Gestão e tributação ainda desafiam fundações

Por: GIFE| Notícias| 03/09/2007

Rodrigo Zavala

As fundações voltadas ao bem-estar social, sejam elas de origem pública ou privada, enfrentam dois desafios recorrentes para uma atuação efetiva, segundo especialistas: a gestão de seus processos e a instabilidade jurídica na qual estão mergulhadas. Nesse contexto, a necessidade de promover ajustes tornou-se a tônica dominante dos seminários e debates realizados pelas entidades que congregam essas instituições.

O exemplo mais próximo foi o 3º Encontro Paulista de Fundações, promovido no ultimo sábado, dia 01 de setembro, pela Associação Paulista de Fundações (APF). Ao reunir especialistas do sistema fundacional brasileiro, o evento foi norteado por temas como captação de recursos, gestão e tributos. “”São questões que viabilizam um grande leque de assuntos correlatos, desde comunicação a controle, transparência, parcerias público-privadas e fiscalização””, afirmou a presidente de APF, Dora Bueno.

Já no início das apresentações, o curador de fundações do Ministério Público de São Paulo, Airton Grazzioli, foi enfático ao falar sobre a necessidade de melhorar o profissionalismo e a transparência do setor. Para ele, os problemas enfrentados pelas fundações (e por todo o terceiro setor) são creditados ao histórico recente do setor, “”por ainda estar na adolescência””.

“”No entanto, o terceiro setor já movimenta mais de 5% do PIB nacional e exerce uma significativa parcela de responsabilidade do poder público. Não há mais espaço para amadorismo. Ele carece de ajustes para sua atuação, que devem ser coordenados por fundações sérias””, argumentou.

Tributação – Nas considerações sobre o tema, os especialistas convidados para comporem as mesas de debate deixaram claro que o Brasil possui uma legislação para o terceiro setor fragmentada, contraditória e conflituosa. Principalmente, no que diz respeito à conturbada relação entre sociedade civil organizada e governo, que trabalha, muitas vezes, de forma ambivalente, ora concedendo imunidades e isenções, ora cancelando-as de forma arbitrária.

“”O marco legal do setor é muito precário. Mesmo lidando todos os dias com essa legislação, é difícil estar seguro””, criticou o representante da Fundação Roberto Marinho, Cláudio Vasconcelos. As considerações do advogado foram seguidas pelo apoio do público, que vê nessa deficiência legal um impeditivo para o desenvolvimento de seu trabalho.

Um dos palestrantes que se destacaram na temática foi o presidente da Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas, Antonio Brito, que discorreu sobre o benefício de uma instituição ser titulada com o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas). Além de isenção de impostos, como por exemplo, o da contribuição previdenciária (26,5% da folha de salários), o certificado traz um retorno positivo para a imagem da instituição, tal como possibilita a formulação de parcerias estratégicas com o governo.

“”O Cebas é uma titulação importante e não um documento burocrático que permite isenções. Por isso, não é admissível que os parâmetros para a certificação sejam mudados sem critérios que levem esses fatores em consideração””, disse.

Outro palestrante aplaudido pelo público foi o doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o advogado Marco Greco. Ao falar sobre as contribuições sociais, ele dissertou dentro de uma perspectiva de adequação e congruência da atividade contribuinte. “”As organizações sociais mantêm erroneamente uma estratégia de bloqueio: pensar em uma forma de não pagar. É preciso ver, no entanto, para quê se paga determinada contribuição. Só assim será possível redefinir e redimensionar o que é pago””, afirmou.

O advogado deu como exemplo uma instituição de ensino filantrópica que tem, entre as contribuições onerantes, aquela com fim educacional. Isto é, ela retroativamente paga um tributo que, teoricamente, vai para ela. “”É o reconhecimento da atividade fim. Mas para uma mudança é preciso dialogar com o fisco””, reconheceu.

Gestão – Embora os temas gestão e captação de recursos tenham aparecido como eixos focais distintos no temário do evento, os participantes mostraram que essas discussões não podem ser dissociadas. O diretor regional para América Latina e Caribe da Fundação W.K.Kellogg, Francisco Tancredi, foi assertivo ao falar que a accountability é essencial na gestão de todos os processos.

“”A sociedade tem o direito de saber o que é feito com os recursos. Como ele é gasto, como são feitas as avaliações de resultado dos projetos pagos por esses recursos, qual é o público beneficiado etc. Todas questões inerentes à gestão da entidade””, afirmou.

Para o secretário-geral do GIFE, Fernando Rossetti, existe uma competição acirrada pelos recursos doados a organizações sociais, explicado pelo aumento exponencial do terceiro setor, aliado ao deslocamento do dinheiro investido por organizações internacionais para continentes com problemas mais profundos, como a África.

“”Mesmo o governo compete pelos recursos de origem privada. Para conseguí-los, não basta uma boa idéia, mas ter um projeto bem estruturado, que se revela na gestão de todos os processos da organização””, argumentou.

Dentro dessa análise, é possível entender as palavras do promotor Airton Grazzioli, quando alega que não pode haver mais amadorismo no terceiro setor. Tal como, não é mais possível que fundações trabalhem sua comunicação de forma pouco estratégica, como identificou o professor de Marketing Social da FIA/USP, Ricardo Voltolini.

“”Como ser diferente entre mais de 276 mil organizações sociais? Se comunicar bem com os mais diferentes stakeholders, principalmente entre os que financiam, é essencial””, afirmou.

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