IV Simaf: simpósio vem fortalecer e difundir benefícios do acolhimento familiar

Por: Fundação FEAC| Notícias| 10/04/2023
IV Simpósio Internacional de Acolhimento Familiar (SIMAF)

Em Campinas, 380 crianças e adolescentes vivem hoje em abrigos institucionais do município e apenas 22 estão em famílias acolhedoras

Entre os dias 20 e 23 de março, Campinas tornou-se a capital mundial do acolhimento familiar, reunindo especialistas de todo o Brasil e de outros seis países em um grande encontro sobre esta modalidade de atendimento a crianças e adolescentes em medida protetiva. O IV Simpósio Internacional de Acolhimento Familiar (SIMAF), sediado no Centro de Convenções da Unicamp, foi concebido com uma nobre missão: difundir e aprofundar o debate sobre acolhimento familiar.

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Para isso, a programação dos cinco dias de evento envolveu 70 palestrantes, mais de 800 participantes e a apresentação de 100 trabalhos de pesquisa, além de mesas de debates e minicursos. O Simaf foi organizado pelo Observatório da Infância e Adolescência (OiA), do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas da Unicamp (Nepp/Cocen), e pelo Instituto Geração Amanhã, com patrocínio do Governo Federal, Governo Estadual de Campinas, Prefeitura Municipal de Campinas, Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, Fundação FEAC e Aldeias Infantis SOS.

FEAC: apoio e participação em mesa com mães acolhedoras

Boa parte do público que foi ao evento era formado por profissionais da área de assistência social, da psicologia, do judiciário e representantes de organizações de diversos estados brasileiros, especializadas em acolhimento familiar.

Para a assistente social Juliana Di Thomazo, coordenadora do Programa Acolhimento Afetivo, da Fundação FEAC, o simpósio chega ao Brasil em um ótimo momento. “O evento reforça a mobilização que vem ocorrendo em municípios que já adotam essa medida de acolhimento no país e traz novas ideias e caminhos possíveis para encorajar os que ainda não a implementaram. Hoje se sabe que o acolhimento familiar é a melhor opção para o desenvolvimento da criança que não está sob os cuidados parentais”, diz Juliana, que participou do simpósio e integrou algumas mesas de debates sobre o tema.

A medida está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e foi atestada por diversos estudos no campo da neurociência e também por décadas de experiência empírica como preferencial e mais benéfica ao desenvolvimento das crianças do que o acolhimento em abrigos institucionais. Porém, no Brasil, apenas 7% das 30 mil crianças acolhidas recebem este atendimento. Nos EUA ou Espanha, o cenário é inverso: só uma pequena parcela de crianças e adolescente está em instituições.

“As experiências internacionais nos ajudam a vislumbrar o futuro, nos dão um norte, sinalizam onde podemos chegar”, diz Juliana, apontando que um dos obstáculos que o Brasil tem a enfrentar é a previsão orçamentária para a implementação do serviço. “Há uma consciência de que a família acolhedora precisa ser muito bem-preparada e receber recurso e subsídio adequados, que estejam à altura da complexidade do caso com o qual se está lidando, porque são sempre casos complexos. Nenhuma criança é retirada da família por qualquer coisa, mas por muita coisa. São crianças que têm em sua história uma quantidade de vivências de situações adversas muito grande”, afirma.

Subsídios, família extensa e mães acolhedoras

A psicóloga e professora da Universidade de Barcelona, Marte Montserrat, apresentou o modelo de acolhimento adotado na Espanha. No país, o serviço contempla diferentes categorias de famílias acolhedoras e subsídios medidos pelo nível de complexidade dos acolhimentos. Com 13 anos de experiência na área de proteção à criança e ao adolescente na prefeitura de Barcelona, Montserrat diz que reciclagem e educação continuada são premissas básicas para o trabalho dar bons resultados.

“Em duas décadas de atuação no serviço vi modelos de trabalho sendo reformulados com frequência para atender a especificidades, singularidades de cada indivíduo acolhido. Estudos e pesquisas continuadas são primordiais”, enfatiza a especialista, que é doutora em psicologia pela Universidade de Girona.

Na Espanha, que já tem um serviço muito bem estruturado há algumas décadas, existe a categoria da família acolhedora especializada, formada por pais profissionais da área, para casos que exigem um atendimento especializado. A remuneração destas famílias na Espanha chega ao equivalente a R$ 8 mil por mês. No Brasil, o subsídio pago às famílias atualmente é de um salário-mínimo por criança, cerca de R$ 1,2 mil.

A possibilidade, que já é realidade em alguns países, do acolhimento em família extensa, ou seja, por outros membros da família, também foi abordada no simpósio. No Brasil, embora isso seja muito comum, não está regulamentado em todo o país como acolhimento familiar, ou seja, o familiar não tem acesso ao programa e ao benefício financeiro.

