Intercâmbio cultural auxilia processo de integração regional na América Latina

Por: GIFE| Notícias| 03/05/2004

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

Cultura e desenvolvimento social na pauta da integração regional da América Latina é o tema de uma das mesas de debates do 7º Encontro Ibero-Americano do Terceiro Setor, que acontece de 16 a 19 de maio, no Hotel Transamérica, em São Paulo. Um dos assuntos a serem tratados será como a questão cultural pode apoiar a redução da desigualdade social e promover a integração regional entre os países latino-americanos.

Organizações de diversas localidades têm se unido, formando redes e realizando fóruns, na busca pelo fortalecimento dos processos de desenvolvimento de espaços culturais e artísticos comuns, que contribuam para promover a circulação, a distribuição e o intercâmbio de informações, idéias e produtos culturais.

De acordo com o sociólogo Luiz Eduardo Wanderley, a cultura pode ser um elemento importante de integração latino-americana em diversos aspectos. A articulação de projetos artísticos nas áreas de música, teatro, dança e artesanato, por exemplo, é um deles. Outro aspecto diz respeito ao idioma. Wanderley entende que, nos países de língua espanhola, o segundo idioma deveria ser o português, e vice-versa.

Além disso, são necessários o intercâmbio entre universidades, apoiando e ampliando projetos de parcerias, e a criação de programas na mídia voltados para os temas da integração, que estimulem a conscientização regional. No entanto, Wanderley lembra que uma efetiva integração regional deve se apoiar numa democracia traduzida nas esferas política, econômica, social e cultural. “”Sem a resolução das questões sociais – desigualdades, injustiças, violência, pobreza, exclusão – não haverá uma integração válida.””

Ele lembra que, em algumas conjunturas, buscou-se ampliar a cultura popular para conscientizar e mobilizar forças na redução das desigualdades sociais, como os movimentos desenvolvidos nos anos 60 e seguintes. “”Hoje, é preciso mudar os conteúdos curriculares das escolas com esse objetivo, apoiar as instituições de educação popular e realizar programas na mídia numa outra concepção de sociedade, que tenha por meta combater todas as desigualdades””, afirma o sociólogo.

Ruy Cezar da Silva, diretor do Instituto Cultural Casa Via Magia e membro do conselho do 1º Fórum Cultural Mundial – que acontece no final de junho, em São Paulo – acredita que o diálogo entre as identidades culturais da América Latina pode potencializar a integração e a afirmação política e econômica da região. “”Novos parâmetros comerciais e econômicos dependem do reconhecimento das diferenças e das afinidades culturais. Valores culturais agregam valores econômicos a produtos e serviços. A identidade cultural é fator de auto-reconhecimento e auto-estima.””

Por isso é importante que a população seja criadora de cultura, e não mera consumidora. Isso só acontece, segundo Silva, com educação. “”A educação pode facilitar convívios e reconhecimentos culturais, ajudar a flexibilizar visões rígidas do mundo, favorecer a criatividade e a inovação e valorizar as tradições. Além disso, processos de valorização cultural são muito importantes para o reconhecimento de potencialidades individuais e a abertura de novas possibilidades de atuação.””

Diversidade – Costumes, modos de vida, organização social e econômica unem-se às manifestações artísticas quando se refere à cultura de uma comunidade. Para o diretor executivo do Instituto Pensarte, Michel Nicolau, as artes traduzem em símbolos um modo de existência típico. “”Traçando uma análise dos países latino-americanos pelo viés da cultura, nota-se que eles se aproximam de diversas maneiras – todos foram colônias, enfrentam historicamente problemas econômicos, são dependentes de capital estrangeiro e tem hábitos e costumes similares -, mas tratam essas aproximações de modo diferente””, afirma.

Neste sentido, segundo ele, a cultura pode ser fator de integração por aclarar as diferenças, e a arte tem essa capacidade própria, pois aproxima as diferenças dentro de uma linguagem universal. “”Cada país toca sua música, mas todos tocam música. Produzem filmes diferentes, mas são filmes. Com isso, tendo o princípio da diversidade cultural, é possível nos reconhecermos nos países vizinhos, ao mesmo tempo em que definimos nossas identidades nacionais. Integramos sem nos rendermos e, com isso, evoluímos conjuntamente, de modo independente e colaborativo. Aprendemos a respeitar os outros povos, identificar neles nossas angústias e desejos e buscar soluções possíveis para todos.””

Para promover esse intercâmbio, no entanto, Nicolau ressalta que é preciso que se compreenda a cultura como geradora de benefícios mútuos, abrangentes e constantes. “”Evidentemente, esse é um trabalho imenso, pois é necessário que se desmonte toda uma mentalidade contrária existente, que vê cultura como ornamento. Deve-se fixar as ações de intercâmbio artístico sobre o princípio da diversidade cultural e da agregação de variados valores da sociedade, para criar o interesse pela produção do outro e, a partir daí, maior desejo de integração””, explica.

Reciprocidade – Nesse sentido, também é fundamental que os agentes culturais estejam bem preparados para a disseminação da cultura e da arte de seus países. De acordo com Nicolau, porém, isso ainda não tem acontecido. Ele atenta para o fato de que os agentes culturais baseiam suas ações meramente no aspecto comercial. Buscam mercado, e não integração. “”Com isso, não possibilitam o desenvolvimento de processos sistêmicos, que transformem realmente a mentalidade dos povos dos países latino-americanos.””

Para que isso se modifique, ele afirma que é necessário que governos, ONGs e artistas compreendam a urgência e a importância de se investir no intercâmbio cultural e assumam essa tarefa. “”Há o desejo e a boa vontade de muitos, no entanto, além de se levar uma expressão cultural para fora, e antes disso, é preciso que os países tenham interesse em receber a expressão do outro. Sem reciprocidade não há integração, mas sim tentativa de domínio.””

Para Ruy Cezar, do Instituto Cultural Casa Via Magia, os programas de cooperação cultural multilaterais na América Latina ainda estão pouco desenvolvidos, assim como a legislação dos países também precisa avançar para facilitar a circulação de bens culturais. “”A sistematização e distribuição de informações poderão facilitar a troca de experiências, a capacitação e o intercâmbio profissional. Ações neste sentido poderiam fazer parte de um programa compartilhado entre governos, empresas e terceiro setor.””

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