Mobilidade urbana: desafios e oportunidades de inovação para o investimento social privado

Por: GIFE| Notícias| 22/04/2014

O mundo assiste a uma explosão das “megacidades”, aquelas que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), designam aglomerados urbanos com população igual ou superior a 10 milhões de habitantes. Enquanto até 1970 apenas Nova York e Tóquio se enquadravam nessa definição, em 2011 o número de megacidades saltou para 23: 13 na Ásia, quatro na América Latina (Cidade do México, São Paulo, Rio de Janeiro e Buenos Aires), duas na África e apenas duas na Europa e duas na América do Norte.

Esse conjunto de 23 megacidades abriga atualmente cerca de 10% da população mundial. Em 2025, serão 37 megacidades e 13,6% da população mundial. Trata-se de um crescimento extraordinário, em que o número de habitantes das megacidades aumentou dez vezes entre 1970 e 2011, e que deve, ainda segundo a ONU, quase dobrar até 2025.

Diante deste cenário é fato que a mobilidade urbana tornou-se um dos principais desafios das grandes cidades não só no Brasil, mas no mundo. Trata-se de um tema amplo, que vai muito além dos debates sobre o trânsito. Essa discussão envolve questões referentes à história da ocupação dos territórios, ao crescimento econômico e social do país e suas escolhas e políticas públicas. O impacto é direto na qualidade de vida dos cidadãos.

Todas essas questões têm incentivado, cada vez mais, governos, empresas e cidadãos a pensar em novas formas de agir. Mas, para concretizar estas ações, é preciso experimentar e testar modelos mais sustentáveis. Para Marcelo Furtado, diretor do Instituto Arapyaú de Educação e Desenvolvimento Sustentável, é justamente nesse campo, da inovação social, que a área de investimento social privado pode contribuir e muito.

A questão da mobilidade vai dialogar transversalmente com tudo o que já lidamos, como a saúde, por conta da contaminação do ar, com a preservação ambiental, devido às emissões de gases e o planejamento urbano, em decorrência do uso do espaço. Isso tudo dialoga com os dilemas atuais. Se pensarmos no Brasil de 2050, vamos ter de falar de um transporte público e de massa que seja feito de modo ambientalmente correto, socialmente justo e eficiente do ponto de vista econômico. Ou seja, há muito espaço para a tecnologia e a inovação social. E neste campo de experimentação o ISP poderia desempenhar um papel muito importante”, acredita.

Marcelo destaca que essa nova postura do ISP viria ao encontro dos desafios lançados pelo próprio GIFE durante o Congresso de 2014, em que instigou os investidores sociais a pensar na importância de se correr riscos: “Se a gente quer transformar a sociedade tem que arriscar. E, quando pensamos em investimento em cidades, tem muita coisa que sabemos, mas muito também que não sabemos. Ou seja, temos a chance de acertar ou de errar. Por isso, a fala do GIFE convidando os associados a exercitarem o apetite para o risco, de uma maneira visionária, é algo muito importante. E o espaço das cidades é um laboratório maravilho para se fazer isso”, pontua o diretor.

E espaços para promover e incentivar essas iniciativas é o que não faltam, devido aos diversos problemas ainda enfrentados pelas metrópoles brasileiras. Muitos destes desafios estão analisados no “Caderno Mobilidade Urbana”, lançado pela Globo no mês de abril. A iniciativa faz parte do projeto ANDA_SP, que engloba ainda uma campanha para conscientizar pedestres e motoristas no trânsito e um seminário, promovido pelo Globo Universidade, em parceria com a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (SP), no dia 11 de abril, em São Paulo.

Na ocasião, diversos especialistas nacionais e internacionais que assinam os artigos da publicação, estiveram presentes no evento para debater a respeito dessa questão que é essencial para o presente e o futuro das metrópoles.

Beatriz Azeredo, diretora de Responsabilidade Social da Globo, destaca que a publicação é o quarto número da série Cadernos Globo. A proposta das edições é refletir sobre conteúdos gerados a partir das ações presenciais promovidas pela Globo. Já foram temas: Futuro do lixo, Subúrbios e identidades e Realismo mágico no século XXI.

A nossa ideia é sempre trabalhar os temas centrais do jornalismo em vários níveis, tanto com ações externas, como as campanhas, quanto na disseminação de conhecimentos, por meio de seminários e workshops. Neste caso, o jornalismo de São Paulo tem acompanhado de perto a questão das metrópoles e propôs uma série de reportagens sobre o tema para a cidade. Agora, decidimos aprofundar o debate discutindo o assunto em conjunto com especialistas”, comenta a diretora.

