Mais que acesso à Internet, inclusão digital deve ser instrumento para o exercício da cidadania

Por: GIFE| Notícias| 29/03/2004

MÔNICA HERCULANO
Repórter do redeGIFE

No último dia 17 de março, a Fundação Bradesco e a Microsoft Brasil assinaram um convênio para a criação de 15 Centros de Inclusão Digital (CIDs) em diversas cidades brasileiras. O projeto marca uma nova fase da parceria, que já existe desde 1999, buscando ampliar a abrangência das ações pela inclusão digital desenvolvidas pelas duas organizações.

A Microsoft doou US$ 150 mil em dinheiro e licenças de software para o treinamento e acesso à tecnologia da informação de comunidades menos favorecidas onde atua a Fundação Bradesco, responsável pela instalação dos laboratórios. A administração dos CIDs ficará por conta de voluntários, orientados pela organização, e alunos do ensino médio oferecerão monitoria para a realização das atividades.

O objetivo é criar um espaço, junto com entidades comunitárias já estabelecidas, para oferecer formação básica em informática e acesso a serviços públicos pela Internet. Também será valorizada a cidadania, ao se desenvolver iniciativas para aplicação de tecnologia na busca de soluções para dificuldades locais e ao criar comunidades virtuais para discussão de problemas sociais.

De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apenas 12,6% dos domicílios brasileiros possuem computador. Com relação ao acesso à Internet, o número cai para 8,6%. Além de aumentar esse acesso, no entanto, é necessário trabalhar para que a utilização das tecnologias de informação seja meio de inclusão social, circulação do conhecimento e promoção da democracia.

“”A inclusão digital é um meio de promover e articular a participação das comunidades de carência socioeconômica na busca de soluções aos problemas sociais locais. A internet propicia o canal de comunicação necessário para articular o movimento, colocando em contato diferentes realidades sociais, mas com o mesmo objetivo de propiciar a melhoria da mobilidade social””, explica Nivaldo Marcuso, gerente da área de tecnologia da Fundação Bradesco.

Exemplos – Diversas outras organizações também estão percebendo isso e vêm criando e apoiando iniciativas de inclusão digital no sentido de tornar a população protagonista de soluções para os problemas locais. As fundações CSN, Telefônica e Vale do Rio Doce e o Instituto Telemar são exemplos de desenvolvimento de projetos próprios ou apoio a iniciativas como as Escolas de Informática e Cidadania (EICs), do Comitê para o Desenvolvimento da Informática (CDI). No último sábado (27/3), o CDI promoveu o Dia da Inclusão Digital 2004 em 28 cidades brasileiras, para levar a mais pessoas o conceito de inclusão digital como instrumento de construção e exercício da cidadania.

A Rits (Rede de Informações para o Terceiro Setor) lançou, em dezembro do ano passado, o site do Observatório de Políticas Públicas de Infoinclusão (www.infoinclusao.org.br). A iniciativa tem o apoio da Fundação Ford e do Centro Internacional de Pesquisa para o Desenvolvimento (IDRC) e traz informações sobre projetos de infoinclusão, telecentros comunitários e políticas públicas de inclusão digital e universalização do acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) no país. O objetivo é estimular a participação da sociedade civil na formulação, implementação e no acompanhamento dessas políticas.

Segundo a diretora de Informação e Comunicação da Rits, Graciela Selaimen, existem experiências pontuais de que o Brasil tem avançado com relação ao desenvolvimento de políticas públicas pela infoinclusão. “”São Paulo e Porto Alegre são exemplos de parceria entre o governo e organizações da sociedade civil que mostraram o quanto este tipo de iniciativa pode ser rica e produtiva. Resta transformar este modelo numa política pública em nível nacional.””

Ela refere-se aos telecentros – locais de acesso público e gratuito a computadores e internet implantados pelas prefeituras de algumas cidades brasileiras – como espaços democráticos de comunicação nos quais se instalam dinâmicas interessantes, que levam ao aumento da auto-estima individual e da comunidade de um modo geral, a partir do acesso à informação, do domínio das ferramentas e da inserção no espaço virtual.

