Formas inovadoras de fazer política são foco de debate online promovido pelo GIFE

Por: GIFE| 9º Congresso GIFE| 28/03/2016

“Inovação e Política” foi o tema central de mais um encontro virtual promovido pelo GIFE no dia 21 de março (clique aqui para assistir à discussão completa). O debate foi um aquecimento para a mesa “Democracia no século XXI: campo da inovação política, que faz parte da programação do 9o Congresso GIFE.

Participaram da discussão Ana Carolina Evangelista, da Fundação Avina, Manoela Miklos, da Open Society Foundations e criadora do movimento #AgoraÉqueSãoElas, e Thamy Pogrebinschi, cientista política do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ).

Ana Carolina Evangelista mediou as conversas, ressaltando em sua abertura a relevância do tema num momento em que diversos países, não apenas o Brasil, vivem crises da democracia representativa. “Vivemos processos em que a sociedade demanda maior proximidade e diálogo com o Estado e este debate é um convite para refletir sobre inovação e política e fortalecimento das democracias. É bastante oportuno que a gente possa discutir o que a sociedade tem feito nesse sentido”, comentou a representante da Fundação Avina, destacando ainda que a discussão sobre o tema terá continuidade no Congresso.

Thamy Pogrebinschi  contextualizou o assunto na América Latina, região em que as diversas concepções de democracia estão presentes e, em alguns casos, sobrepostas. “Como cenário de fundo, temos a democracia representativa, com partidos políticos, governantes eleitos pelo voto popular, parlamento, instituições representativas, sistema que existe atualmente e dificilmente deixará de existir”, explicou. “Ao mesmo tempo, sobretudo neste momento no Brasil, surge uma forma contestatória da democracia”, completou.

A cientista política também comentou sobre o reflorescimento da democracia associativa e de rede na América Latina e, por fim, citou a democracia participativa, dimensão na qual florescem e se manifestam as inovações mais relevantes no processo democrático.

Questionada sobre o que tem sido feito no campo da inovação nas democracias, Thamy destacou quatro frentes. A primeira é a democracia direta, com referendos, plebiscitos e iniciativas populares. “Não são necessariamente formas novas de fazer política, mas de alguma maneira inovam naqueles países onde não eram tradicionais”, explicou.

O segundo campo de inovação é a democracia digital, fomentada pela evolução tecnológica e acesso aos meios digitais por parte da população, que permite a participação dos indivíduos em processos legislatórios, de criação de políticas públicas, monitoramento dos representantes eleitos, entre outros usos. “São múltiplos os meios e as possibilidade de uso”.

Em terceiro lugar, Thamy citou a democracia deliberativa, com a participação dos cidadãos com o uso ou não de tecnologia a fim de transformar opiniões e cenários por meio do diálogo.

E por fim, em quarto lugar, a cientista política destacou a representação cidadã ou não-eleitoral. “Há um grande número de formatos em que o cidadão exerce um papel representativo sem um mandato, uma eleição oficial. São pessoas que representam ideias ou valores em comum e que adquirem legitimidade de formas diversas que não a eleitoral”, explicou.

“As formas de inovar são múltiplas, mas o importante é que trazem o cidadão para dentro da formulação das políticas, permitindo assim uma transformação potencial”, finalizou Thamy.

ISP na inovação da democracia

Manoela Miklos, da Open Society Foundations, explicou que as crises de confiança da democracia representativa abrem espaço para experiências que buscam mudanças institucionais e formas que aproximem o cidadão do processo de tomada de decisão.

“Algumas organizações nasceram com DNA de inovar na construção de espaços de participação cidadã e outras não têm essa característica nata, mas percebem a sua importância do tema e querem contribuir. O papel da Open Society é unir estas  organizações às oportunidades existentes”, explicou Manoela, ressaltando que processos eleitorais e momentos de crises configuram como aqueles em que surgem oportunidades para identificar possibilidades de inovação.

