No Brasil, enquanto algumas redes têm médias inferiores a 50 alunos por docente, outras chegam a ultrapassar 500

Por: Fundação Itaú Social| Notícias| 15/05/2023

No Brasil, quase 20% dos professores dos anos finais do ensino fundamental (do 6o. ao 9o. ano) das redes estaduais de educação trabalham com mais de 400 alunos/ano letivo. E a média de alunos por professor, no país, varia de 11 a 525 estudantes, conforme a rede. Essas informações são públicas e disponibilizadas pelo Censo Escolar 2020. A constatação de tamanha desigualdade entre redes é o ponto central do relatório de política educacional Volume de trabalho dos professores dos anos finais do ensino fundamental – Estudos de caso em redes estaduais e municipais brasileiras, apresentado pela parceria entre a associação Dados para Um Debate Democrático na Educação (D3e), a Fundação Carlos Chagas (FCC) e o Itaú Social. 

Assinado por Gabriela Miranda Moriconi, Nelson Antonio Simão Gimenes, Cláudia Oliveira Pimenta, Andressa Buss Rocha, João Batista Silva dos Santos, Luciana França Leme e Thiago Alves, o material dá continuidade ao estudo lançado em 2021, Volume de trabalho dos professores dos anos finais do Ensino Fundamental – Uma análise comparativa entre Brasil, Estados Unidos, França e Japão. 

O Brasil não dispõe, atualmente, de uma legislação que trate do número máximo de alunos por professor*. Há apenas um parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) que recomenda que esse número não ultrapasse 300. Mas a questão precisa ser colocada no centro do debate sobre valorização da docência e qualidade das condições de trabalho dos educadores. Dados revelam números altos em relação à recomendação do CNE. Quase um terço dos professores brasileiros dos anos finais trabalha com mais de 300 alunos – situação que não ocorre com professores do Japão e dos Estados Unidos. De acordo com a pesquisa anterior, nesses países, os professores podem chegar a ter, no máximo, 280 alunos.

Quando se leva em consideração que a qualidade da educação tem a ver com cada professor conhecer cada estudante, planejar o ensino considerando os conhecimentos prévios deles, avaliar as tarefas, dar devolutivas individuais, entre outras responsabilidades que evidenciam o caráter relacional do trabalho docente, fica evidente a importância de considerar o número total de alunos de cada professor. “Os dados e as informações disponíveis, como Censo Escolar e o Ideb, colocam a melhoria da qualidade educacional no centro do debate. Mas essa melhoria está relacionada, necessariamente, ao volume de trabalho docente. A partir da realidade de cada rede, é preciso mapear, analisar e discutir profundamente esse tema, para que as melhores condições sejam oferecidas ao docente”, diz Antonio Bara Bresolin, diretor executivo do D3e. 

Para desenvolver o estudo, os pesquisadores autores do Relatório se dedicaram à seguinte pergunta: o que faz com que a média de alunos por professor seja relativamente mais alta ou mais baixa nas redes de ensino do Brasil?. Para buscar respostas, selecionaram dez estudos de caso em redes estaduais e municipais com o objetivo de compreender os fatores que contribuem para que os professores dos anos finais do ensino fundamental brasileiro atuem com maiores ou menores números totais de alunos. As redes foram escolhidas, dentre outras características, por terem médias maiores e menores do que a média Brasil e por representarem estados/municípios de diferentes regiões do país e com diferentes realidades, por exemplo em relação à população vivendo em área urbana/rural.

De modo geral, é possível destacar, nas redes investigadas, que o número de turmas e o número total de alunos por professor não são foco de nenhuma política específica. “No entanto, algumas redes já atuaram sobre determinadas condições de trabalho, como limitar o tamanho da jornada e garantir um terço dela para atividades extraclasse”, explica Gabriela Moriconi, uma das autoras do relatório. Tais ações tiveram influência para que a média de turmas dos professores dessas redes fosse mais baixa do que de outras. Essas redes revelaram já ter a percepção de que essas condições estão relacionadas à qualidade do ensino e, portanto, precisam ser tratadas. 

Também merece destaque o fato de que parece não existir um fator principal que explique a média de estudantes por professor de uma rede de ensino: em todas as redes, há uma combinação de fatores que, somados, contribuem para que esse resultado seja maior ou menor. Os pesquisadores também chamam atenção para que, em alguns casos, as características da ocupação do território têm um papel determinante, porque limitam as escolhas das redes sobre ações que afetam o volume de trabalho docente. Por exemplo, alguns municípios apresentam baixo volume de trabalho, pois as escolas ficam distantes umas das outras e concentram poucos alunos. 

