Níveis de intervenção para o desenvolvimento de base

Por: GIFE| Notícias| 17/04/2006

Rodrigo Villar*

A insatisfação geral com os resultados dos modelos de desenvolvimento adotados na América Latina, tal como da persistência da pobreza e do aumento das tensões sociais têm contribuído para que novas vozes se somem na busca de estratégias alternativas de desenvolvimento. Uma delas é sugerida por o prêmio Nobel em Economia, Joseph Stiglitz: adicionar medidas de voz e empoderamento aos usuais fatores de desenvolvimento e combate à pobreza.

Esta é uma idéia que começa a ganhar aceitação nas agências de desenvolvimento, e que há muito tempo tem sido apoiada pelos promotores do desenvolvimento de base. Para estes, o fortalecimento das capacidades de ação coletiva dos cidadãos pobres e a criação de uma ambiente institucional propício que facilite a participação das organizações de base na deliberação pública têm sido parte essencial de suas estratégias de superação da pobreza, exclusão social e aprofundamento da democracia.

A idéia de empoderamento, em uma perspectiva de desenvolvimento de base, requer articular os laços de solidariedade existentes dentro dos grupos excluídos com pontes que os permitam o acesso a recursos disponíveis no resto da sociedade. Nesse sentido, a idéia do empoderamento não se reduz ao desenvolvimento da ação coletiva ilhada e autocentrada das comunidades pobres.

Em uma região com América Latina, onde os recursos estão tão desigualmente distribuídos e as sociedades fragmentadas, uma idéia de desenvolvimento autocentrado apenas contribuirá para a manutenção da pobreza ou, no melhor dos casos, sua eficiente gestão.

A criação de pontes, vínculos, redes sociais, alianças e espaços públicos de convivência é um imperativo para superar a atual fragmentação e desconexão das organizações de base com outros atores sociais. Apesar da importância dessas organizações na vida de pessoas com baixa renda, quase não existe conexão entre elas, as organizações de outros setores sociais e as instituições públicas.

A desconexão contribui para os cidadãos terem pouco acesso e oportunidades de intervenção sobre os recursos sociais e sobre as sociais e sobre as decisões das instituições públicas que afetam a sua vida. Nesse sentido, fortalecer a voz dos pobres e suas organizações tem um efeito limitado na superação da pobreza na democracia, caso não se consiga estabelecer as conexões necessárias entre essas organizações e outros atores sociais.

Um imenso desafio, assim, para pensar em uma perspectiva de desenvolvimento de base em grande escala é a criação de sociedades inclusivas e instituições públicas que facilitem os vínculos entre as organizações de cidadãos pobres com outros atores sociais, Estas instituições permitirão a setores tradicionalmente excluídos, o acesso a recursos, decisões e oportunidades econômicas, sociais e políticas inexistentes em suas comunidades.

Como bem apontou o diretor da Comissão Econômica para a América Latina eo Caribe (CEPAL), José Antonio Ocampo, as forças associativas são requisitos indispensáveis em uma perspectiva de desenvolvimento sustentável e de democratização, mas não são suficientes em si mesmas para quebrar o círculo vicioso da exclusão e pobreza. Para isso, se requer uma administração pública e um sistema econômico coerente com o objetivo da inclusão política e social.

De acordo com as premissas anteriores, a estratégia no desenvolvimento de base é dupla e complementar. Requer não apenas fortalecer a voz dos pobres, mas também melhorar a capacidade da sociedade de ouvi-los. Por um lado trata-se de apoiar a formação das capacidades de ação de coletivas dos pobres e excluídos para que efetivamente possam garantir sua cidadania, estabelecer preferenciais sociais, desenhar seus projetos, participar nos espaços públicos de convivência e definir as formas mais adequadas de vinculação com outras organizações e instituições para a solução de seus problemas sociais.

Por outro lado, é preciso promover a criação de instituições de interesse público, governamentais e não-governamentais, que facilitem, promovam e respondam à ação coletiva dos cidadãos de baixa renda, garantam seus direitos e contribuam para sua articulação e inclusão.

