Falta de informação é principal obstáculo para investimentos na questão racial

Por: GIFE| Notícias| 16/11/2005

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

“”Existem poucos recursos para a área de promoção de direitos e muito pouco para a área de justiça racial. As organizações do movimento negro costumam ter dificuldade em conseguir apoiadores para suas causas e acredito que seja porque as pessoas desconhecem o tema. E têm medo do desconhecido.””

Com essa afirmação, a assessora do Programa de Direitos Humanos da Fundação Ford, Denise Dora, aponta para uma das principais questões quando o assunto é diversidade racial. No mês em que se comemora o Dia da Consciência Negra (20 de novembro), o assunto costuma ser retomado com força, mas ainda não de forma suficiente para fazer despertar um debate contínuo e transformador.

Para Denise, debate e controvérsias sobre o tema são positivos, visto que, há alguns anos, talvez houvesse um absoluto consenso de que o Brasil não era um país racista, de que tinha instituído um bom nível de convivência entre pessoas de origens étnicas distintas e de que não havia violência e discriminação racial no país. “”Hoje, o que se vê é um passo muito positivo no sentido da própria população, das instituições, dos governos e das universidades estarem fazendo questionamentos sobre o quanto isso é consenso e o quanto é verdade””, explica.

De acordo com o Censo de 2000, 47% dos brasileiros são não-brancos, ou seja, metade da população. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) também identificou que apenas 2% dos universitários do país eram não-brancos e, Denise lembra, quando só a minoria da minoria tem acesso à capacitação profissional e à formação superior, por exemplo, essa minoria não tem como levar o país inteiro para frente.

Reinaldo Bulgarelli, educador e diretor da Txai Cidadania e Desenvolvimento Social, concorda que a lógica que mantém essa parcela da população em situação de desvantagem concreta e simbólica causa grande prejuízo à economia nacional. Ele afirma que existem muitas abordagens a serem consideradas numa perspectiva democrática, mas o importante é sair da inércia e contribuir efetivamente para enfrentar e superar a questão.

Neste sentido, diz ele, há hoje uma consciência maior sobre a importância de superar a fase do dizer não à discriminação para dizer sim à diversidade como valor. “”Isso favorece avanços conceituais e no campo da mobilização social, ao desenhar um horizonte positivo onde as diferenças possam ser abordadas como uma riqueza e não como um problema. Os problemas podem ser ignorados, mas jamais as nossas riquezas.””

Ultimamente, muito se fala sobre programas de empresas voltados à diversidade racial. Para Denise Dora, isso acontece porque eles são novidade e exceção, e não porque sejam muitos. “”As empresas que tratam da diversidade são ponta-de-lança, são aquelas que conseguem enxergar à frente, percebem que o país não tem como avançar sem isso e pensam prospectivamente. Mas acho que ainda são poucos os programas””, explica. Isso acontece porque só se pode apoiar um projeto, confiante, se existe uma opinião formada sobre o tema, o considera importante e se seus atores políticos são conhecidos.

“”Isso requer conhecimento técnico e de vida sobre a causa. Acaba que por uma questão de desconhecimento, falta de familiaridade com o tema, falta de experiência, falta de espaço onde se possa aprender sobre isso, as pessoas não têm como se arriscar a fazer investimento para algo que elas não sabem a respeito””, afirma Denise.

O presidente da ONG Afrobras, José Vicente, concorda que a questão racial é controversa, inclusive entre os próprios negros, em razão da falta de informações precisas sobre o tema, seus fundamentos, sua importância e mesmo o seu valor no cenário sócio-econômico cultural. “”As informações disponíveis ou são superficiais ou são caricaturais, ou mesmo contra-informações””, alerta. Ele aponta para a incompreensão e o desinteresse como principais causas do baixo investimento das empresas, fundações e institutos em projetos que visam a diversidade racial.

Um campo a ser descoberto, conta Denise, é o de projetos que impliquem em educação em direitos, maior conscientização da população acerca da necessidade de mudanças estruturais e projetos inovadores neste sentido. “”O empresário sabe que, quando vai montar uma empresa, a primeira coisa com que deve se preocupar é a infra-estrutura física, para depois começar a produzir seus produtos. Na vida social é muito parecido. As pessoas têm trabalhado em condições precárias e, muitas vezes, desistem de projetos que poderiam ser muito interessantes e efetivos porque não têm este apoio para, por exemplo, pagar a conta de luz.””

Cida Cunha, diretora executiva do Instituto Xerox, afirma que, comunitariamente, muitas iniciativas têm se mostrado positivas para equilibrar a sociedade. Para ela, desafios do passado estão sendo vencidos, como o aumento do debate em torno da questão racial, a educação para cidadania orientada a respeitar o próximo e o reconhecimento da injustiça histórica que agravou a situação de exclusão que hoje se busca reverter. “”Acho que muitos passos positivos foram dados, mas suas conseqüências não vão se refletir em curto prazo. O desafio de agora é manter acesa a discussão em todos os níveis da sociedade para que, um dia, sequer precisemos discutir a palavra inclusão””, conclui Cida.

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