Investidores sociais se articulam para discutir tendências em iniciativas de promoção ao “Desenvolvimento Local”

Por: GIFE| Notícias| 25/05/2015

Com a proposta de identificar e alinhar conceitos sobre “Desenvolvimento Local” e construir uma agenda colaborativa sobre o tema, cerca de 35 investidores sociais, associados ao GIFE, participaram no dia 18 de maio, em São Paulo, do primeiro encontro do ano da Rede Temática em Desenvolvimento Local.

Claudia Calais, diretora da Fundação Bunge – instituição que ajuda na coordenação da Rede Temática –, abriu o encontro ressaltando aos presentes o quanto o tema do “desenvolvimento local” tem se tornado uma agenda cada vez mais estratégica no contexto atual, em que se aponta a importância do alinhamento do investimento social privado com o negócio das empresas mantedoras. “O nosso desafio é olhar para frente neste cenário e trazer a discussão para as empresas, pois a conexão é importante. Por isso, esse espaço da Rede é essencial para termos, de fato, um local de troca de experiências e pensar em ações conjuntas”, disse.

Na primeira parte do encontro, os participantes da Rede Temática puderam conhecer duas experiências que trabalham com a temática, como a iniciativa IDLocal – do Programa de Desenvolvimento Local do Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVces) da Fundação Getúlio Vargas, e também o conceito de Comunidades Sustentáveis da RedEAmérica, uma rede criada em 2002, que reúne 80 membros de 11 países.

Lívia Menezes Pagotto, gestora do IDLocal destacou que o Programa de Desenvolvimento Local foi fundado em 2006 na FGV, como a primeira experiência social do centro de estudos, englobando duas grandes frentes: projetos em campo e articulação empresarial.

Em relação a projetos em campo, a gestora destacou a experiência em Juriti (Pará), realizada em 2005/2006 a pedido da Alcoa, que iria inaugurar uma nova mina no local e queria fazer algo para além do licenciamento ambiental, tendo em vista os impactos do empreendimento na cidade, que contava com 35 mil habitantes em mil quilômetros de extensão.

A partir dessa experiência, foi lançada em 2008 a publicação Juriti Sustentável – proposta de modelo de intervenção, inspirada na agenda 21. O modelo de intervenção pressupôs um tripé para a agenda de desenvolvimento local, com a criação de um fundo de desenvolvimento local, assim como indicadores de desenvolimento sustentável e um conselho local. Todo o processo foi construído em conjunto com os diversos atores locais.

Outra experiência do centro foi promovida entre 2009 e 2011, na Usina Hidrelétrica de Jiraú, em Rondônia. A proposta foi pensar em um modelo de desenvolvimento local a partir das características econômicas de uma região distante 150 km da sede do município Porto Velho. Foi possível perceber que a vocação do local não era se tornar pólo logístico, como se pensada inicialmente, mas ter uma economia baseada no capital natural: Modelo de Pólo de Desenvolvimento Nova Mutum.

E, por fim, um novo projeto do centro está sendo desenvolvido no Plano Regional do Xingú. No local, o GVces desenhou uma proposta de monitoramento da efetividade das seis condicionantes estabelecidas localmente, a fim de verificar o que está sendo feito e com qual qualidade.

Segundo Livia, a partir destas experiências, o GVces identificou alguns pontos primordiais na implementação de estratégias de desenvolvimento local, como a importância de se fazer a aferição do recorte territorial, verificando se os impactos extrapolam ou se restringem para além das fronteiras administrativas; promover um diálogo próximo com a realidade, se aproximando das pessoas, políticas públicas e outras empresas que estão no território; definir a governça e o financiamento das iniciativas, ou seja, criar mecanismos de como os recursos serão administrados; e internalizar estas propostas dentro da própria empresa/fundação, a fim de que as demais áreas, como logística, compras, comunicação etc também se apropriem dos conceitos e práticas.

“Além disso, algumas ferramentas são fundamentais para que esse processo aconteça com eficiência e eficácia, como a articulação com as políticas públicas; a criação de espaços de articulação e informação pública; a definição de indicadores para monitoramneto do desenvolvimento; e o estabelecimento de fundo de desenvolvimento”, comentou Livia.

Já em relação ao IDLocal, que faz a articulação com o setor empresarial, o GVES lançou uma publicação a partir da experiência com a Childhood Brasil, sobre a “Geração de Valor Compartilhado a partir da Proteção Integral de Crianças e Adolescentes” e, em breve, irá lançar uma nova publicação chamada “Inovação em desenvolvimento local””, que traz dez casos de iniciativas, entre elas a da Fundação Bunge.

“Nessas iniciativas, também percebemos quais são os entraves existentes. Entre eles estão: a capacidade institucional dos municípios; o descompasso do tempo das empresas, com a agenda do licenciamento, por exemplo; as dificuldades em se fazer articulações locais pela falta de capital social; e a visão muitas vezes da comunidade sobre a empresa como um ‘balcão de atendimento’”, pontuou.

Novos conceitos e práticas

Durante o encontro, Margareth Flores, diretora da RedEAmérica, apresentou também a trajetória da Rede e as mudanças de foco pelas quais a atuação dos participantes foi tendo ao longo do tempo, iniciando-se num trabalho para o fortalecimento das organizações de base, passando pela questão do desenvolvimento local e, agora, discutindo o conceito de “comunidades sustentáveis”, numa perspectiva de contribuir com o desenvolvimento sustentável a partir de uma visão mais territorial.

