Experiências bem-sucedidas no dia-a-dia do voluntariado corporativo
Por: GIFE| Notícias| 29/09/2008Paula Crenn Pisaneschi*
Há seis anos, a United Way Brasil (UWB) aprimora um Programa de Voluntariado Corporativo, que envolve funcionários de companhias diferentes, com habilidades distintas e motivações idem. Para quem não conhece a UWB, vale explicar que se trata de uma organização-meio, que atua captando recursos de empresas e de funcionários e investindo em projetos de organizações de base comunitária. Ela nasceu nos Estados Unidos em 1887 e hoje compõe uma rede estabelecida em 47 países, incluindo o Brasil, onde foi fundada em 2001.
Desde o início, a UWB focou seus esforços na inclusão da juventude popular urbana no mercado de trabalho. No modelo brasileiro, as empresas associadas fazem doações, repassam o montante investido por seus funcionários individualmente, praticam o match (a cada real investido pelo funcionário, a companhia contribui com outro real) e incentivam a participação de seus funcionários. É neste cenário que podemos elencar algumas boas experiências de nosso trabalho na mobilização e organização do voluntariado corporativo.
Doação de recursos latentes
A primeira, e mais simples, diz respeito à articulação entre projetos apoiados e ações voluntárias. Para resolver esse desafio, utilizamos como base do nosso programa de voluntariado a mesma certeza que nos fez focar na qualificação da mão-de-obra juvenil: a educação é o agente de transformação real na vida dos jovens. Sendo assim, percebemos que a UWB deveria estimular os voluntários das empresas associadas a doar seu tempo para partilhar experiências técnicas e profissionais, com as competências que já possuem, ministrando aulas aos jovens dos projetos apoiados.
Dentro desta perspectiva, desenvolvemos duas frentes específicas de trabalho: as Mentorias e o Agindo Juntos/Plano e Negócios. Nas Mentorias, a UWB organiza os voluntários para dar aulas de Inglês, Introdução à Contabilidade e Investir Vale a Pena. Em outras palavras, visamos dar subsídios aos jovens em um idioma estrangeiro, em atividades contábeis e na administração de finanças pessoais. Quanto ao Agindo Juntos, compõe-se de palestras mensais com conceitos da área de administração de empresas, estímulo e apoio ao empreendedorismo juvenil para elaboração de um plano de negócios, complementando, dessa forma, o investimento das companhias e de seus funcionários, que é direcionado a projetos que sempre têm na base a qualificação da mão-de-obra juvenil.
Abordando os temas das Mentorias e do Agindo Juntos – que, em resumo, invocam abrir a mente para outro idioma, lidar com o dinheiro e enfrentar os desafios de um pequeno negócio que está florescendo -, o Programa de Voluntariado Corporativo da UWB procura responder à dificuldade de oferecer, com a ação de voluntariado, um conteúdo que atenda a demandas necessárias e concretas do beneficiado. O ponto a mais é fazer uso de recursos latentes do funcionário voluntário, um cidadão que, pelo dia-a-dia de sua profissão, já tem muito a dizer ao jovem que vive uma realidade completamente distante da rotina das grandes corporações.
Orientação clara ao voluntário
Porém, não basta simplesmente levar o voluntário para dentro da organização de base comunitária, ainda que muito desejoso de doar seu tempo e conhecimento. Quando o funcionário se habilita a dar aulas, ele passa por um treinamento promovido pela UWB, além de cumprir um conteúdo programático de cada curso oferecido. Em 2006, desenvolvemos o “”Guia do Voluntário””, um passo-a-passo que instrui os interessados com recomendações práticas sobre como proceder nas aulas, de forma didática e clara. O Guia tem se mostrado bastante útil a quem nunca teve qualquer experiência em lecionar.
Uma outra experiência proveitosa refere-se ao comprometimento dos voluntários com a programação estabelecida. Em primeiro lugar, fazemos uma descrição pormenorizada e prévia dos trabalhos a serem desempenhados. Depois, dizemos claramente o tempo que queremos do voluntário, por exemplo, nas Mentorias: três sábados em um semestre. Também implantamos um sistema com mais de um “”professor”” em sala e um esquema de revezamento. Essas medidas permitem grande flexibilidade de participação de funcionários e contribuem para que não tenhamos furos ao longo do curso.
Não poderia deixar de citar o papel motivacional que o Comitê de Mobilização e Projetos cumpre para atrair mais gente das empresas para nossas frentes de trabalho. E esse grupo é também formado por voluntários. Eles participam de reuniões e estão diretamente ligados à UWB. Além de muito boa-vontade, dispõem da colaboração das áreas de comunicação de suas respectivas companhias, as quais veiculam periodicamente agendas sobre as oportunidades de atuação voluntária.
Por último, trabalhamos uma noção de voluntariado que é de troca, de cooperação. Argumentamos com os voluntários que eles podem aprender muito sendo educadores, pois, ao ministrarem as aulas, têm a oportunidade de desenvolver várias habilidades – interpessoais, de relacionamento com os outros voluntários, com os jovens, de trabalho em equipe. Eles também podem escolher as atividades nas quais conseguem usar, da melhor maneira, suas possibilidades, perfil de habilidades e competências. Aliás, a experiência tem demonstrado que o ideal é não “”engessar”” demais o programa de voluntariado, e sim proporcionar diferentes oportunidades para diferentes talentos.
Novos horizontes
Coordenar essa área tem revelado gratas surpresas. Muito mais que ver os números, é bastante enriquecedor observar a profusão de resultados nos participantes. Voluntários relatam que, depois de terem começado a dar aulas em inglês, passaram a fazer apresentações muito melhores nessa língua dentro de suas empresas. Há quem declare que, só depois de ter dado aulas aos jovens e conhecido de perto sua realidade, pôde se dar conta do enorme déficit do ensino público no país. Os jovens, por sua vez, manifestam que o contato direto com quem vive o ambiente corporativo e, em algumas situações, com quem faz mesmo a seleção dentro das empresas, é uma experiência singular e inesquecível.
Embora não tenhamos ainda como mensurar amplamente esse tipo de descoberta, conseguimos verificar, pelos relatos, o aprendizado advindo das práticas do voluntariado corporativo. Supomos que a força do trabalho da UWB resida justamente na orquestração e na sinergia desses encontros de realidades tão distintas que conseguimos promover.
Cabe dizer ainda que a United Way Brasil desenvolve outras duas frentes de trabalho com voluntariado. Na maratona Uma Semana Caminhando Juntos, são realizadas campanhas de arrecadação e dezenas de atividades dentro das organizações apoiadas; durante a Semana, os jovens também doam seus conhecimentos aos voluntários em vários tipos de oficinas. Promovemos, ainda, o Dia do Voluntariado Jovem, ocasião em que os jovens dos projetos apoiados são convidados a solucionar problemas concretos de suas comunidades.
Sob o lema “”Juventude e Trabalho, Ações Comunitárias e Voluntariado””, temos observado uma real integração, ainda que paulatina, entre voluntários, empresas, jovens e a UWB. Há muito a ser feito, é verdade, por exemplo, a criação de um grupo de discussão sobre voluntariado para que haja mais troca de experiências entre as entidades que atuam nesta área. Mas temos a convicção de que os desafios em prol de uma causa comum podem ser vencidos mais facilmente quando se caminha junto, com criatividade, persistência e organização.
* Paula Crenn Pisaneschi é coordenadora de voluntariado da United Way Brasil.