Iniciativas em prol da sustentabilidade precisam de inovação, transparência e foco na transformação local

Por: GIFE| Notícias| 14/05/2012

*Daniele Próspero – especial para o redeGIFE

A demanda por recursos naturais no mundo é maior que 35% da capacidade de renovação dos danos causados ao ambiente. O desmatamento da Amazônia está próximo a 800 mil km2, algo como o Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e uma parte de Minas Gerais juntos. Mais de 18% da floresta foi desmatada em 30 anos, devido à pecuária, assentamentos e grandes obras de infraestrutura. É cada vez mais difícil conter a devastação e mais caro mudar o estrago já feito.
Como reverter este quadro? Para os especialistas presentes no Fórum Fundo Vale, promovido em São Paulo, no dia 08 de maio, um cenário como este só irá se alterar quando a agenda de sustentabilidade entrar de fato no negócio das empresas. Para chegar a isto, não há uma fórmula pronta, mas alguns elementos e atitudes apontam como possibilidades de caminhos para mudanças.
A proposta é o investimento na criação e desenvolvimento de projetos inovadores, a aproximação das fontes de recursos disponíveis destas boas iniciativas, a formação de conhecimento na área, tanto com financiamento em pesquisas, quanto na capacitação na ponta, além do compromisso de todos, ou seja, a co-responsabilidade no processo.
Mirela Sandrini, diretora de Operações do Fundo Vale, iniciou sua fala destacando que as ações em prol da sustentabilidade precisam cada vez mais de transparência, foco e transformação local, tendo em vista que os financiadores, atualmente, procuram projetos de impacto e eficientes.
“Os financiadores vão exigir informações estruturadas e que permitam ganho de escala para impacto, não vão olhar mais ações pontuais, mas sim aquelas com resultados expressivos. Por isto, é preciso repensar em novos arranjos para tornar o Investimento Social Privado (ISP) mais otimizado e com métricas inovadoras para alavancar cada vez mais recursos em prol do objetivo comum”, acredita Sandrini, lembrando, porém, que no Brasil, não há uma tradição ainda de doação atrelada a metas e resultados. “Mas o setor corporativo pode mudar esta percepção. Espero que o Fundo Vale, que já conta com estas ferramentas, possa inspirar ações similares”, pontuou.
Estes novos arranjos apontados por Mirela, segundo Manoel Serrão, coordenador da Unidade de Mecanismos Financeiros do Fundo Brasileiro para a Diversidade (Funbio), são realmente urgentes, tendo em vista a mudança no cenário do financiamento ambiental. Se no início a agenda da sustentabilidade era algo muito monotemática, ou seja, os projetos eram voltados a uma espécie, um território, hoje este universo está muito mais complexo e integrado, tendo em vista a forte integração das agendas. Não há como discutir preservação, por exemplo, sem olhar a questão da pobreza e, isto, sem discutir a questão climática. “A abordagem territorial e em rede também é chave para fazer mudança no tamanho do problema que temos. A gente sente no setor privado, por exemplo, que o impacto é que está sendo buscado, e aí pode surgir margem para ganhos de eficiência”, afirmou.
Por isto, segundo Vinicius Diniz Vizzotto, advogado da UFRGS, as empresas que saírem na frente e gerirem seus negócios na perspectiva da sustentabilidade terão uma vantagem comparativa no futuro. “Uma pesquisa com 3500 fundos, por exemplo, mostrou que os fundos de investimento de sustentabilidade estão menos sujeitos à variação do mercado”.
Serrão enfatizou que, se na década de 90 boa parte dos recursos aportados eram externos, hoje existe uma capacidade de alavancagem própria no país, mas é ainda preciso criar um ambiente para que novos atores nacionais se posicionem e “paguem parte da conta”. “Por isto, a co-responsabilidade é elemento chave para a sustentabilidade. Cada um tem que fazer a sua parte. O que a gente tem visto como tendência é a possibilidade de composição dos recursos. É necessário dinamizar este ambiente de financiamento que, ainda conversa muito com o passado.”, completa. Para ele, uma iniciativa pode até começar com doação, mas de alguma medida, será necessário que ela se aproxime do mercado para ganhar escala.
