Impacto de selos da área social é limitado pela falta de ações de comunicação

Por: GIFE| Notícias| 25/04/2005

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Para os consumidores, o selo social Empresa Amiga da Criança – concedido pela Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente por meio do Programa Empresa Amiga da Criança – é importante, agrega credibilidade e seriedade ao produto e traz benefícios para a criança. No entanto, do ponto de vista do conhecimento, não há clareza sobre o seu significado. É o que constatou uma pesquisa qualitativa divulgada pela organização no início deste ano.

Outra pesquisa recente, realizada pelo Instituto Akatu – Responsabilidade Social das Empresas – Percepção do Consumidor Brasileiro -, indicou que a maioria dos consumidores brasileiros acredita que pode interferir na atuação responsável das empresas e expressa ter consciência de seu papel de agente modificador do mercado. Muitos deles têm interesse em saber mais sobre as corporações socialmente responsáveis, mas dizem que faltam informações.

Os dados mostram que a onda de criação de selos destinados a reconhecer atitudes socialmente responsáveis de empresas e organizações sociais não tem sido acompanhada de ações de comunicação equivalentes à sua proliferação. Com isso, os impactos destas certificações na área social e na conscientização do consumidor podem estar aquém do esperado.

“”A percepção do selo como valor adicionado de um produto ou serviço depende, sobretudo, dos estímulos que o consumidor recebe para identificar-se com a atitude valorizada pelo selo e premiar, com a sua preferência, o produto ou o serviço compromissados com a causa””, afirma Ricardo Voltolini, professor de marketing social da Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA/USP) e consultor de terceiro setor da TV Cultura e da Ofício Social Consultoria.

Tanto no que diz respeito ao selo quanto à causa, Voltolini lembra que comunicação é fundamental. No entanto, ela não deve ser feita esporadicamente, e sim planejada, estratégica e regular, sendo apoiada em diferentes meios de comunicação, em proposição de valor clara para a sociedade, com freqüência relevante e em mensagens persuasivas, que informem sobre a causa, destaquem a credibilidade do proponente e reforcem, como conduta socialmente desejável, a atitude de premiar produtos e serviços ligados a empresas socialmente responsáveis.

“”A valorização de selos é, acima de tudo, um processo de natureza cultural que só pode ser acelerado com comunicação. Estamos, sem dúvida, no começo deste processo e muito há por caminhar. O desafio é longo e pressupõe uma ação muito bem planejada””, explica Voltolini.

Empresa Amiga da Criança – A pesquisa da Fundação Abrinq envolveu consumidores das classes A e B, entre 25 e 40 anos. Foram apresentados a eles produtos que possuem nas embalagens o Selo Empresa Amiga da Criança e outros, concorrentes, sem o selo. Foi constatado que o consumidor reconhece o selo como sendo fornecido pela Fundação Abrinq, respeita a organização, já ouviu falar sobre ela, sabe que suas ações são em benefício das crianças e das adolescentes, mas não sabe exatamente o que a instituição faz.

Segundo o relatório Descobrindo o Consumidor Consciente: uma nova visão da realidade brasileira, do Instituto Akatu, o Selo Empresa Amiga da Criança é o terceiro mais conhecido pelos consumidores, atrás apenas do ISO 9001 e Reciclado/Reciclável. O Programa Empresa Amiga da Criança reconhece, por meio do selo, empresas que assumem 10 compromissos com a criança brasileira, entre eles dizer não ao trabalho infantil, respeitar o jovem trabalhador, incentivar e auxiliar as funcionárias gestantes a realizar o pré-natal, estimular a amamentação, fazer investimento social na criança ou adolescente compatível com o porte da empresa e contribuir para Fundos de Direitos da Criança e do Adolescente.

Mariza Tardelli, coordenadora do programa, conta que pesquisas anteriores já haviam identificado que as pessoas reconhecem o selo como uma das mais importantes ferramentas de comunicação da Fundação Abrinq. “”Nos surpreendeu o fato de que os consumidores, embora tenham afirmado que lhes falta informação, reconhecem que, se fossem regularmente informados e estimulados a assumir uma postura consciente, as chances de optarem por produtos reconhecidos por selos como este aumentariam muito. Falta-lhes informação e estímulo para esta escolha.””

