Falta de clareza emperra certificação de entidades

Por: GIFE| Notícias| 18/02/2011

*Rodrigo Zavala

A falta de informação e clareza, seja por parte do governo, seja por parte das entidades, tem sido o grande entrave nas concessões do Certificado de Entidades Beneficentes de Assistência Social (CEBAS). Desde que deixou de ser responsabilidade do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), em 2009, passando aos ministérios da Educação (MEC), Saúde (MS) e Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), a certificação virou alvo de escrutínio e preocupação de todo o setor.

Com esse contexto, o GIFE reuniu, no último dia 16, especialistas, gestores de entidades e responsáveis pela certificação, aqui, por parte do MDS, para apontarem o que pode ser feito para melhorar, legitimar e fortalecer o sistema de aprovação do CEBAS.
Entre as conclusões que se podem analisar a partir do debate, existem ainda duas grandes preocupações por parte das entidades. A primeira, e mais evidente, recai sobre os critérios que cada ministério irá utilizar para outorgar o certificado. A segunda, e complementar a isso, é a falta de transparência com a qual os parâmetros estão sendo definidos, o que traz insegurança a quem presta os serviços socais.
Segundo a superintendente da Fundação Otacílio Coser, Ana Beatriz Roth, as mudanças ainda são muito recentes para definir uma posição clara sobre elas – se são positivas ou negativas. “É uma fase de transição. O que eu vejo de positivo é a oportunidade de aproximação que essas organizações podem ter agora com quem pensa as políticas públicas”, argumentou.
Mesmo assim, Ana Roth concorda que a falta de clareza dos ministérios, no que tange ao enquadramento do trabalho da entidade para ser certificada, é preocupante. Para ela, não há um alinhamento entre a administração pública e as organizações.
Um exemplo simples pode evidenciar a dúvida. Caso uma entidade filantrópica ofereça serviços de educação para o trabalho, ou mesmo, para a saúde, em qual ministério ela deverá solicitar o certificado? Mais: se uma organização financia um programa, executado por outra, a qual delas deve ser concedido o certificado?
Por enquanto, o MEC direciona seus olhos exclusivamente para a educação formal, enquanto que o MS fundamenta a certificação a partir do Sistema Único de Saúde (SUS). “O que não cabe no cálice da educação e da saúde, acaba indo para o balde da Assistência Social”, lembrou o advogado, especialista em terceiro setor, Eduardo Szazi. Para lembrar, o MDS tem cerca de 4 mil processos em andamento.
“Nenhuma entidade terá seu pedido indeferido porque não está na área de Assistência”, garantiu a coordenadora do setor de Certificação de Entidades do Ministério do Desenvolvimento Social, Edna Alegro. Segundo ela, sua pasta ainda está resolvendo os processos herdados do CNAS e,
por isso, ainda há uma grande quantidade de pedidos na fila.
Edna contou que já existe um grupo de trabalho interministerial para alinhar e sistematizar os critérios a serem utilizados para cada pasta. Embora não tenha dado prazos, o que não é uma exigência da lei, diga-se, ela foi enfática: “Com certeza, os processos serão resolvidos muito mais depressa do que na época do CNAS”.
O que é Cebas?
Para entender o tema é preciso saber porquê o Cebas é importante. O certificado, de acordo com a Lei nº 12.101, garante às entidades imunidades tributárias e, em contrapartida, elas devem oferecer à população a continuidade de serviços públicos de saúde, educação e assistência social que a estrutura governamental não consegue oferecer.
Essas entidades – geralmente hospitais, universidades e casas de assistência social – ficam livres da contribuição previdenciária patronal, equivalente a 20% da folha de pagamento, e das contribuições CSLL (sobre o lucro líquido), PIS e Cofins (9,25% sobre o faturamento).
No entanto, isso não quer dizer que esses recursos sejam direcionados diretamente à conta bancária dessas entidades. Para conseguir o Cebas é preciso comprovar que existe um atendimento no mesmo valor isentado no imposto.

Imunidade
Para o Coordenador do Fórum Municipal de Entidades Beneficentes de Assistência Social de São Paulo, Marcelo Monello, também convidado para o debate promovido pelo GIFE a discussão sobre o CEBAS tem a ver sobre a própria função do terceiro setor.
O certificado, na visão dele, é o reconhecimento de um beneficio público, em que a imunidade é resultado. Como colaboram com o Estado e assistem a populações em que este não chega, é natural que obtenham o benefício. O erro, segundo Monello, é tratar uma política pública, que é da saúde, educação e assistência, com foco na redução de tributação.
Ana Roth, acredita que a Isenção da cota patronal é um objetivo para as entidades, mas não é o único atrativo. As entidades têm oportunidade de serem mais do que meras executoras, mas de trabalhar pelas políticas públicas.
Nesse sentido, Edna Alegro é otimista em relação às novas mudanças. “Elas permitem um ‘reolhar’ das entidades para o seu trabalho. Ao mesmo tempo, este momento está provocando os ministérios também”, argumentou.
Ela também se fez clara ao dizer que “temos que ter tranqüilidade”. “A isenção que a entidade goza hoje, será garantida até a decisão do ministério”, assegurou.

Bom português
Embora existam indefinições por parte dos ministérios, principalmente nos critérios a serem utilizados na certificação, Edna Alegro lembrou que parte da responsabilidade do contingente de processos em análise – e possíveis indeferimentos – recai sobre as próprias organizações.
“Um problema grave é como a entidade se coloca no papel, como elas se apresentam. Afinal, quem analisa o documento, não conhece a entidade. Muitos relatórios falam sobre festividades durante o ano, que não demonstram o que ela faz ou para quem ela executa”, lembrou.
Segundo Eduardo Szazi, o responsável pela entidade não pode ser um autista, fechado em seu mundo. “Deve entender seu contexto, entender o que Estado faz, pois faz junto com ele”.
O advogado fez um apelo para não se publicarem novas normas, que podem fragmentar e burocratizar ainda mais os processos. “É preciso ordenar tudo o que existe e criar um manual do usuário para as entidades entenderem”.
Afinal, como disse Monello: “o problema maior não é a mudança na lei, mas a falta de informação”.

**Para acessar a gravação na íntegra do debate (duração: 1h e 30m), clique aqui.


*Rodrigo Zavala é editor de Conteúdo do GIFE.

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