Para isto, é preciso criar novas oportunidades, inclusive com incentivos fiscais, e outras ferramentas financeiras, que possibilidade investimento privado em longo prazo e analise fontes e riscos geridos.
Na opinião de Claudia Costa, do BNDES, não há falta de recursos, mas, devido ao tamanho do problema a ser enfrentado, novas fontes precisarão ser criadas. O BNDES, por exemplo, é um dos principais financiadores de projetos e políticas ambientais no Brasil, tendo linhas de financiamento para programas de apoio à eficiência energética, produtos e títulos verdes, como notas agrícolas verdes; FDIC Verde para cadeia fornecedores; Índice Carbono Eficiente (ICO2); Fundos de Florestas; Fundo de Atividades Produtivas; entre outros.
Para a região da Amazônia, uma das áreas prioritárias de boa parte dos projetos atuais, há o Fundo Amazônia, que capta doações voluntárias para investimentos não-reembolsáveis em ações de preservação na região. Há linha aberta para apoio continuado, além de chamadas públicas e parcerias institucionais. Atualmente, o fundo conta com uma carteira de 30 projetos, totalizando um apoio de cerca de R$ 300 milhões nos próximos anos. São 131 municípios beneficiados com as iniciativas. Entre as ações já realizadas está estruturação física e operacional de 58 órgãos de meio ambiente (reforma e capacitação), capacitação de 13.307 pequenos produtores rurais e habilitantes de comunidades, assim como a recuperação de 4 mil km2 de áreas degradadas.
Beto Verrissimo, cofundador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), destacou que justamente o aumento de projetos na região da Amazônia, juntamente com o controle inteligente e uma visão mais estratégica da ocupação territorial, garantiram que o desmatamento e a degradação caíssem: o desmatamento que estava a uma velocidade de 18 mil km2 por – o equivalente ao Estado do Sergipe – tem ficado em 7 mil km2. Apesar dos avanços, é preciso agora que estes ganhos ambientais sejam também acompanhados pela melhoria dos indicadores econômicos.
“Nunca esta região recebeu o aporte de investimentos de tantos investidores. A expectativa é que, na região da Pan Amazônia, sejam investidos mais de R$600 bilhões de reais. Mas, precisamos discutir qual vai ser o resultado disto. Em 2020 vamos dizer: conseguimos fazer um ciclo de investimento virtuoso que alterou os indicadores socioeconômicos, alterou a governança e conseguiu aumentar a preservação ou vamos ter um cenário de tragédia socioambiental? Mas, não temos como errar, pois a região é vital para o planeta”, ressaltou.
Segundo Claudia Costa, é justamente na disseminação de informações como estas, ou seja, comunicando o que é possível fazer, o que é preciso combater e na formação de parcerias em nome desta agenda de sustentabilidade, é que as fundações e organizações da sociedade civil podem colaborar e muito. “A transformação dos investimentos nesta região é laboratório desta chamada nova economia verde. Precisa compatibilizar conservação com o desenvolvimento em novas bases”, enfatizou.
Investimentos verdes
Para os investidores que pretendem aportar recursos em iniciativas que prezam pela sustentabilidade, já existem oportunidades no país. A bolsa de valores BM&F Bovespa promove diversas ações com este enfoque, como capacitações e treinamentos sobre sustentabilidade para as empresas listadas, além de oferecer produtos e serviços que auxiliem a decisão de investidores, como o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), composto por uma carteira atual de 47 ações de 38 companhias, de 18 setores. O GIFE faz parte do Conselho Deliberativo do ISE.
Uma nova ação a ser lançada pela bolsa durante a Rio+20 será o “Relate ou Explique”. A BM&F Bovespa está montando um banco de dados sobre as 456 empresas listas na bolsa a respeito de quais delas publicam relatórios de sustentabilidade e/ou balanço social e onde os investidores podem encontrar mais informações a respeito. Caso a empresa não publique, terá de explicar o porquê de não realizar esta ação. “Este é um valor muito grande para qualificar a tomada de decisões. Não há mais como desenvolver o mercado sem pensar em alternativas sustentáveis. Isto requer novos valores e novas formas de pensar. É imprescindível e inevitável”, enfatizou Sônia Favaretto, superintendente do Instituto BM&F BOVESPA.
