Lideranças divergem sobre doações vinculadas ao FIA

Por: GIFE| Notícias| 28/05/2007

Rodrigo Zavala

Durante o VII Seminário Pró-Conselho, um dos pontos sem qualquer consenso foi o das doações vinculadas aos Fundos para a Infância e Adolescência (FIA). Entre defensores e críticos à prática, mesmo em conversas informais, demonstrou-se um clima de confrontação, refletidas durante as palestras e conferências.

Para entender o que são as doações vinculadas – e seu escrutínio – é preciso conhecer o funcionamento dos Conselhos Municipais pelos Direitos da Criança e do Adolescente. Eles são responsáveis pelo destino dos recursos dos FIAs. Isto é, deliberam sobre qual projeto social será merecedor das dotações feitas por empresas (que podem direcionar 1% do Imposto de Renda devido), pessoas físicas (6% do IR) e pela administração pública (veja legislação vigente).

“”Vincular esses recursos a projetos pré-estabelecidos por alguém ou por alguma empresa é um tiro no pé para os conselhos, além de ser ilegal. Eles perdem muito de sua capacidade deliberativa sobre esses recursos””, afirmou o promotor do Ministério Público de Justiça de Minas Gerais, Márcio Rogério. Segundo ele, os conselhos são os responsáveis pelo direcionamento do investimento, já que possuem uma visão sistêmica das demandas locais.

Para sustentar seu argumento, o promotor disse ainda que são dotações e não doações. Afinal, aos olhos de Rogério, trata-se do dinheiro do erário, dos impostos pagos pelos contribuintes. Nesse contexto, torna-se questionável, na opinião de seus detratores, direcionar recursos para um projeto específico, do conhecimento de quem quer repassar certa quantia.

A opinião é compartilhada pela coordenadora do Instituto C&A, Cristiane Felix. Em sua palestra, realizada no dia 24 de maio, ela mostrou-se contrária à prática – aplicada a cidades como Curitiba, por exemplo – ao afirmar que os conselhos são capazes de demonstrar a aplicabilidade dos recursos, sem a interferência direta de possíveis doadores. “”É mais importante que os conselhos consigam criar formas mais eficientes de diagnósticos e avaliação, do que os doadores ditarem qual é a prioridade””, apresentou.

No entanto, segundo o advogado, especialista em terceiro setor, Eduardo Szazi, no ponto sustentado pelos contrários à doação casada, o dinheiro aportado no FIA seria de propriedade do Estado e, assim, seria “”dotado”” ao fundo, de modo que não caberia ao particular escolher o seu destino, já que esse particular não era o proprietário do dinheiro quando fez o aporte ao fundo.

“”Se fosse, de fato, dotação, a União Federal repassaria diretamente os recursos para cada fundo dos direitos, pois, afinal, os recursos seriam advindos do imposto de renda. Não haveria porque adotar o uso aleatório de um particular para escolher se, quando, quanto e para onde seriam destinados os recursos””, defende.

Ele agrega também que o artigo 260 do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) dispõe que o contribuinte pode deduzir do imposto devido a doação que fizer aos fundos. Portanto, a própria lei reconhece que é uma doação. “”E isso é óbvio; o particular escolhe se, quando, quanto e para que fundo doará seu dinheiro. Depois, poderá deduzir a doação do seu imposto. Há, então, dois atos seqüenciados: a doação e a dedução.””

Bastante crítico, Szazi diz que argumentos como os do promotor Márcio Rogério podem, na verdade, esconder um fato: “”o conselho quer deter o poder de administrar o dinheiro e, assim, no melhor dos cenários, concentrar para si o atendimento da causa da infância e adolescência, contrariando, assim, o próprio ECA, que dá à família, à comunidade, à sociedade em geral e ao Poder Público o dever de assegurar os seus direitos. No pior dos cenários, teremos o clientelismo e o uso fisiológico/eleitoreiro dos recursos, sem contar os crimes no uso do dinheiro””.

Falta de informações – O discurso dos detratores da vinculação, no entanto, ganha novos contornos quando se vê o contexto. Enquanto se fala da “”soberania”” dos conselhos, não deixa de ser relevante o que o promotor Márcio Rogério comenta sobre pesquisas oficiais a respeito da eficácia dos conselhos pelo Brasil: 80% deles não têm qualquer diagnóstico sobre as demandas locais. “”Eles não têm as informações mais básicas sobre a sua missão elementar””, criticou, durante a sétima edição do seminário.

Mesmo Cristiane, que apresentou projetos sociais de sucesso do instituto, não deixou de falar como a avaliação e o impacto são importantes para o êxito das iniciativas sociais. Acompanhamento que, no fim, ainda não são apresentados pelos conselhos.

Assim, a questão que fica é: como essas instâncias podem ser absolutas se ainda estão em uma fase de aprimoramento? Mais: se eles são os responsáveis pela aprovação do projeto ou iniciativa, cujo o recurso será investido, por que não deixar o doador protagonista de sua própria dotação? “”Quem investe deve ter escolhas. Você pode investir em um conselho envolvido em uma comunidade, que conheça as demandas locais ou em uma organização social com o mesmo diagnóstico, desde que aprovada por esse mesmo conselho””, afirmou a superintendente da Fundação Itaú Social, Ana Beatriz Patrício.

A coordenadora da Frente de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Minas Gerias, Marilene Cruz, embora crítica às dotações vinculadas, argumentou que a hipótese mais salutar para resolver a questão encontra-se nas decisões dos próprios conselhos. “”Eles podem, por meio de diagnósticos locais, diagnosticar prioridades. Caso seja educação, por exemplo, os doadores (incluindo governos) direcionarão os recursos a projetos pré-aprovados nessa área.””

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