Uma das preocupações da instituição é não dar prosseguimento em desigualdades e, ao contrário, gerar oportunidades para causas de grupos menos favorecidos, ampliando assim o processo democrático. Manoela explicou que na esfera global cresce o papel da América Latina e dos projetos da região e, na esfera nacional, a instituição busca casos de desenvolvimento de aplicativos nas periferias, que abarquem questões de gênero e raça para trazer todos esses aspectos para o debate.

Quebra de paradigmas

“Como de fato obter mudanças institucionais de forma mais rápida, uma vez que os processos ocorrem de maneira lenta e a inovação não entra na agenda do governo?” – perguntou um dos internautas durante o debate.

Para responder essa questão, Thamy usou como exemplo o projeto Latin, apoiado pela Open Society, que mesmo com dados preliminares já quebra alguns mitos existentes. “O trabalho final será consolidado no final do ano, mas uma das coisas que já podemos perceber é que as inovações são muito mais institucionalizadas do que se pode assumir inicialmente”, comentou.

O trabalho da pesquisadora mostrará com dados empíricos a forma como ocorre a inovação democrática na América Latina e como ela impacta a qualidade da democracia na região. Todos os 20 países latino-americanos serão abrangidos no estudo e, neste momento, os países analisados são: Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Equador, El Salvador, Colômbia,  Venezuela e Peru.

Na pesquisa, cinco dimensões são usadas para analisar a qualidade destas inovações: responsividade, ou seja, a possibilidade das ações adquirirem algum tipo de resposta do Estado; accountability, olhando questões de transparência e efetividade de prestação de serviços públicos; Estado de direito, analisando inovações que busquem fortalecer o sistema de justiça e o cumprimento dos direitos civis, políticos, humanos e sociais já previstos para os cidadãos; inclusão política, avaliando a entrada de novos atores, em muitos casos minorias ou grupos que antes não participaram ativamente no processo político; e, por fim, a igualdade social, com iniciativas que trabalhem no sentido de minimizar as desigualdades atuais.

“É muito interessante ver que há um número enorme de inovações que partem dos próprios governos, principalmente na área de políticas sociais”, comentou Thamy. A pesquisadora ressaltou, porém, que seria possível concluir que a virada à esquerda que ocorreu na América Latina desde o final da década de 1990 favoreceu o surgimento de inovações políticas, principalmente no âmbito social. Porém, um ponto interessante já notado pelos dados preliminares é que diferente do que se imagina, as inovações na política não dependem da orientação política dos governos atuantes nos países.

Outro paradigma já quebrado pelos dados iniciais é que as inovações existentes na região possuem impactos apenas locais. “Sempre se assumiu que os mecanismos de participação sejam basicamente locais e de pequena escada. Mas, vemos um número muito grande de inovações de impacto nacional”, explicou a cientista.

Impacto e resultado

Mas, afinal, é possível avaliar a inovação participativa? Manoela explicou que “não é uma coisa trivial avaliar se os investimentos feitos em determinados projetos fizeram sentido. As organizações são muito orientadas para resultados concretos, porém precisamos levar em conta o processo como um todo, se houve um aprendizado, se há um diálogo e a entrada de novos atores sociais”.

A dificuldade de avaliar os resultados também foi destacada por Thamy. “Há diversas maneiras de tentar mensurar o impacto, mas é difícil conseguir informações e dados. Algumas coisas são muito recentes e ainda não existem estudos de impacto”, comentou.

Apesar desta dificuldade, a pesquisadora tem um olhar positivo sobre o processo de inovação na política em geral. “O impacto maior é ver a multiplicidade de tudo isso, quantas mediações novas existem entre a sociedade e o Estado. Esse é o maior ganho para a democracia. Estamos num momento de transformação e é muito difícil no meio desse processo avaliar o que se alterou. Estamos vivendo a transformação agora”.

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