Falta de incentivos e regulação desestimulam filantropia
Por: | Notícias| 10/07/2006Rodrigo Zavala
“”Sentimento de culpa””. Essa foi a avaliação de Matthew Bishop, editor de economia da revista britânica “”The Economist”” em Nova York, para o aumento das doações a causas filantrópicas.
A opinião foi publicada no jornal Folha de S.Paulo (03.07.2006), em uma das muitas reportagens que tentaram explicar a ação do norte-americano Warren Buffett, segundo homem mais rico do mundo, que declarou a doação de 85% da sua fortuna, estimada em mais de US$ 40 bilhões, para a fundação comandada por Bill Gates.
Segundo o especialista, o aumento das doações bilionárias tem um motivo claro: o número de bilionário cresceu e aqueles que fizeram muito dinheiro nos países ricos nos últimos anos não conseguem mais enterrar a cabeça num buraco e ignorar o problema em torno deles.
No Estados Unidos, por exemplo, o total investido em projetos sociais superou U$260 bilhões em 2005, sendo que dois terços disso vêm de pessoas físicas, como Warren Buffett. No Brasil, por outro lado, o único estudo elaborado para mensurar a quantidade de inversões de pessoas físicas foi realizado em 2001 pelo Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (Idis).
De acordo com o levantamento, com dados de seis comunidades do Estado de São Paulo, 20% da população economicamente ativa doavam, em média, um salário mínimo por ano. “”Com exceção dos incentivos conhecidos referentes ao Fundo Municipal da Criança e do Adolescente e à Lei Rouanet, desde 1996, não são criados novos estímulos””, argumenta.
O fato de não existirem incentivos, na visão de Kisil, impede que se conheça o volume de doações das pessoas físicas de maneira regular no país. “”Essas informações poderiam vir a público via Receita Federal – como acontece nos Estados Unidos -, o que permitiria conhecer, a cada ano, como se desenvolve a filantropia e realizar estudos como os feitos pelo Foundation Center””.
A opinião é compartilhada por Fernando Rossetti, secretário-geral do GIFE, e Candace Cindy Lessa, diretora do Programa Brasil do Instituto Synergos. Em artigo que analisou o futuro da filantropia no Brasil, eles garantiam que a falta de incentivos fiscais também significa que não há necessidade de declarar as doações para o imposto de renda e, portanto, não existe uma maneira oficial de registrar a filantropia individual.
“”Embora a motivação principal possa não ser os incentivos fiscais, esses poderiam produzir informações que nos ajudariam a entender o comportamento filantrópico individual e, dessa maneira, influenciar o desenvolvimento do setor””.
Nesse sentido, o ′ambiente fiscal e jurídico no Brasil precisa ser desenvolvido′, defendem. Para eles, é necessário criar novos tipos de estrutura organizacional sem fins lucrativos que possam atender melhor às características das organizações a que se destinam: repassadoras de recursos (grantmakers), fundações comunitárias, fundos de justiça social e até mesmo organizações operacionais de origem empresarial.
Rossetti e Cindy concordam que o ambiente filantrópico no Brasil ainda está se adaptando ao novo papel da sociedade civil na transformação. Embora a filantropia/investimento social privado tenha superado sua identidade tradicional vinculada ao Estado, na opinião deles, sua natureza e cultura ainda não estão completamente definidas e entendidas.
“”Sabendo-se a quem os recursos foram doados, seria possível conhecer quem são os receptores, criando um sistema de transparência, o que permitiria uma maior ′accountability′ social dos doadores e dos receptores””, crê Marcos Kisil.
Outra característica da filantropia brasileira é o anonimato. A preferência é analisada pelo presidente do Idis: “”pessoas altruístas e religiosas preferem o anonimato porque ′o que uma mão dá, não precisa ser conhecida pela outra′. Outros, diante de uma sociedade violenta, preferem não ser reconhecidas como portadores de riqueza””.Leia também:
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