Esses vínculos entre diversos setores e entre instituições e organizações são ainda mais necessárias num momento histórico em que se reconhece que nem os governos, nem as empresas, nem as comunidades têm, por si mesmas, capacidades e recursos para promover o desenvolvimento sustentável e enfrentar os desafios da pobreza. Neste contexto, estão na ordem do dia a construção de pontes entre diversos setores, as alianças intersetoriais orientadas ao bem social, o estabelecimento de espaços públicos de deliberação e negociação entre os diversos atores.

Uma das condições para lograr essas pontes e as relações complementares entre setores é fortalecer, o que hoje se denomina na literatura, o capital social. Este conceito se refere tanto aos elementos estruturais vinculados da ação coletiva (organizações, redes socais e instituições) como a dos elementos cognitivos presentes na dita ação, tais como normas e atitudes de reciprocidade e confiança que facilitam ou dificultem os processos de coordenação, colaboração e manejo de conflitos entre pessoas, organizações e instituições.

O capital social é a variável mediadora que facilita à ação coletiva, mutuamente positiva, em níveis micro e macro, e que contribui para se gerem alianças orientadas ao bem comum entre diferentes setores sociais e entre instituições públicas e sociedade civil organizada.

O capital social, ao facilitar a coordenação, solidariedade e ação coletiva contribui para um melhor aproveitamento de outras formas de capital. Não substitui a necessidade de investimento em outras formas de capital como em infra-estrutura física, ou em educação e capacitação, mas sim as complementa, ao facilitar e potencializar o trabalho coordenado e a confiança entre os atores envolvidos em projetos coletivos.

Como bem sinaliza Robert Putman em seu último livro sobre o tema (Better Together : Restoring the American Community, Simon &Schuster. New York, p.270) “”as estratégias que ignoram o valor das redes sociais poderiam ser menos efetivas na tarefa imediata, menos sustentáveis em largo prazo e menos frutíferas em um sentido amplo.””

Tratando de contribuir com um aporte substancial a esses desafios, um importante grupo de fundações empresariais e empresas, com uma larga tradição em programas de desenvolvimento de base e conscientes dos imensos desafios pelos que passa América Latina, decidiram criar a Rede de Fundações e Ações Empresariais para o Desenvolvimento de Base, a RedEAmérica*.

A iniciativa é uma rede de empresas e fundações empresariais que possuem programas de desenvolvimento de base, financiando e acompanhando projetos de organizações de base. Esta rede conta hoje com 53 membros em 12 países da América Latina. No Brasil, fazem parte da rede a Fundação Acesita, Fundação Belgo-Mineira, Instituto de Cidadania Empresarial, Fundação Odebrecht, Fundação Otacílio Coser, Instituto Hedging Griffo, Instituto Holcim, Fundação Semear, Instituto Arcor, Instituto Camargo Correa, Banco Indusval Multistock e do Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhao

Dentro da organização, se compartilha uma visão e linhas estratégicas de ação em torno ao desenvolvimento de base, mas o volume de programas e opções metodológicas para promover as metas deste tipo de desenvolvimento mais amplo. Essa variedade de aproximações, longe de ser um problema, se constitui na grande riqueza da Rede. O intercâmbio e a sistematização dos diversos modelos de intervenção constituem uma fonte de conhecimento único, tanto para os membros da Rede como para as outras fundações e empresas que trabalham neste campo.

Esta rede procura potencializar o aprendizado sobre as formas mais adequadas de continuar apoiando o fortalecimento das capacidades coletivas das organizações de base e instituições públicas favoráveis a este tipo de desenvolvimento. Igualmente, espera promover esta aproximação entre outras fundações, empresas e agências de desenvolvimento nacional e internacional, e mobilizar novos recursos com essa perspectiva de trabalho.

*Rodrigo Villar é consultor da Fundação Inter-Americana da RedEAmerica e autor de livros como Construír Juntos: Una propuesta para hacer desarrollo de base; Organizaciones de la sociedad civil e incidencia en políticas públicas; El tercer sector en Colombia: Evolución, dimensión y tendencias; Colombia: A diverse nonprofit sector; Defining the Nonprofit Sector: Colombia; la Sociedad Civil y la redefinición de lo público, y Mujer Campesina y Organización Rural en Colombia.

Ele é um dos convidados do 4º Congresso GIFE de Investimento Social, onde participará da mesa de debates Organização da Sociedade Civil, na tarde de quinta-feira, dia 25/05.

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