Para a RedEAmérica, comunidade sustentável é aquela que constrói seu território buscando o equilíbrio entre os aspectos econômico, ambiental e social e trabalham na perspectiva de longo prazo.

“O território é o cenário porque é onde acontecem as transformações, espaços de participação com a construção de visões e soluções. Além disso, é o espaço para as articulações entre os atores – poder público, empresas e organizações da sociedade civil e os líderes dessa comunidade. Assim, a empresa é um ator integrado e não externo. É preciso lembrar que as empresas deixam uma marca no território – positiva ou negativa – e são afetadas pela realidade desse territórios. Elas compram, vendem, empregam e podem contribuir ou não para o desenvolvimento. Por isso, se operam num ambiente saudável, que a comunidade tem mais prosperidade, a empresa tem maiores possibilidades de seu negócio ter mais sucesso. A sustentabilidade da empresa passa pela sustentabilidade do território. Há uma interdependência”, enfatizou Margareth.

Segundo a diretora da RedEAmérica, para que essas “comunidades sejam sustentáveis” é preciso criar estratégias de empoderamento e formação das capacidades para ter mais equidade de participação dos diversos atores locais; criar um ambiente favorável para a institucionalização desta participação comunitária; e fortalecer uma gestão pública democrática, transparente e inclusiva dos processos.

“O processo participativo é essencial para que sejam identificados problemas e soluções na contrução de acordos. E isso pressupõe o reconhecimento de talentos locais, potenciais, capacidades e o respeito à história e a cultura local”, pontuou, destacando a importância de se criar relações de confiança e responsabilidades compartilhadas, além de compromissos mútuos por meio de acordos.

Nesse processo de fortalecimento de comunidades sustentáveis, o setor empresarial pode atuar de diversas formas, ressaltou Margareth. Entre elas está o co-financiamento de iniciativas, no incentivo à criação de espaços participativos, no estímulo à geração de vínculos e alianças para ter maior escala e impacto. “As empresas podem contribuir envolvendo sua cadeia de valor, transferindo capacidades, mobilizando voluntários, direcionando o investimento social em iniciativas locais, facilitando contatos, promovendo inovação e contratando talentos locais”, ressaltou Margareth.

De acordo com diretora da RedEAmérica, os exemplos mostram que o retorno é muito positivo para quem atua nessa perspectiva. Entre os ganhos está a melhoria na reputação junto à comunidade, o acesso preferente a recursos, a facilitação em processos de aprovação e ajuda para resolução de conflitos locais, a redução de custos de suspensão de operações e a permanência e compromisso da mão-de-obra local.

Desafios e entraves

As palestrantes apontaram ainda alguns entraves nas iniciativas de intervenção local, como a postura de algumas empresas em chegarem aos territórios como alguém que detém todo o conhecimento. Frente a isso, Margareth apontou a necessidade das instituições em ouvir mais a comunidade e entender de que são apenas mais um ator local. É preciso, assim, respeitar a comunidade e estabelecer um diálogo mais aberto e transparente.

Outro ponto desafiador trazido pelos participantes da Rede Temática foi em relação ao empoderamento da comunidade e o envolvimento dos atores locais nas iniciativas. Mais uma vez, a diretora da RedEAmérica pontuou a necessidade de se reconhecer a dinâmica local, a cultura e os interesses das pessoas que vivem naquele território. “O diagnóstico tem que ir muito além dos indicadores. É preciso compreender o que está acontecendo. Além disso, o fortalecimento dessa participação virá com o processo. É preciso ter habilidade para identificar o perfil dessa população e utilizar técnicas adequadas para que se envolvam”, comentou Margareth.

“A empresa não pode chegar com pacotes prontos no território. É preciso ouvir com sensibilidade as demandas locais e, se for o caso, mudar as estratégias e incluir outras coisas que as demais experiências anteriores não trouxeram ainda”, completou Livia.

Em relação ao envolvimento com o setor público, segundo as palestrantes, é preciso engajar o poder público mais próximo, que tem mais capacidade de decidir sobre o território, e pensar também em atores mais estratégicos, dependendo do foco da iniciativa. Na opinião de Margareth, mais do que apenas estabelecer um relacionamento com o poder público, é preciso também fortalecer a cidadania para controlar e saber cobrar os governos de novas práticas.

A partir de uma discussão em grupo, os participantes da Rede Temática também identificaram alguns desafios a serem superados, além dos já apontados pelas palestrantes. Entre eles estão: como conseguir trazer as problemáticas da ponta para a empresa? Como tornar tangíveis as questões qualitativas dos territórios? Como lidar com a rotatividade da gestão pública? Como conseguir trabalhar com egos de diferentes atores? Como definir indicadores e mensurar o impacto?

Próximos passos

Para ajudar o grupo a trazer respostas a estes desafios e colaborar com as práticas de investimento social, os presentes discutiram também o que esperam da Rede Temática para o ano de 2015. Várias sugestões e ideias foram apresentadas, como a possibilidade de realização de workshops sobre temas
de interesse, construção de um banco de melhores práticas, estabelecimento de encontros de debates com diversos atores, disseminação de conhecimentos sobre o tema, entre outros.

O grupo pretende promover mais três encontros ao longo do ano. Os interessados em participar podem entrar em contato com a área de Relacionamento do GIFE.

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