Maioria dos professores brasileiros não navega na internet nem usa correio eletrônico

Por: GIFE| Notícias| 21/06/2004

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

ALEXANDRE DA ROCHA
Subeditor do redeGIFE

O computador e a internet são hoje importantes ferramentas para auxiliar na educação de crianças e jovens. Apesar disso, a maioria dos professores brasileiros não usa correio eletrônico (59,6%), não navega na internet (58,4%) nem se diverte com seu computador (53,9%).

Esses dados, que mostram uma oportunidade de atuação para os investidores sociais privados, foram revelados pela pesquisa O Perfil dos Professores Brasileiros: o que fazem, o que pensam, o que almejam…, realizada pela Unesco, em parceria com o Instituto Paulo Montenegro, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) e o Ministério da Educação, e publicada pela Editora Moderna. O levantamento identificou que as condições de trabalho e a situação social dos docentes devem ser urgentemente melhoradas.

Foram entrevistados 5.000 profissionais do ensino fundamental e médio de escolas públicas e particulares dos 27 estados brasileiros. Os dados sobre uso da internet fazem parte do item “”Participação dos professores em eventos e atividades culturais””, do capítulo “”Perfil dos Professores””, e traz também números sobre freqüência a museus e teatros, participação em seminários de especialização, leitura de jornais e revistas e preferências culturais, entre outros. A pesquisa completa pode ser comprada pelo site da Unesco (www.unesco.org.br).

Para Sérgio Mindlin, diretor-presidente da Fundação Telefônica – que atua nas áreas de educação e inclusão digital -, a situação poderia ser pior. “”As informações são muito alentadoras, se comparadas com os dados da população brasileira. Sabe-se que não mais de 10% têm acesso à internet e ao e-mail. Portanto, se cerca de 40% dos professores usam correio eletrônico e navegam na rede mundial de computadores, vê-se que é um grupo diferenciado.””

Por que os outros 60% não usam? Para Mindlin, entre os principais obstáculos estão o custo do computador para compra individual, o ainda baixo número de escolas que têm salas de informática e o acesso restrito a esses espaços, quando existem. Mas o mais importante é a falta de uma capacitação inicial para que os docentes percam o medo da tecnologia e usem as ferramentas disponíveis.

O site EducaRede (www.educarede.org.br) tem como objetivo quebrar o gelo entre os professores e a tecnologia. Iniciativa da Fundação Telefônica, do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), da Fundação Vanzolini e do provedor Terra, ele leva os docentes que nunca utilizaram a internet e o correio eletrônico a utilizá-los na preparação de suas aulas.

Entre os serviços oferecidos estão treinamentos pela internet, material de apoio para projetos educacionais, indicações de sites da área, fórum de debates, intercâmbio entre escolas, notícias, dicas de utilização do computador (glossário de termos, segurança, operação de softwares etc.) e uma biblioteca com dezenas de títulos eletrônicos.

“”Uma oficina de quatro horas de duração, como O EducaRede vai à Escola, é suficiente para estimular o uso. Verificamos que professores que passaram por essa oficina continuam usando o portal meses após a realização. Em paralelo, as questões de infra-estrutura devem ser resolvidas, preferencialmente, no espaço da própria escola, com investimento público em computadores e conexão à internet””, afirma Mindlin.

Formação – De acordo com a pesquisa da Unesco, os professores enxergam a educação principalmente para formar cidadãos conscientes (72,2%) e desenvolver a criatividade e o espírito crítico (60,5%). “”O pressuposto da educação para o desenvolvimento da cidadania se instala com muita força a partir dos anos 80 e aparece como recomendação nas orientações em documentos oficiais a partir dessa época, como é o caso da Proposta Curricular para o Ensino Fundamental, de 1985, e dos Parâmetros Curriculares Nacionais, elaborados de 1997 a 2002″”, comentam Maria do Carmo Brant de Carvalho, coordenadora geral do Cenpec, e a pedagoga Maria Amábile, que atuou na gestão nacional da política de educação entre 1995 e 2003.