Desafios a enfrentar

Regina Meyer, professora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP), destacou em sua palestra no evento que o crescimento de São Paulo foi tão significativo nos últimos anos que discutir a mobilidade urbana se tornou uma questão central. Com base nessa reflexão, a arquiteta e urbanista falou sobre o crescimento acelerado e desordenado das cidades em geral, que subverteu até a lógica da relação entre tempo e espaço.

As distâncias passaram a ser medidas mais pelo tempo que se gasta para ir de um ponto a outro do que propriamente pela distância física”. Regina ainda comentou que diariamente se deslocam para o centro da capital paulista um número de pessoas que equivale à população de países inteiros, como Honduras — que possui 7 milhões de habitantes.

Os pesquisadores Claudio Barbieri e Hugo Yoshizaki no artigo publicado no caderno, explicam que o crescimento econômico no Brasil nos últimos anos, com o aumento do emprego e a redução das taxas de juros, vem permitindo que mais e mais pessoas consigam adquirir automóveis, muitas vezes em busca de mais conforto do que o proporcionado especialmente pelos ônibus, responsáveis por 85% das viagens no transporte público.

A consequência disso tem sido o aumento das viagens por automóvel. Na região metropolitana de São Paulo, elas chegaram a 12,6 milhões por dia em 2012, pouco mais que os 12,5 milhões de deslocamentos por ônibus, segundo pesquisa sobre mobilidade realizada pelo Metrô de São Paulo. Em outras palavras, atualmente mais de uma em cada duas pessoas usa o carro em vez de transporte público.

O reflexo pode ser visto no dia a dia dos cidadãos. Andréa Leal, consultora de políticas públicas do Banco Mundial, apresentou durante o evento um levantamento na cidade de São Paulo que indica que mais de 31% das pessoas que estão dirigindo seus carros estão sozinhas, no horário de pico. Na área da Avenida Berrini, segundo ela, esse número sobe para 53%. “Por este motivo, decidimos realizar uma ação com empresas e funcionários da região pela qual foram apresentadas propostas e soluções para amenizar o problema de tráfego, como o desestímulo ao uso de automóveis”, contou.

A diretora de Responsabilidade Social da Globo, inclusive, disse que a pesquisa apresentada por Andréa motivou novas conversas da empresa com a consultora, a fim de inserir o tema internamente na companhia. “Hoje não temos mais como pensar em sustentabilidade sem discutir mobilidade urbana. Estamos todos nesta mesma agenda”, ressalta.

A busca por soluções

Desestímulo ao uso do automóvel, estímulo ao transporte não motorizado, construção de ciclovias e a integração do uso do solo e transportes. Essas são algumas iniciativas que estão sendo fomentadas em diversas cidades a fim de ajudar a superar os desafios da mobilidade urbana.

Mas, para que elas possam ser efetivas, Marcelo Furtado destaca a importância das ações serem promovidas em conjunto, agregando conhecimentos e recursos de diversos parceiros. Essa é, inclusive, a proposta da Rede Latinoamericana por Cidades e Territórios Justos, Democráticos e Sustentáveis.

Se queremos mesmo criar um setor vibrante de transformação é essencial concentrar um coletivo de recursos. Hoje, vemos a sociedade civil organizada como forte colaboradora no desenho das mudanças e institutos e fundações no apoio ao financiamento destas iniciativas. Precisamos unir isso e dar escala às boas experiências”, ressalta.

De acordo com o diretor do Instituto Arapyaú – apoiador do Programa Cidades Sustentáveis, há um grande nicho de investimento na área de mobilidade urbana e uma intensa mobilização da academia, do setor público e dos próprios cidadãos sobre a urgência em criar soluções para a questão da mobilidade urbana.

No entanto, diante do tamanho dos desafios ainda a serem enfrentados, é preciso investir muito mais. Em sua opinião, mais do que criar soluções únicas para todo o país – que dificilmente serão adequadas a todas as realidades, devido à diversidade do Brasil – o ideal é direcionar os esforços para o universo dos próprios municípios.

Como a cidade faz parte do dia-a-dia dos cidadãos conseguimos dar outro passo, que é tirar as pessoas de certa apatia e transformá-las em agentes também de transformação. Um cidadão que fala: ´Eu posso fazer algo melhor pela minha cidade´, em seguida vai querer fazer algo pelo país e, depois, para o planeta. Começar pela cidade parece ser algo bem vibrante”, pontua.

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