Experiência brasileira será fundamental no 7º Encontro

Por: GIFE| Notícias| 19/01/2004

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

O Movimento Ibero-Americano do Terceiro Setor, formado no início da década de 90 e que deu origem, mais tarde, aos Encontros Ibero-Americanos do Terceiro Setor, foi criado por um grupo de lideranças espanholas, brasileiras, colombianas, argentinas e mexicanas, com o objetivo de fortalecer a sociedade civil nos países ibéricos e latino-americanos.

O espanhol Antonio Sáenz de Miera é um dos principais personagens dessa história, sendo um dos fundadores e atuante membro do Conselho Consultivo dos Encontros. Especialista em estudos sobre a área social e atual diretor da Fundação San Benito de Alcántara, ele fala ao redeGIFE sobre as diferenças e os avanços do terceiro setor na Ibero-América, a atuação conjunta entre os países da região e o governo Lula.

redeGIFE – Quais são as suas expectativas com relação ao 7º Encontro Ibero-Americano do Terceiro Setor?
Antonio Sáenz de Miera – As expectativas são muito grandes. Não somente minhas, mas também de todos os que vêem a experiência do Brasil com verdadeiro interesse e esperança. Se a isso unirmos a comprovada experiência do GIFE e o momento que o mundo vive hoje, o interesse pela reunião de São Paulo é evidente. Acredito que este 7º Encontro pode constituir uma oportunidade única para aprofundar o debate sobre a participação dos cidadãos nos grandes problemas sociais do mundo, por meio de experiências concretas e da experiência brasileira neste momento. Por isso o fato de haver sido introduzido no programa a participação de alguns dos protagonistas das atividades sociais do governo Lula é extremamente positivo.

redeGIFE – Em sua avaliação, o tema “”cidadania”” tem tido mais espaço na agenda mundial? Qual o papel que o terceiro setor exerce para favorecer isso?
Sáenz – Creio que o papel do terceiro setor pode ser crucial para conseguir uma extensão real do papel da cidadania. Falar de cidadania é falar de um conceito teórico e que pode chegar a ser abstrato. Falar de iniciativas concretas, de homens e pessoas concretas e de grupos sociais determinados é tornar evidente a participação dos cidadãos no plano político, social e econômico.

redeGIFE – Como teve início o Movimento Ibero-Americano do Terceiro Setor?
Sáenz – Foi em 1992, na cidade de Cáceres, na Espanha. Já haviam sido feitos vários encontros de fundações ibero-americanas, mas a reunião de Cáceres foi a primeira que teve ambição de continuidade. O que se tratou ali seria o começo de um processo que agora culmina no encontro de São Paulo. Entre Cáceres e São Paulo houve as reuniões do México (1994), Rio de Janeiro (1996), Buenos Aires (1998), Cartagena de Índias (2000) e Barcelona (2002) como marcos de um processo que foi se consolidando com o passar do tempo, mas no qual aparece uma linha de continuidade que é o que lhe dá caráter e sentido.

redeGIFE – Quais os principais avanços que o senhor tem percebido no terceiro setor desde o início do Movimento?
Sáenz – Creio que os avanços têm sido muitos, tanto com relação à qualidade dos encontros propriamente ditos como com a representatividade das instituições presentes nos mesmos. No encontro de Cáceres, os protagonistas eram fundações. No de Guadalajara, no México, o eixo passou a ser filantropia. Já no Rio de Janeiro, a reunião foi convocada com outro título: 3º Encontro Ibero-Americano do Terceiro Setor. Acredito que tenha sido uma das primeiras atividades internacionais do GIFE, e a situação do Brasil exigia superar o conceito de fundações e também o de filantropia, para entrar em um conceito novo, de terceiro setor. Em Buenos Aires, já se falou com toda clareza em 4º Encontro do Terceiro Setor Ibero-Americano, e esse tem sido o título definitivo dos encontros que englobam um conjunto indefinido de instituições que atuam por si próprias em colaboração com a administração pública ou com empresas privadas, mas que ocupam um espaço novo, que não é o do mercado nem o da política. A reunião de Cartagena de Índias (Colômbia), na qual deixei a presidência a Manuel Arango, e a de Barcelona, na qual Arango deixou a Joaquim Falcão, representaram a definitiva consolidação do movimento que havia começado em Cáceres.

redeGIFE – Em comparação à Europa, como o senhor vê o terceiro setor na América Latina hoje?
Sáenz – É evidente que a situação na Europa e na América Latina não é a mesma. O Estado de bem-estar social dos países europeus atingiu um bom número de objetivos sociais que ainda estão pendentes no mundo latino-americano. Quero dizer com isso que o espaço que o terceiro setor precisa cobrir na América Latina é sensivelmente maior do que nos países desenvolvidos do ocidente europeu. Isso explica a maior pujança do terceiro setor na América Latina do que na Europa, sua maior força, espontaneidade e, sem dúvida, responsabilidade.

redeGIFE – Como é possível articular o terceiro setor em países com características tão distintas?
Sáenz – O grande patrimônio do terceiro setor é precisamente sua enorme variedade, o pluralismo que reflete. Mas essa vantagem pode vir a ser um inconveniente grave se cada instituição não leva em conta os objetivos comuns e a indispensável necessidade de coordenação. Se o que acabo de dizer é verdade no plano nacional, é muito mais no plano internacional e, no que diz respeito aos nossos encontros do terceiro setor, no plano ibero-americano. Acredito que a grande virtude desses encontros é a de proporcionar às mais variadas instituições do terceiro setor a oportunidade de conhecer experiências alheias, de disseminar as próprias e ter em vista os grandes objetivos comuns que devem constituir a meta de todas elas. Não creio que a palavra articular seja a apropriada. Talvez devêssemos falar em informar, em desenhar projetos comuns nos quais as organizações dos diferentes países possam participar voluntariamente, em refletir sobre os grandes problemas pendentes do continente.

redeGIFE – O senhor está fazendo uma pesquisa sobre ações do governo brasileiro. No que consiste e quais são os objetivos deste trabalho?
Sáenz – O objetivo fundamental do meu projeto é a análise das experiências que estão sendo produzidas neste momento no Brasil para a construção de alianças entre a sociedade civil, o empresariado e o governo nas iniciativas de luta contra a pobreza e as desigualdades sociais. Por meio de um observatório que se estabelecerá na Fundação Getúlio Vargas, o Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Salamanca passará a organizar vários seminários na Espanha, em Portugal e na Itália, para os quais serão convidados representantes dos mundos acadêmico, empresarial, político e da administração pública. O mais interessante desse projeto é que não somente será realizada uma análise objetiva da experiência brasileira, mas também se levará ao Brasil o resultado dos seminários europeus para contribuir, a partir da experiência da social democracia na Europa, com a análise da situação brasileira. Esse caminho de ida e volta da informação pode ser uma das características mais positivas do projeto, que deve seguir a evolução da situação brasileira nos próximos três anos, isto é, no período restante do governo Lula.

redeGIFE – Como especialista europeu, que análise o senhor faz das perspectivas do terceiro setor e da área social brasileira a partir do governo com as características históricas e políticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva?
Sáenz – Creio que a política de reformas de Lula constitui um grande desafio para o terceiro setor e para a área social brasileira. O fato de que um partido revolucionário como o Partido dos Trabalhadores tenha entrado pela via da moderação e da reforma social, insisto, é um desafio histórico para toda a sociedade brasileira e, sem dúvida, para o terceiro setor do país.

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