Faltam ações educativas com relação ao patrimônio cultural

Por: GIFE| Notícias| 25/08/2003

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Na última terça-feira (19/8), a Editora Peirópolis e a Editora da Universidade de São Paulo lançaram o livro As Cidades Brasileiras e o Patrimônio Cultural da Humanidade. Em entrevista ao redeGIFE, o autor do livro, Fernando Fernandes da Silva, fala sobre as ações de preservação do patrimônio histórico, a legislaçãobrasileira e a atuação de organismos internacionais.

redeGIFE – Qual a diferença entre patrimônio histórico e patrimônio cultural?
Fernando Fernandes – O patrimônio cultural compreende o conjunto de bens culturais. Os bens culturais são assim denominados porque recebem algum tipo de intervenção humana: física ou simbólica. Física porque, por exemplo, a madeira pode ser transformada numa cadeira. E simbólica porque certos bens possuem um significado histórico, artístico, religioso, arqueológico ou científico, entre outros. Portanto, o patrimônio histórico é uma espécie de patrimônio cultural.

redeGIFE – O que foi a Convenção da Unesco de 1972 e, em linhas gerais, o que ela definiu com relação à questão do patrimônio da humanidade?
Fernandes – A Convenção da Unesco de 1972 (Convenção Relativa à Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural) retrata o grau de maturidade alcançado pela comunidade internacional com relação à proteção dos bens que mais contribuíram para a formação da nossa civilização, como as pirâmides do Egito, do Pathernon e das cidades históricas, como Ouro Preto (MG), Olinda (PE) e Salvador (BA). Ela é a primeira convenção internacional a disciplinar a proteção dos bens culturais imóveis – monumentos, edificações, pontes, etc – em tempos de paz. Essa convenção prevê um programa de cooperação internacional, por meio do qual a Unesco presta uma assistência técnica, financeira e educativa aos Estados carentes de recursos no que diz respeito aos programas de proteção dos bens culturais.

redeGIFE – Quais são os critérios utilizados na definição de um bem como patrimônio cultural da humanidade?
Fernandes – A Convenção da Unesco de 1972 instituiu o comitê do patrimônio mundial, órgão competente para selecionar os bens culturais que devem integrar o patrimônio cultural da humanidade. Esse órgão faz tal seleção com base em critérios criados pela própria Convenção e complementados por seu regulamento interno, denominado Guide Lines. Em linhas gerais, esse comitê avalia a importância cultural do bem para a humanidade do ponto de vista histórico, artístico, arqueológico e religioso, entre outros valores. Além disso, também avalia a qualidade das medidas de proteção executadas pelo Estado onde o bem está localizado, como investimentos financeiros, incentivos fiscais, políticas urbanas adequadas e outros programas de conservação.

redeGIFE – Qual a função das organizações internacionais na preservação do patrimônio cultural brasileiro?
Fernandes – Tenho condições de avaliar apenas as atividades da Unesco, pois venho acompanhando seus trabalhos há pelo menos dez anos. Neste aspecto, a Unesco vem contribuindo significativamente para a proteção de bens culturais que estão sob risco, a exemplo da Cidade de Goiás, que recebeu assistência técnica e financeira dessa organização, em face das chuvas q ue provocaram a destruição parcial do seu patrimônio cultural, em dezembro de 2001.

redeGIFE – A legislação brasileira é favorável à preservação do patrimônio cultural do país?
Fernandes – A legislação brasileira é avançada nesse sentido, pois engloba as vertentes de proteção mais significativas: a conservação e a proibição do tráfico ilícito. A conservação visa a manter a integridade física do bem cultural e o combate ao tráfico ilícito assegura a reunião dos nossos bens culturais em território brasileiro. Estas vertentes de proteção jurídica são previstas na Constituição Federal de 1988, no Decreto-Lei Federal 25/37 – que disciplina o tombamento no país – e demais leis federais, estaduais e municipais.

redeGIFE – Os brasileiros têm tido mais consciência da importância da preservação do seu patrimônio cultural? A que isso se deve?
Fernandes – Sim. Entretanto, não tenho condições de analisar todas as razões, mas posso identificar algumas: o fim da ditadura militar, em 1984, pois a partir daí, a sociedade brasileira vem podendo manifestar livremente os seus mais diversos interesses e desejos. Tal situação é verificada pelo número crescente de organizações não-governamentais ligadas à proteção do meio ambiente, do patrimônio cultural e de comportamentos sociais diversificados. Outra razão é a própria Constituição Federal de 1988, que inovou em relação às constituições anteriores ao prever um capítulo específico e detalhado para a proteção do patrimônio cultural, permitindo a viabilização de políticas públicas com esse objetivo.

redeGIFE – O Brasil tem tido mais ações de conservação ou ações de restauração do seu patrimônio cultural? Por que isso ocorre?
Fernandes – Primeiramente, é necessário esclarecer que a conservação visa a manter a integridade física do bem no seu estado original, já a restauração visa à reparação de um bem cultural danificado ou desgastado, afim de retornar ao seu estado original. Não temos, atualmente, dados precisos que possam atestar qual é a política que vem recebendo um melhor tratamento. No entanto, acredito que a reparação de bens culturais é a mais carente, pelo fato de existirem poucos cursos e instituições especializadas na formação profissional de restauradores.

redeGIFE – Qual a importância do investimento de empresas e organizações do terceiro setor na preservação e na recuperação do patrimônio cultural?
Fernandes – É de extrema importância a participação das empresas e das organizações do terceiro setor, pois elas detêm um potencial econômico e humano significativo, que complementaria as ações governamentais relativas à proteção do patrimônio cultural. Além disso, tais entidades podem fortalecer o envolvimento da sociedade brasileira nas políticas de proteção.

redeGIFE – Quais ações são importantes para a preservação do patrimônio cultural brasileiro, mas ainda não foram feitas?
Fernandes – Acredito que a principal ação que ainda precisa ser feita é de caráter educativo. Essa ação compreende duas vertentes: a divulgação sobre a importância dos bens culturais para a sociedade brasileira e a formação de pessoas especializadas na área de proteção, principalmente no que diz respeito à restauração dos bens culturais. Nesse sentido, creio que as universidades poderiam criar cursos específicos para esse fim.

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