A questão, explica Mariza, é instrumentalizar, para que as pessoas saibam do que se trata e onde buscar informações sobre o programa. “”O consumidor compreende a relevância do assunto e não demonstra resistência. Portanto, a melhor maneira de apresentar o significado e a importância de um selo social é oferecer informações que favoreçam uma diminuição da dissonância no momento da compra, redimensionando e importância das escolhas, transformando uma prática banal do dia-a-dia num momento de consumo consciente.””

As empresas que possuem o selo têm um papel muito importante nessa ação, já que são elas que possuem um canal de comunicação direta com seu consumidor. Além de estampar o selo nas embalagens e demais ferramentas de comunicação, elas devem estudar formas de informar sobre o que significa ter o selo. “”Várias Empresas Amigas da Criança já fazem isso, colocando na embalagem, por exemplo, junto ao selo, o texto sobre os 10 compromissos. Também realizam ações de propaganda, com peças de publicidade nas quais eles aparecem. O importante é incorporar em suas ações de comunicação também estratégias que informem sobre o sentido do selo””, explica Mariza.

Enquanto isso, a organização que certifica tem como principal atribuição dar visibilidade para as principais problemáticas sociais que aborda, alertando a população sobre a importância de todos contribuírem em suas causas.

Para Ricardo Voltolini, algumas das ações necessárias são: a realização de uma pesquisa de abrangência nacional sobre como os consumidores reagem aos selos, o que pensam e o que querem; uma grande campanha pró-bono pela importância da causa, reunindo um pool de agências de propaganda e de veículos de comunicação, para assegurar a necessária freqüência de mensagens; uma grande campanha de merchandising social nas telenovelas, promovendo a atitude de valorizar os selos; uma campanha regular incluindo o tema como conteúdo extra-curricular nas escolas públicas do país; e campanhas realizadas por empresas para valorizar selos e compromissos socialmente responsáveis.

Credibilidade – Um selo de responsabilidade social torna-se sem validade ou importância caso o conceito ou causa a qual ele se refere não esteja claro ou internalizado na mente do consumidor ou da empresa, lembra Miguel Fontes, diretor da John Snow Brasil Consultoria. “”O selo traz apenas um valor simbólico para o compromisso de uma empresa com este conceito ou causa social. A empresa deve estar disposta a promover a causa social com desprendimento de intenções e buscar a melhoria de qualidade de vida da sociedade. O investimento social privado deve ser sempre colocado dentro de uma perspectiva de sustentabilidade organizacional e social de longo prazo. Um selo não contribui muito na discussão mais complexa e pertinente de sustentabilidade e, logicamente, também não interfere””, explica Fontes.

No entanto, de acordo com a advogada Laís de Figueirêdo Lopes, integrante do Núcleo de Estudos Avançados de Terceiro Setor (Neats – PUC/SP), se houver desvio de finalidade da certificação, o selo é inócuo e autoriza ações não idôneas, confundindo a percepção do consumidor. Por isso, ela indica ações de controle periódico qualitativo e de anúncio dos resultados à população em geral, após a outorga da certificação. “”Uma idéia é que o programa preveja a possibilidade de, além de checar o cumprimento dos requisitos, o ente certificador ofertar formação continuada para as empresas certificadas. Constatado que a empresa não mais cumpre os requisitos, esta deverá ser descredenciada, sob pena do programa perder sua credibilidade perante terceiros””, afirma.

Laís também aponta para a necessidade de avaliar a credibilidade da instituição certificadora e do regulamento do programa de certificação para distinguir os selos sérios daqueles que não o são. “”Um selo é uma marca que carrega em si a credibilidade de seu titular. E, sendo certificador, ele agrega à marca o regulamento do programa que irá definir as diretrizes ou os critérios para julgar quem pode ser certificado. Se o selo for baseado ou fundamentado em elementos técnicos e objetivos, esse impacto pode ser muito positivo, pois o certificado representará exatamente o significado para o qual foi instituído. E para que atinja a finalidade de interferir na decisão do consumidor, é preciso comunicar os seus valores.””

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