Uma das experiências apresentadas no simpósio é resultado do trabalho da Associação de Apoio à Criança em Risco (Acer Brasil), de Diadema, em São Paulo. Nestes casos, a remuneração vai para o familiar responsável pelo cuidado com a criança, chamado de Família Guardiã, assim como o suporte socioemocional e assistencial. O modelo apresenta bons índices de retorno da criança ao lar da família de origem.

Acolhimento em Campinas

Um levantamento da prefeitura de Campinas, realizado neste mês de março, revelou que 380 crianças e adolescentes vivem hoje em abrigos institucionais do município e apenas 22 estão em famílias acolhedoras. Para a assistente social Jane Valente, coordenadora-geral do simpósio e uma das principais referências no assunto no Brasil, as famílias acolhedoras funcionam como uma ponte importante para adaptação, cuidado e reintegração das crianças e adolescentes atendidos.

“Os estudos comprovam hoje que a instituição não é o melhor modelo para uma criança. O ECA foi revisto em 2010 para incluir o artigo que diz que, preferencialmente, uma criança em medida protetiva deve estar numa família acolhedora”, afirmou. O serviço de acolhimento é destinado a qualquer criança ou adolescente que tenha sido afastado do convívio familiar, seja por medida de proteção, situação de abandono ou pela família estar temporariamente impossibilitada de cumprir funções de cuidado e proteção.

A família acolhedora fornece lar temporário pelo período máximo de 18 meses, até que a família de origem esteja em condições de receber os filhos de volta ou até que sejam adotados por outra família. “Qualquer formato de família pode se candidatar. Solteiro, viúvo, casado, casal homoafetivo, não importa o modelo. O que importa é a formação pela qual a família vai passar e se ela tem condição de proteger e cuidar de uma criança”, diz Jane.

Órfãos da Covid-19

No mundo todo, mais de 5 milhões de crianças e adolescentes perderam um de seus pais para o coronavírus, segundo estimativa de um estudo realizado pelo Imperial College de Londres, e divulgado em 2022. No Brasil, a ferramenta desenvolvida pelo estudo mostra que 168.500 crianças perderam o pai ou a mãe, desde o início da pandemia até outubro de 2022.

Já dados disponibilizados pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), divulgados no ano passado, apontam que 12.211 crianças de até seis anos de idade ficaram órfãs no Brasil entre março de 2020 e setembro de 2021, com os estados de São Paulo, Goiás, Rio de Janeiro, Ceará e Paraná liderando a lista. Ainda não se tem dados precisos do impacto destes números no Sistema Nacional de Acolhimento Familiar porque em muitos destes casos os órfãos foram acolhidos por integrantes da própria família.

A perda de um ente familiar direto, como pai, mãe ou cuidadores da família extensa têm claro impacto emocional, social e financeiro na vida dos filhos. “Devido aos protocolos de isolamento da pandemia, muitas crianças não tiveram como se despedir corretamente de seus pais, e isso prejudica a elaboração do luto, e consequentemente a saúde mental. Para quem fica, há ainda todo o estresse da adaptação à nova realidade junto a seus novos cuidadores”, destaca a psicóloga brasileira radicada nos EUA, Cristina Peixoto, uma das palestrantes do Simaf. Além da carência de estrutura, referência e apoio que essas perdas causam, isso também pode afetar a renda familiar e consequentemente as condições de saúde e alimentação, especialmente nas famílias mais pobres.

Cristina destaca a importância de se fortalecer o relacionamento dessas crianças e adolescentes com seus parentes, seja os que moram perto, seja os que vivem mais afastados, através de videochamadas, por exemplo. Isso amplia a rede de cuidado e acolhimento que será percebida e sentida por essa criança.

Saiba o que é necessário para ser uma família acolhedora

Campinas possui dois serviços de acolhimento familiar, o Serviço de Acolhimento e Proteção Especial à Criança e ao Adolescente (Sapeca) e o Conviver, cada um com capacidade para atender 20 crianças e adolescentes. São 21 famílias acolhedoras cadastradas no total, segundo a prefeitura.

Passo a passo:

  1. Entrar em contato com qualquer dos dois serviços e realizar cadastro. 
  2. Participar de entrevista com a equipe técnica para avaliação
  3. Caso a família permaneça interessada em participar, deverá comparecer a encontros de formação.
  4. Atender a todos os pré-requisitos.

Requisitos para participar do serviço:

  • Residir no município de Campinas
  • Ter maioridade legal
  • Ter a aceitação de todo o grupo familiar com a proposta de acolhimento
  • Não apresentar problemas psiquiátricos, de dependência de substância psicoativas e não estar respondendo a processo judicial
  • Ter disponibilidade para participar do processo de habilitação e das atividades do serviço
  • Não ter interesse em adoção

Serviço

Sapeca: (19) 3256-6067

Conviver: (19) 3772-9699 e (19) 9 9368-1440.

Por Natália Rangel

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