GIFE lança Painel de Transparência para a área do investimento social privado

Por: GIFE| 9º Congresso GIFE| 04/04/2016

O tema da transparência tem ganhado, cada vez mais, a pauta de um intenso debate no Brasil. Seja pelas recentes legislações criadas – como a Lei de Acesso à Informação, a Lei da Transparência e o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, entre outras – ou pela convocatória da sociedade para que as instituições sejam mais abertas e claras nas suas operações, evitando processos corruptos, o assunto está em voga e é urgente.

Atento a essa crescente demanda, o GIFE reforça a relevância desta discussão, pois acredita que o investimento social privado deve se valer de mecanismos que possibilitem maior compromisso direto com a transparência, especialmente por sua missão de contribuir para o bem público.

Por isso, a organização lançou, durante o 9º Congresso GIFE, o Painel GIFE de Transparência, um instrumento inédito no país que pretende transformar o cenário da transparência entre as fundações e os institutos privados brasileiros.

Trata-se de uma ferramenta online que reúne, organiza e disponibiliza informações institucionais relevantes sobre os associados do GIFE a partir de um grupo de indicadores. Este instrumento permite a qualquer um observar se a organização publica em seu site a informação sobre cada indicador definido e acessá-la por meio de link que direciona o usuário para o dado no site do associado. Até o momento, o painel conta com a adesão voluntária de 41 investidores sociais.

O painel, criado e inspirado em outras iniciativas semelhantes internacionais, como o GlassPockets – projeto de 2010 do Foundation Center (EUA) -, se propõe a funcionar como um mecanismo de autorregulação e uma ferramenta prática para vivenciar essa transparência.

No painel, é possível também conferir a literatura sobre o tema já produzida pelo GIFE e por outras organizações de referência, bem como relatórios analíticos sobre os dados coletados, links para experiências internacionais e guias orientadores.

Segundo Iara Rolnik, gerente de Conhecimento do GIFE, a plataforma é um projeto de construção contínua e a proposta é que se desenvolva em etapas e que os indicadores possam ser aprimorados a partir dos resultados alcançados e das análises e diálogos realizados, ou seja, da evolução do próprio tema.

“A nossa intenção é gerar um movimento nas organizações para que elas percebam que a transparência não é apenas divulgação de informação, mas é necessário pensar sobre o valor dessa informação, sobre o que é compartilhado, de que forma e o porquê”, destaca a gerente do GIFE.

Práticas transparentes

Durante o lançamento do Painel, Iara ressaltou a importância de iniciativas como esta para que as instituições possam avaliar em que estágio se encontram em relação à práticas transparentes, assim como fomentar novas posturas, a partir de uma análise e avaliação interna.

Em sua percepção, o setor precisa sair apenas do discurso da importância da transparência – algo que já está consolidado na sociedade – para práticas de fato transformadoras. “Percebe-se que as organizações que estão por trás destes importantes movimentos pela conquista de mais transparência na sociedade não têm disseminado internamente o valor da transparência. Há um descompasso entre a fala e a ação”, disse.

O que se percebe é a prevalência ainda de uma visão de que o que está no âmbito privado deve continuar privado. “Porém, estamos falando de organizações que atuam para o interesse público e, portanto, precisam ser transparentes. E é nisso que queremos incidir. Precisamos estabelecer um diálogo franco e aberto”, acredita Iara.

Janaina Jatobá, gerente de Desenvolvimento Institucional e Comunitário do Instituto C&A – apoiador do Painel GIFE de Transparência – destacou ainda a importância do tema ter se tornado uma agenda estratégica para o GIFE e seus associados, pois colabora no exercício do desenvolvimento dos associados e de todo setor.

“Ser pedra é fácil, difícil é ser vidraça”

O provocativo provérbio chinês “Ser pedra é fácil, difícil é ser vidraça”, deu o tom à discussão da mesa de debate no Congresso GIFE sobre a temática de transparência. O que significa, afinal, ser transparente? Quais são os principais desafios neste campo? Como avançar em práticas mais dialógicas e abertas? Essas foram algumas das perguntas que nortearam a atividade.

A mesa contou com a participação de José Eduardo Romão, diretor vice-presidente do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada); Janaina Jatobá, gerente de Desenvolvimento Institucional e Comunitário do Instituto C&A, e Paulo Nassar, professor da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo.

José Eduardo Romão iniciou a conversa destacando que atuar na esfera pública impõe às instituições uma série de condições e exigências para o exercício da autonomia privada no espaço público, e que é preciso fazê-la com fundamentos, invocando leis, produzindo legalidade e, com isso, aferindo legitimidade às ações.

E, a transparência, é justamente uma das exigências. “É preciso que sejam revelados quais os interesses da organização, o que se faz, como faz etc. Claro que ser transparente não é a exposição indiscriminada de informações, mas, caso seja preciso sigilo de algo, é preciso justificar”, explicou.

O especialista destacou que ser transparente não é fácil e que exige, portanto, coragem. Isso porque a transparência traz, muitas vezes, uma perspectiva repressora, unidirecional, de ameaça, ou seja, de punição quando algo sai errado. “Ainda estamos operando na ordem de adversários, de jogar a pedra”, comentou.

Relembrando o provérbio chinês que deu nome à mesa de debate, Romão destacou que a metáfora da vidraça é interessante no âmbito da transparência, pois ela permite observar a instituição pelos dois lados: o de dentro e o de fora. Porém, a tendência ainda é olharmos apenas de fora, destacando ao observador somente aquilo que nos interessa mostrar e ressaltar, ou seja, as coisas boas da ‘casa’.