Para Ronaldo Lemos, coordenador de direito e tecnologia da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, o avanço tecnológico pode ser a grande chance de desenvolvimento econômico e de integração cultural e social na América Latina. Ele afirma que experiências como a dos telecentros confirmam que o uso das tecnologias de informação pode contribuir para a democracia e o exercício da cidadania. “”Nesses locais, que funcionam exclusivamente com software livre, os jovens não só se familiarizam com o computador como também passam a produzir conteúdo e código de programação. Essa forma de inclusão social é a única que tem condições de produzir impacto positivo relevante de larga escala a médio-prazo.””

Lemos será palestrante da mesa de debates 2B do 7º Encontro Ibero-Americano do Terceiro Setor, que acontece de 16 a 19 de maio no Hotel Transamérica, em São Paulo. O tema da mesa será “”Conhecimento e comunicação – Produção, propriedade e circulação da informação como instrumentos de democratização, poder e controle social””, e abordará de que forma o controle sobre a produção e a circulação do conhecimento pode ser obstáculo ou contribuir para o exercício pleno e democrático de uma nova cidadania.

Graciela, da Rits, acredita que algumas das diversas maneiras de exercitar a cidadania por meio das tecnologias de informação sejam participar de processos consultivos na internet, acompanhar processos legislativos e participar de campanhas e ações decisórias a partir de informações obtidas na rede. “”O exercício da democracia e da cidadania é impossível sem informação e, nesse sentido, as tecnologias de informação e comunicação fazem uma diferença fundamental. Há espaços na internet voltados para isso, e nosso trabalho diário nos dá provas de que isso é mais que verdadeiro””, afirma.

Paticipação – Há um ano, a operadora de telefonia móvel Vivo assinou contrato de apoio ao projeto de criação de telecentros da prefeitura de São Paulo. O convênio foi fechado por meio do Instituto Brasil Digital (IBD), mantido pela empresa e que desenvolve e apóia projetos nas áreas de educação, meio ambiente, voluntariado, além de iniciativas esportivas, culturais e de saúde.

O primeiro telecentro foi aberto à comunidade em outubro de 2003 e já tem mais de 5.000 usuários cadastrados. Inclui uma biblioteca com 600 livros e também é utilizado para atividades de lazer promovidas pela própria comunidade, como aulas de xadrez e concursos de desenho e poesia. O segundo será inaugurado assim que terminarem as obras de um campo poliesportivo que a Vivo está construindo anexo à unidade. Neste ano, a empresa também deve implantar mais três telecentros, esses com atividades especialmente voltadas para idosos, para portadores de deficiência e sobre saúde pública.

“”No mundo contemporâneo, é indiscutível que inclusão social e acesso ao conhecimento pressupõem acesso à tecnologia. Mas não basta doar computadores. É preciso criar espaços propícios para o aprendizado. As iniciativas da comunidade de Cangaíba (zona leste de São Paulo), por exemplo, servem para ilustrar que os telecentros, além de promoverem a capacitação em informática para a população menos favorecida, podem atuar na formação para a cidadania””, afirma o diretor executivo do Instituto Brasil Digital, Tonico Pereira.

Ele conta que a unidade tende a virar um espaço cultural, à medida que a população, carente de áreas de lazer, busca o local para troca de experiências. “”Nesses encontros, é natural que se formem líderes comunitários e que sejam criadas ações voluntárias, voltadas para a cidadania e a melhoria da qualidade de vida da população local.””

Graciela, da Rits, concorda que as pessoas vão aos telecentros para se informar e, acima de tudo, se comunicar. Porém, ainda há um potencial enorme a ser explorado nesse campo: fazer com que o usuário passe de consumidor a produtor de informação. “”É preciso mostrar às pessoas que o monitor do computador não é como a televisão, pelo qual elas só recebem informações. Ali há um canal para o mundo e há um espaço para sua voz. Estimular a produção de conteúdo local é um grande desafio. Encorajar e estimular as pessoas a se expressarem na internet, vencendo a timidez e a falta de auto-confiança ou de auto-estima, é um trabalho que deve ser assumido por todos os envolvidos em projetos de infoinclusão””, atenta a jornalista.

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