Embora as redes de ensino brasileiras estejam localizadas em contextos muito diversos e tenham ambientes institucionais igualmente variados, os autores do Relatório de Política Educacional 

indicam um conjunto de medidas que podem ser adotadas a curto, médio e longo prazos, a fim de contribuir para o alcance de um número total de alunos por professor mais adequado.

Outros destaques

Os estudos de caso ainda revelam: 

Sobre o número de turmas: 

  • Quanto maior a carga horária de trabalho,  maior pode ser o número de aulas e, portanto, de turmas que um professor assume. 
  • Quanto maior o tempo reservado para trabalho extraclasse na jornada, menor o número de aulas e, portanto, de turmas que um professor pode assumir. 
  • Quanto maior a duração das aulas, menor o número de aulas e, por conseguinte, menos turmas podem ser atribuídas a um professor. 
  • Quanto mais aulas por semana são alocadas para um componente curricular (por exemplo, língua portuguesa), menos turmas podem ser atribuídas aos docentes desse componente para completar a carga horária deles em sala de aula. 
  • A depender do modelo de organização das escolas de tempo integral, os professores podem assumir menos turmas que os colegas das escolas de tempo parcial. 
  • Em redes que priorizam a alocação do professor a apenas uma escola, parte da jornada de trabalho reservada à interação com estudantes pode ser alocada para outras atividades além das aulas, possibilitando ao docente assumir menos turmas. 

Sobre o tamanho das turmas: 

  • Se uma rede estabelece limites mínimo e máximo altos para o tamanho das turmas, estas, geralmente, serão de tamanho elevado.
  • Se a rede tiver salas de aula com espaço físico amplo, haverá a possibilidade de alocar elevados números de alunos às turmas. Além disso, se as escolas tiverem salas de aula ou prédios públicos sem uso, haverá a possibilidade de dividir as turmas, reduzindo o seu tamanho.
  • A atuação colaborativa entre a rede estadual e as redes municipais do estado pode promover um melhor atendimento da demanda, favorecendo a observação dos limites para o tamanho das turmas estabelecidos em normativas.
  • Quanto mais dispersa a população pelo território, maior a necessidade de que a rede oferte o ensino em escolas pequenas (com turmas de tamanho reduzido e em pequena quantidade), localizadas com maior distância umas das outras. Além de assumirem poucas e pequenas turmas, essa situação ainda dificulta a atuação docente em mais de uma escola.
  • A possibilidade de atuação em outras etapas amplia o número de turmas disponíveis na rede para alocação do professor.
  • A diminuição da demanda por matrículas na rede pode favorecer a redução do tamanho das turmas e do número de turmas que os professores assumem. No entanto, esse efeito depende da manutenção ou do aumento do quantitativo de profissionais no quadro do magistério.

Sobre as recomendações:

1. Adotar a jornada de trabalho integral como padrão e ter a parcial como opção.

2. Limitar a carga horária de trabalho na rede a 40 horas semanais (incluído nela o

tempo reservado para o trabalho extraclasse).

3. Garantir o uso de pelo menos um terço da jornada para o trabalho extraclasse.

4. Pagar remuneração atrativa (que se aproxime da média das outras ocupações

que requerem o mesmo nível de formação).

5. Concentrar a atuação em apenas uma escola, com papel ampliado.

6. Repensar a organização das matrizes curriculares, considerando a carga atribuída a cada componente e suas consequências para o número de turmas por professor.

7. Garantir turmas nos anos finais do ensino fundamental com, no máximo, 30 alunos.

“Melhorar as condições de trabalho docente é fundamental para alavancar avanços na qualidade da educação, em especial para a etapa dos anos finais do ensino fundamental, do 6º ao 9º ano, que apresenta os indicadores mais desafiadores. É a partir do sexto ano que as taxas de reprovação, repetência e abandono saltam exponencialmente e que o desempenho acadêmico piora significativamente. Para reverter esse contexto é prioritário assegurar que os professores tenham todo o apoio necessário, que contem com uma remuneração atrativa, uma carga horária adequada que garanta uma boa  saúde dos docentes e adequado tempo reservado para o trabalho extraclasse, o que se refletirá em um aprendizado melhor e mais qualificado dos estudantes”, destaca Patricia Mota Guedes, superintendente do Itaú Social. 

* O número de alunos por professor é calculado a partir da soma do número de todos os alunos de todas as turmas nas quais o docente leciona, considerando todos os seus vínculos em todas as etapas, escolas e redes da educação básica. 

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