Esta aposta em inovação é o que buscam alguns negócios sustentáveis que acabam de ser criados no país e que vêm se multiplicando a partir de ações empreendedoras. Um exemplo é a Biofílica, empresa criada em 2008 que visa ser uma solução privada para a gestão de extensas áreas florestais. Ela é focada na gestão e conservação de florestas na Amazônia a partir da comercialização dos serviços ambientais, investimentos em pesquisas e desenvolvimento socioeconômico das pessoas e comunidades que habitam as áreas sob sua gestão.
Já a Arvorar Soluções Florestais é uma empresa criada também em 2008 por iniciativa de uma ONG, o IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas. A empresa é especializada na prestação de serviços na área de conservação e meio ambiente. Entre as atividades executadas está o desenvolvimento de planos de manejo de áreas protegidas; diagnóstico e monitoramento de recursos socioambientais em áreas naturais; desenvolvimento de atividades relacionadas ao turismo e negócios sustentáveis em áreas naturais; avaliação de impacto ambiental de planos, programas e projetos; entre outras.
Para Cláudio Pádua, fundador do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE) e fomentador destes negócios, áreas como a Amazônia precisam ser tratadas como pólos de formação de uma nova economia, expandindo para outras áreas com os mesmos princípios. Na sua avaliação, o que falta é justamente unir as pontas, ou seja, juntar as pessoas ou empresas com boas idéias, os novos empreendedores, com aqueles que querem investir em ações inovadoras, mas não encontram este mercado. “Por isto o esforço deve ser criar e incentivar estes novos empreendedores, senão, vamos continuar fazendo mais do mesmo”, ressaltou.
Paulo Bellotti, sócio da Pragma ressaltou que esta cultura de empreendedorismo ainda está se formando no Brasil, mas que há boas práticas sendo fomentadas. Segundo o especialista, a aposta deve ser em gerar ativos na base na pirâmide, desde os tangíveis, como habitação, diretos de propriedade, poupança, assim como os não tangíveis, como educação, saúde e auto-estima. A Pragma criou algumas ações com este enfoque, como um fundo em que 20% do capital comprometido será alocado em empresas inovadoras e 80% em modelos de negócios estabelecidos para reforçar o impacto que geram na sociedade.
Dos 11 empreendimentos já iniciados, oito possuem bons resultados, como a Mar & Terra. A partir de diversos estudos, o grupo decidiu desenvolver a tecnologia de produção em cativeiro dos peixes pintado e pirarucu. Atualmente, a empresa já está exportando para o Japão e Estados Unidos. Já a Rio de Uma, criada em 2004, atua no sistema de integração de 250 pequenos agricultores para a produção orgânica de legumes e frutas no Paraná, Paraíba, São Paulo e Santa Catarina.
Para que novas iniciativas como estas surjam, garantem os especialistas, será preciso que as parcerias entre empresas, governos e sociedade civil se fortaleçam cada vez mais. “A integração é fundamental, pois o governo tem horizonte de quatro anos (tempo de mandato); as empresas têm visão do seu relatório trimestral; e quem acaba olhando a longo prazo são as organizações da sociedade civil. Este tipo de filantropia, que consegue influenciar em larga escala, com diálogo intersetorial, vai ser essencial na Amazônia. Isto porque, se pensarmos esta região como parte da solução da mudança climática, vamos ter que fazer nesta década uma aliança de parcerias, rompendo estigmas. Trata-se de um desafio monumental, que vai exigir, tecnologia, ciência e sobretudo o compromisso para atingir os resultados”, ressaltou Beto Veríssimo, do Imazon.
Na opinião da diretora do Fundo Vale, o Investimento social privado (ISP) tem muita possibilidade de crescer nesta área e colaborar para que mudanças efetivas sejam feitas. Isto porque a participação de filantropia impacta 0,2% no PIB brasileiro, sendo que, em outros locais, como nos Estudos Unidos ou Europa, este número está por volta de 5%. “Hoje o ISP é confundido ainda, por exemplo, com a área de compensação de impacto. Esperamos que grandes empresas possam dar exemplo na própria Rio+20”, enfatizou, destacando a importância de fortalecer um marco legal para integrar as grandes estratégias que vem sendo feitas e que ainda possam ser criadas.

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