo, como prática de má governança, fecharíamos cerca de 30% das organizações sociais. Isso porque a atuação delas não é possível sem o envolvimento de familiares””, explicou.

Também convidada para o evento, a presidente executiva (Voluntária) da ONG Parceiros Voluntários, Maria Elena Pereira Johannpeter, lembrou que a gestão ainda é um problemas para a área social no Brasil. A autorregulação, assim, enfrentaria mais esse desafio.

“”Devido ao idealismo, deixamos passar muitas coisas no que tange a gestão. Daí a importância da transparência. Os diretores de uma organização devem ter por principio ser éticos, devem seguir princípios. Daí, rever seus processos””, considerou.

Nesse contexto, Slvio SantAna desabafou: “”Passamos muito tempo falando de forma genérica sobre uma legislação para o terceiro setor, sem nos preocuparmos com as realidades cotidianas das organizações.””

Para a assessora de Responsabilidade Social da FIRJAN, Claudia Jeunon, a discussão é importante, pois quando a empresa tem prejuízo, quem perde é o acionista. “”Mas quando uma organização social não faz seu trabalho, quem perde é toda a sociedade””.

O Livro

O debate teve como pano de fundo o lançamento da publicação “”Perspectivas para o Marco Legal do Terceiro Setor””, cujo o objetivo do livro é defender a existência de um ambiente regulatório moderno, claro e estável, como fator fundamental para promover a expansão e qualificação do campo social brasileiro.

“”A conclusão do livro não é a de que precisamos mudar todo o ambiente regulatório ou criar um novo estatuto. Mas aprimorar aspectos específicos, o que não deixa de ser complexo””, afirma o secretário-geral do GIFE, Fernando Rossetti.

Para isso, o documento se aprofunda em relação a três temas principais:
1. uma descrição concisa de como a legislação brasileira aborda a matéria;
2. a identificação e análise dos principais entraves e oportunidades; e
3. um conjunto de propostas concretas de aperfeiçoamento do respectivo ambiente regulatório, incluindo medidas legislativas, administrativas e/ou de autorregulação.

“”O livro é pragmático quando diz o que pode ser melhorado, porque olha para o conjunto das leis, que apesar de um pouco incoerentes e fragmentadas, são quase suficientes para a área””, explica Rossetti.

Estrutura

Os capítulos que se seguem, portanto, acompanham essa ordem de exposição. O primeiro, sobre transparência e controle social, foi elaborado pela consultora Elisa Rodrigues Alves Larroudé. O segundo, referente à liberdade de organização e funcionamento para as organizações da sociedade civil, ficou a cargo da advogada Flávia Regina de Souza Oliveira.

Os dois últimos capítulos, que abordam os temas das imunidades e isenções tributárias e incentivos fiscais para iniciativas de interesse público,foram estruturados pela equipe do Programa Marco Legal e Políticas Públicas do GIFE, composta, na época, pelo advogado Eduardo Pannunzio e pela estagiária Aline Gonçalves de Souza, e, mais tarde, pelo advogado Renato Benine.

É importante ainda destacar que uma versão preliminar deste documento foi debatida numa reunião especial do Grupo de Afinidade em Marco Legal do GIFE, realizada em 27 de junho de 2007, que contou com a participação de alguns dos maiores especialistas em direito do terceiro setor no Brasil.As críticas e sugestões recebidas na ocasião serviram para enriquecer consideravelmente o conteúdo desta publicação.

O presente documento foi, ainda, submetido à consulta pública entre os dias 17 e 30 de setembro de 2007. Essa etapa serviu não apenas para receber novas contribuições em relação ao texto, mas também para legitimar o seu conteúdo dentro dessa que é a principal rede de investidores sociais privados do país.

Visão

Ironicamente, a insegurança jurídica abordada na publicação, afetou também o processo de elaboração do livro. As constantes expectativas de alteração do ambiente regulatório do terceiro setor dificultaram o fechamento deste documento, que passou por diversas revisões para se adaptar às mudanças implementadas. Embora conscientes do risco de esta publicação tornar-se defasada pouco tempo após a sua conclusão, optou-se pela sua publicação mesmo na iminência de novas reformas.

O GIFE acredita que as questões aqui apresentadas são estruturais e permanecem válidas, visando uma revisão profunda do atual ambiente regulatório do terceiro setor.

Espera-se que o documento não apenas oriente a atuação de advocacy do GIFE ao longo dos próximos anos em relação à melhoria do marco legal do terceiro setor, mas também que sirva de referência e contribua para a definição de uma agenda comum capaz de aglutinar os esforços de todos aqueles que já estejam engajados ou queiram participar desse processo – parlamentares e outros agentes públicos, organizações da sociedade civil, acadêmicos, empresas, meios de comunicação e a sociedade em geral.

Leia o “”Perspectivas para o Marco Legal do Terceiro Setor””.

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