Porém, no que diz respeito às práticas pedagógicas vivenciadas na maioria das escolas, ainda predominam modelos tradicionais, o que evidencia uma certa contradição entre o que se deseja e o que se realiza. Não é por acaso que uma das recomendações da pesquisa da Unesco é investir na valorização e na formação continuada dos professores.

“”Uma análise crítica dos resultados do Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), por exemplo, nos mostra que, na média, os alunos brasileiros mal sabem ler, escrever e fazer as quatro operações matemáticas, condições básicas para se chegar às finalidades declaradas pelos professores. Isto se deve à baixa qualidade do ensino, que não só parece ser insuficiente para desenvolver as habilidades mais básicas nos alunos, como também dificilmente consegue desafiá-los o suficientemente para desenvolver a consciência crítica e a criatividade””, avalia Ilona Becskeházy, diretora executiva da Fundação Lemann e conselheira do GIFE.

Muitas empresas, institutos e fundações já trabalham para reverter este quadro, promovendo reconhecimento público dos docentes que se dedicam a criar experiências inovadoras dentro da sala de aula, como é o caso do Prêmio Professor Nota 10, da Fundação Victor Civita, do Prêmio Incentivo à Educação Fundamental, da Fundação Bunge, e do Prêmio Qualidade na Educação Infantil, da Fundação Orsa, entre outros. Além disso, um grande número de organizações do terceiro setor investe em programas para formação continuada. Na rede GIFE, por exemplo, 42% dos associados desenvolvem programas e projetos voltados para os professores.

“”É fundamental continuar a propor políticas educacionais que atinjam os docentes em larga escala e que promovam seu desenvolvimento profissional, instrumentalizado-os para construírem, na prática, aquilo que está claro na mente e no desejo de muitos””, afirmam Maria do Carmo e Maria Amábile.

Ambiente de trabalho – De um modo geral, os professores concordam com as idéias de aumentar o tempo e as possibilidades de trabalho em equipe com outros colegas, tanto em sala de aula como fora dela (87,6%), e favorecer a concentração da carga horária dos docentes em apenas um estabelecimento (86,7%).

Para Maria do Carmo e Maria Amábile, as reivindicações apresentadas são históricas e muitas delas já estão contempladas nos planos de carreira e salário. Elas citam o exemplo da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, onde há jornadas de 36 horas semanais distribuídas em 25 horas de trabalho com alunos e 11 horas de trabalho pedagógico coletivo.

Elas ressaltam a importância da integração do trabalho pedagógico coletivo na rotina dos professores. “”Muitas vezes a ausência de propostas consistentes acabam por minar o interesse dos docentes. Com isto, o pagamento que recebem passa a ser interpretado com um adicional no salário e não um compromisso a ser cumprido. Nessas condições, muitos professores assumem outras atividades profissionais, sobrecarregando suas jornadas de trabalho””, afirma.

Mesmo diante de tantas dificuldades, os professores não pensam em abandonar a carreira. Segundo a pesquisa da Unesco, apenas 10,7% declaram ter a intenção de se dedicar a outra profissão. Mais da metade (50,2%) declara que sua principal aspiração profissional para os próximos anos é permanecer na função atual, na mesma ou em outra instituição de ensino.

Para Maria do Carmo e Maria Amábile, isso se dá por vários fatores. Entre eles, elas citam a estabilidade, já que a maioria dos professores atua na rede pública de ensino e é efetivada por meio de concursos, e o fato de grande parte dos docentes ser formada por mulheres. “”A flexibilidade na jornada de trabalho, de três ou quatro horas diárias que podem ser pela manhã, tarde ou noite, favorece conciliar a vida profissional com a pessoal.””

Mas elas destacam o fator mais importante: a formação essencialmente humanista dos professores. “”Isso os leva a cultivarem princípios de valorização do ser humano. Valores éticos e ideais de poderem contribuir com a formação digna da conduta humana que, por sua vez, são princípios e valores que estão na base da educação escolar.””

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