A partir dessa unidirecionalidade, é comum que os dados e informações divulgados sejam insuficientes ou pouco relevantes para uma análise mais adequada sobre a organização. “Essa dimensão da vidraça confere acesso e atribui espaço para que as pessoas conheçam apenas o passado das instituições que, normalmente, são divulgados em relatórios que ressaltam somente as ações realizadas e exitosas”, comentou.

Porém, em sua avaliação, para que uma organização seja de fato transparente, é preciso criar um novo movimento, olhar a partir de outra dimensão, aproximando o que tem dentro e o que está fora. “É preciso compreender a transparência como uma oportunidade de comunicação, de olhar o mundo de dentro da organização. Assim, quando alguém se aproxima da janela para olhar a vidraça, temos que convidá-la a entrar, saber quais são as nossas rotinas, o funcionamento, os esforços, as dificuldades e destacar o que ela pode fazer para ajudar”.

A partir desse movimento, o que se espera, destaca o especialista, é criar um novo fluxo de interação e não de ameaça.

Romão ainda trouxe aos presentes três sugestões de mecanismos para vivenciar a transparência olhando para diferentes perspectivas. No que diz respeito ao passado, as organizações devem criar ferramentas de avaliação de impacto, inclusive com a participação de beneficiários, garantindo que não sejam divulgadas apenas as boas práticas, mas relatos sobre o que não foi exitoso para que outras possam evitar o mesmo erro.

Em relação ao presente, criar mecanismos de visualização das rotinas de trabalho e do cotidiano da organização, garantindo uma interação com os diversos stakeholders, e, para o futuro, instituir ferramentas que permitam a participação de um público amplo nas ações da entidade como, por exemplo, no planejamento e na definição da agenda de atuação.

“Mas, como disse, é preciso coragem para isso”, reafirmou.

Comunicação e transparência

Para o GIFE, processos transparentes andam de mãos dadas à comunicação e, portanto, são duas agendas estratégicas e relevantes que precisam ganhar força e valor nas instituições.

O professor da ECA, Paulo Nassar, ressaltou durante o debate justamente o fato de que, atualmente, por conta dos novos processos comunicacionais, não é possível mais as organizações criarem narrativas a respeito de si próprias e acharem que esse discurso será o único a respeito de si.

“Hoje, os vários públicos com os quais essa organização se relaciona também estão produzindo narrativas sobre ela. Ou seja, qualquer decisão vai provocar inúmeros pontos de vista e, mais do que isso, vão circular e provocar controvérsias. E é preciso estar preparado para isso”, comentou.

Em sua avaliação, o que se percebe na sociedade atual é a necessidade de entender que os processos comunicacionais se tornaram, na verdade, processos educacionais e que as organizações devem estabelecer uma comunicação mais dialógica. “Precisamos ser protagonistas destes processos comunicacionais e estabelecer pontes. Acreditem que as narrativas podem transformar as pessoas e as organizações”, ressaltou.

Segundo o professor da ECA, uma nova postura exige tempo e um olhar para além das metas e resultados, ou seja, observar a dimensão da narrativa que qualifica o outro. “Precisamos equilibrar a dimensão e relação entre quantidade versus qualidade, de objetividade versus subjetividade. É preciso olhar para outras coisas. Basta ver o que significa a palavra ‘grandioso’: vem da palavra  ‘grão’”, disse Paulo Nassar.

Experiência prática

Janaina Jatobá, gerente de Desenvolvimento Institucional e Comunitário do Instituto C&A, compartilhou com os presentes na mesa de debate de que forma o organização entende a questão da transparência e de que forma vem enfrentando este tema nos últimos 25 anos, principalmente neste momento de internacionalização das ações com a união à C&A Foundation.

Segundo a gerente, foi preciso tomar uma série de decisões frente a uma rede de entidades e parceiros que já reconheciam o Instituto por sua agenda na área de educação e fortalecimento das organizações da sociedade civil e, que a partir de agora, passa a abraçar as causas sociais e ambientais da indústria da moda.

“Decidimos compartilhar com os parceiros o mais rápido que pudemos essa informação, por meio de reuniões, visitas, materiais de comunicação etc. Tivemos muito silêncio e também respostas. Mas é preciso criar um lugar de abertura, de franqueza. E foi a confiança que estabelecemos que nos trouxe a segurança de termos essa atitude”, comentou.

A gerente do Instituto C&A acredita que, para criar um ambiente de confiança, é preciso ser transparente. E isso significa estabelecer um diálogo franco, compartilhando com o outro o momento atual da organização, com suas possibilidades e limites. O resultado dessa postura é que o outro também se abre.

“E aí acontece uma mágica. A verdade é sentida. E a verdade que se constrói tem capacidade maior para responder as questões que estão colocadas. É preciso abrir a casa e identificar as fragilidades, senão não avança. É preciso trazer o diferente para que o processo de conhecimento e desenvolvimento seja mais rico e os vínculos e os elos sejam fomentados de fato.  A empatia faz a diferença! Afinal, se eu te entendo melhor, não vou chegar com pedra”, avaliou.

E, trazer o outro para o diálogo, na percepção do Instituto C&A, deve perpassar todos os processos de um projeto, programa ou iniciativa a ser realizada. São ações e gestos simples, garantiu Janaina, mas que fazem toda a diferença.

“A transparência exige não só coragem, como apontou o Romão, mas também abertura, honestidade, coerência e consistência no que se faz. É preciso estabelecer uma escuta verdadeira, aquela em que nos colocamos no lugar do outro. Esse vínculo que se estabelece abre a porta da confiança e te leva para iniciativas de fato significativas”, ponderou a gerente.

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